quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

O Mito da Reciclagem

Por Per Bylund - Mises Daily: 04/02/2008

Como um cidadão sueco eu comumente ouço uma porção de mitos de quão supostamente maravilhoso é este país chamado Suécia, o “próspero socialismo” que assim se pretende apresentar como sistema modelo para o resto do mundo. Em certa ocasião, justamente alguns amigos de várias partes do mundo têm me congratulado pelas políticas suecas de reciclagem e o empenho do governo sueco em implantar um ambientalismo coercitivo.

Do modo como a mim me foi apresentado, a Suécia tem se saído bem-sucedida naquilo em que a maioria dos outros governos quando muito, sonham: criar um sistema nacional eficiente e lucrativo de salvar o meio ambiente por meio da reciclagem em larga escala. E todo o povo está nisto! Todos reciclam.

Esta última afirmação é de fato verdadeira: todos estão reciclando. Porém, isto é o resultado do poder de império do governo, não uma escolha voluntária. O “serviço” monopolista estatal de coleta de lixo não aceita mais receber lixo. Agora somente coletam sobras de alimentos e outros biodegradáveis. Qualquer outro tipo de lixo que acidentalmente siga seu rumo em direção à lixeira pode resultar em uma bela de uma pequena multa (que realmente não é tão pequena assim), e toda a vizinhança poderá ter de se ver com um aumento das taxas de coleta de lixo (ou seja, aumentos ainda maiores do que o usual – já que de qualquer forma são aplicados aumentos anual ou bi-anualmente).

Então, o que você faz com os seus dejetos? A maioria das casas possui um certo número de lixeiras para diferentes tipos de lixo. Pilhas e baterias em uma; biodegradáveis em outra; e assim mais outras, individualmente, para a madeira, o vidro colorido, outros tipos de vidro, alumínio, outros metais, jornais, papel duro, outros tipos de papéis, e plásticos. Os materiais geralmente têm de ser limpos antes de serem descartados. Embalagens de leite contendo leite não podem ser recicladas assim como latas de metal não podem conter muitas etiquetas coladas.

O povo sueco é então forçado a limpar o seu lixo antes de separar cuidadosamente os diferentes tipos de materiais. Este é o futuro, eles dizem, e é supostamente bom para o meio ambiente. (Mas, e quanto à economia?)

Entretanto, tudo sito não acaba com o trabalho extra em casa e com o espaço extra em cada cozinha ocupada por uma variedade de lixeiras. O que você faz com o lixo que não é coletado? O serviço de coleta de lixo (que atualmente não executa os serviços de coleta muito freqüentemente, no geral a cada duas semanas ou mensalmente, muito embora as taxas misteriosamente aparentem estar muito maiores do que antes) aceita apenas certos tipos de lixo, geralmente apenas sobras de alimentos biodegradáveis. Mas não se preocupe: eles cuidam de tudo.

As autoridades estabeleceram centros de coleta de lixo na maioria dos bairros onde você pode descartar o seu lixo. Estes “centros” oferecem vários recipientes onde você pode depositar seu lixo. Há um recipiente dedicado para cada um dos tipos de lixo cuidadosamente codificados por cores para ajudá-lo a encontrar o certo. Mas isto exige que você já tenha separado previamente melhor o alumínio de outros metais e os seus jornais dos papéis macios e duros antes de ir pra lá. Você não vai atirar embalagens de leite sujas e papel não separado, ou irá?

Mas parece que o que as pessoas fazem é justamente burlar se elas acreditam que seja melhor pra si mesmas agir assim, de modo que então as autoridades têm respondido na forma de tornar mais difícil a fraude. A primeira medida foi redesenhar todos os recipientes de modo que se torne mais difícil atirar o dejeto “errado” neles. Por exemplo, os recipientes para vidro contêm apenas pequenos buracos redondos onde se pode inserir as garrafas, e os destinados a receber papel duro e cartão possuem orifícios chatos (você tem de achatar todas as caixas antes de reciclar - esta é a lei).

Bom, isto não funcionou, e as pessoas seguem burlando, de modo que quanto mais difícil as autoridades tem tornado a trapaça, mais difícil tem se tornado se livrar do lixo mesmo que você tenha a intenção de colocar cada coisa no seu lugar certo. Então as pessoas começaram a ir a estes centros e ao contrário, simplesmente botavam tudo próximo aos recipientes. Por quê se preocupar? A isto as autoridades responderam por colocar “espiões” assalariados nos centros de coleta de lixo (!) para documentar quem estava desobedecendo as normas de modo que estes pudessem ser levados à justiça (Na verdade, têm havido uns poucos casos de pessoas que têm sido processadas por não seguirem as leis de reciclagem).

Será necessário dizer que a tentativa de contratar espiões também não tem funcionado? Depois de um acalorado debate na mídia, todos os espiões nos centros de coleta de lixo foram abolidos.

Porém a questão verdadeira não se situa em quanto as autoridades são ignorantes sobre o que impulsiona a ação humana. Nós já temos tido numerosos exemplos desta ignorância sendo um tanto enorme. A questão é: a estrutura de reciclagem funciona? A resposta é que, enquanto do ponto de vista do governo se supõe que isto provavelmente esteja funcionando, do ponto de vista ambiental é definitivamente um “não”.

“Imagine uma população inteira empreendendo tempo e dinheiro para limpar seu lixo e transportá-lo pelo bairro antes do que trabalhar e investir em um mercado produtivo!”

A estrutura funciona tal como funcionam todas as estruturas centralmente planejadas: ela aumenta e centraliza o poder enquanto os esperados resultados não se materializam. Neste caso, a estrutura funciona: as pessoas separam o lixo em diferentes lixeiras – elas não têm escolha. Igualmente, as companhias de coleta de lixo do governo não têm muito o que fazer enquanto são pagas mais regiamente do que nunca. As pessoas estão aborrecidas, mas realmente não reagem. Os suecos geralmente reclamam muito (sobre tudo), mas eles não resistem: estão acostumados a serem bovinamente conduzidos por um governo forte e têm tolerado tal sina desde 1523.

A coercitiva estrutura de reciclagem está disposta em camadas, onde ao consumidor (“produtor” de lixo) cabe a maior parte do trabalho de separar, limpar e transportar o lixo até os centros de coleta. As companhias designadas pelo governo então esvaziam os recipientes e transportam os materiais até os centros regionais onde o lixo será preparado para reciclagem. Então, tudo é transportado a plantas de reciclagem centralizadas onde os materiais são preparados para reutilização ou incineração. Finalmente, o que resta dos materiais é vendido a companhias e indivíduos a preços subsidiados de modo que eles possam fazer escolhas “ambientalmente amigáveis”.

O que é interessante acerca desta reciclagem planificada ao estilo soviético é que é oficialmente lucrativa. É presumida como eficiente economizadora de recursos, desde que a reciclagem dos materiais consome menos energia do que, por exemplo, a mineração ou a produção de papel a partir da madeira. Ela é também economicamente lucrativa desde que o governo realmente gera receitas das vendas dos materiais reciclados e dos produtos oriundos do processo de reciclagem. O processo final de reciclagem custa menos do que as receitas auferidas das vendas dos materiais reciclados.

Contudo, esta é a lógica comum do governo: ela é “economizadora” de energia simplesmente porque o governo não contabiliza o tempo e a energia usados por nove milhões de pessoas para limpar e selecionar o seu lixo. As autoridades governamentais e os pesquisadores têm chegado à conclusão que o custo da (a) água e eletricidade usadas para a limpeza doméstica do lixo, (b) o transporte desde os centros de coleta de lixo, e (c) o processo final de reciclagem representam menos do que seria necessário para produzir estes materiais do início. Logicamente, eles não contam as literalmente milhões de vezes em que as pessoas dirigem até os centros de reciclagem para esvaziar as suas lixeiras, nem contam, por exemplo, a energia e os custos para a construção de espaço requerido para uma dúzia extra de lixeiras nas residências.

Economicamente, a reciclagem sueca é um desastre. Imagine uma população inteira gastando tempo e dinheiro para limpar seu lixo e dirigir pelas vizinhanças até o centro de reciclagem quando poderiam estar trabalhando ou investindo em um mercado produtivo! De acordo com os livros do governo, mais dinheiro flui para dentro do que para fora, e portanto, a reciclagem é lucrativa. Porém, ele ignora os custos de coerção.

Os contadores do governo também tomam vantagem dos cortes de custos que eles tem sido capazes de perceber ao centralizar o sistema de coleta de lixo. Estes “cortes”, contudo, são na maioria cortes no serviço, enquanto as taxas para os consumidores têm sido aumentadas. Um problema recente com os centros de coleta de lixo é que os recipientes não são esvaziados muito freqüentemente (um exemplo típico de como os governos procuram economizar) e portanto permanecem cheios o que significa que o lixo das pessoas empilha-se próximo aos recipientes sobre-lotados enquanto os prestadores de serviço contratados pelo governo sentam ociosos: eles são pagos para esvaziar os recipientes em dias programados e não para recolher o lixo amontoado junto a estes recipientes. O resultado? Doenças e ratos. Os jornais têm noticiado sobre uma invasão de ratos em Estocolmo e em outras cidades suecas nos anos recentes.

Se considerarmos os custos em termos monetários, em termos de tempo desperdiçado, e em termos do aumento de emissão dos automóveis, isto dificilmente será ambientalmente amigável. Junte-se a isto o descontentamento e o aumento do risco de doenças, e a reciclagem sueca se mostrará no mínimo tão desastrosa quanto qualquer outro esquema estatal.

Isto deveria ser previsto, já que o esquema é tão autoritário no seu estilo, estrutura e gestão. Ele pode ser mais “high-tech” e avançado do que os sistemas soviéticos existentes até então, mas ainda é um sistema fundado no poder de império antes do que nas escolhas voluntárias baseadas no interesse e nos incentivos. Bastante interessante é que o sistema é demasiado socialista mesmo para o jornal socialista número um da Suécia, Aftonbladet. Em um editorial de 04 de janeiro de 2002, Lena Askling escreveu o seguinte sobre o sistema público de coleta de lixo:

Nós (consumidores) somos encarregados de selecionar, fazer a compostagem, embalar, guardar e transportar o lixo. Nós somos obrigados a manter conosco este ridículo armazenamento de lixo composto em pequenas lixeiras em apartamentos e vilas e então transportar este lixo fedorento e que vaza até os recipientes apropriados ou centros de coleta que parecem estarem sempre lotados.

Por quê em nome do Senhor o governo não pode introduzir incentivos de mercado para estimular a indústria e os produtores a desenvolver sistemas racionais de embalagem e descarte de lixo que possibilitem a reciclagem, a produção de energia e futuras receitas com matérias-primas? E talvez um sistema consumidor amigável e higienicamente aceitável ao invés do chãos atual do lixo e da imundície?

Mesmo Askling, que escreve propaganda socialista como meio de vida, tem conhecimento de que o sistema de reciclagem sueco não funciona, e que ela conclui pela necessidade de mais mercado.

Por favor esclareçam-me, em quê se baseia o tão aclamado sucesso deste sistema?

Peer Bylund é estudante PhD em economia na Universidade de Missouri e fundador do site Anarchism.net. Visite seu website http://www.perbylund.com/ ou seu blog onde ele comenta sobre este artigo and outros mais. Envie-lhe um e-mail. Comente no seu blog.

Tradução: Klauber Cristofen Pires (LIBERTATUM) do original The Recycling Myth.

3 comentários:

  1. De fato, pela descrição do rapaz o sistema sueco parece um fracasso. Como eu disse no outro comentário, o sistema de reciclagem de Curitiba vem funcionando relativamente bem há mais de 20 anos. Nossa separação aqui é bem simples: lixo orgânico vai para o aterro, lixo reciclável tem a coleta em dias diferentes. É tudo coletado num caminhão e levado para uma central, onde um sistema de imãs separa os metais do resto. Pessoas ajudam na separação, como o papel do plástico (não sei mais detalhes).
    Os catadores de papel e suas cooperativas também exercem um papel importante na reciclagem. Parece que hoje o Brasil recicla quase que 90% do alumínio utilizado, graças aos "catadores". A reciclagem de papel e outros metais também atinge índices elevados. Tudo funciona na base do mercado. O catador coleta o lixo e ganha por isso. O cidadão faz uma separação prévia do lixo e ganha o reconhecimento social com um bom cidadão. E no final das contas, o meio ambiente também ganha. É claro que o sistema poderia ser aperfeiçoado, e o sistema Sueco também. O problema dos europeus é que eles estão na vanguarda destas coisas, e com isso acabam fazendo muita bobagem.
    Note que ele não discutiu a necessidade da reciclagem e da separação, mas o modo como isso é feito. Isso é democracia.

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  2. "ganha o reconhecimento social com um bom cidadão"

    Eu prefiro não pagar por essa coleta extra ("lixo reciclável tem a coleta em dias diferentes").

    Sou mais de lucrar com meu próprio lixo.

    Vendo-o, se a cooperativa quiser pagar por ele, do contrário vai tudo para o mesmo saco preto.

    Abraço ao caro Klauber.

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  3. O fato é que a coleta diferenciada ocorre em dias intercalados com o da coleta comum. Não há taxa extra por isso. Sinceramente, depois da primeira venda de lixo reciclável, você irá desistir de tentar lucrar com ele. São necessários muitos quilos de lixo para se conseguir R$ 10,00, o que certamente desistimularia seu esforço em tentar receber algo por isso. E como eu comentei, a separação do lixo implica menos custos com manutenção de aterros sanitários, que no final das contas, você paga de qualquer jeito.

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