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segunda-feira, 26 de maio de 2008

Dumping Tributário e Administrativo

Por Klauber Cristofen Pires

Dumping é o termo que se usa para definir uma prática comercial tida como desonesta ou desleal, e que consiste em uma empresa baixar o preço dos seus produtos, mesmo suportando prejuízo, na esperança de quebrar as suas concorrentes e aí sim, poder então passar a exercer um monopólio de fato, cujos novos preços, desta vez aumentados às alturas, compensem os prejuízos, digamos assim, do “investimento”.

O dumping é um dos temas mais defendidos pelos países em suas rodadas de negociações internacionais sobre comércio, de onde têm sido celebrados tratados que garantem à nação que alegar estar sendo vítima desta prática adotar medidas defensivas tais como alíquotas de importação maiores, cotas de quantidades ou até mesmo a proibição da entrada de determinado produto em seu território.

Para que sejam adotadas medidas anti-dumping, é necessário que a indústria ou setor industrial atingido demonstre que os preços do concorrente estrangeiro tenham sido artificialmente reduzidos e que estejam causando a possibilidade de sua quebra.

Muito embora o dumping seja considerado como uma séria ameaça por muitos economistas e burocratas, não é bem assim que pensam os liberais de linha austríaca, para quem não simplesmente não existe algo assim como um “monopólio de fato”, isto é, em uma sociedade livre, onde vigore uma economia puramente capitalista.

De fato, como pode se depreender da própria lei e também da experiência, não há uma notícia concreta que a prática de dumping tenha algum dia prejudicado de fato algum setor específico da economia nacional, e com certeza, muito menos, a sociedade. Ao contrário, toda a teoria repousa meramente na “possibilidade” de isto acontecer. Nos EUA, um caso célebre foi a tentativa de dominar o mercado do petróleo pelos Rockfeller; na então economia mais livre do mundo, a estratégia de preços artificialmente mais baixos só lhes trouxe vultosos prejuízos, dado que os concorrentes aprendiam a lidar habilmente com a situação, às vezes, simplesmente segurando seus estoques e deixando seus rivais com o peso de atender a toda demanda do mercado, seja criando empresas petrolíferas de fachada somente com a finalidade de a eles revendê-las.

No Brasil, são destaques as medidas anti-dumping criadas contra o alho moído, cadeados e produtos de coco (leite de coco e coco em pó). Contra os cadeados, a medida foi de uma inutilidade extrema: na região metropolitana de Manaus, onde, por conta da Zona Franca, os produtos importados circulam com relativa abundância em relação ao resto do país, os cadeados chineses invadiram as lojas de importados, mas poucos foram os que chegaram às casas – isto porque eram de uma qualidade tão sofrível que pouca gente se dispunha a poupar uns trocados justamente na hora em que pensava em adquirir um produto que lhe proporcionasse segurança.

Quanto ao alho, no Brasil, à época, não se conhecia nas prateleiras dos supermercados o alho moído, de modo que o produto importado, antes de dominar o mercado, sugeriu a inovação pela indústria nacional. Enfim, com relação aos produtos de coco, jamais houve uma diminuição da produção de coco no país, tendo havido, sim, justamente o contrário.

Um aspecto que os austríacos percebem e que os demais economistas olvidam (ou fingem que olvidam) é que o dumping pode até mesmo vir a ser prejudicial a alguma indústria em particular, mas não necessariamente à sociedade, motivo pelo qual lançamos aqui as seguintes perguntas: primeiro, a quem deve o estado defender? A uma indústria em particular ou à sociedade, vista como um todo? Segundo, e se esta mesma indústria nacional não fosse ela própria quem estivesse a prejudicar a sociedade, por lhe fornecer produtos caros, com má qualidade, escassa tecnologia e com desperdícios de toda sorte? Quantos foram os exemplos que vivenciamos dos péssimos produtos – notadamente os carros – que nos eram impostos antes que o nosso mercado tivesse sido aberto à entrada dos produtos importados?

Para entendermos melhor a questão, façamos um pequeno raciocínio: imagina o leitor agora que eu te presenteie, digamos, com um Ipod. A minha pergunta então seria: agora tu, leitor, sentir-te-ias mais rico ou mais pobre? Obviamente, mais rico, ou não? Bom, agora pensa o seguinte: tu, leitor, estavas à procura de um Ipod e encontrou-me, cuja oferta de venda, de minha parte, é pagar para ti a metade do aparelho... então, não te fizeste assim mesmo mais rico, mesmo embora não tenhas ganhado o tal aparelho pelo seu valor inteiro?

Imagina então todas as coisas que poderias fazer, seja com todo o dinheiro que economizaste por não teres gasto com a compra do Ipod que recebeste de presente, seja por ter economizado a metade deste dinheiro, conforme o segundo caso, que ilustraria a configuração de dumping. Poderias, por exemplo, iniciar um negócio produtivo, ou então, consumindo, prestigiar um produtor mais eficiente de qualquer outro bem. Pensa: por acaso, ainda existe no Brasil alguma fábrica de guarda-chuvas? Muito embora não haja (salvo engano, parecem ser todas chinesas) nossa economia ressente-se da falta de uma indústria nacional que os fornecesse, a ponto de abandonar atividades em que somos mais competitivos que os estrangeiros, no caso, os chineses?

Em uma economia livre, o dumping não passa de lenda urbana, porque o seu praticante teria de gastar em tal empreendimento uma fortuna incomensurável sem a garantia de retorno após a imaginada conquista do mercado, já que os futuros preços altos em regime de “monopólio de fato” atrairiam novamente os investimentos por novos concorrentes. Isto significa que, antes de o dumping ser uma prática denunciada por capitalistas conscientes e defensores do livre-comércio, na verdade ele o é pelos próprios monopolistas ou oligopolistas locais. No “popular”, é a velha história do sujo apontando o dedo para o mal-lavado!

Não obstante, esta mesma classe de oligopolistas têm se beneficiado, no mercado interno, de uma forma de dumping bem mais recompensador do que os dos seus concorrentes estrangeiros, que aqui neste artigo será batizado de “dumping tributário e administrativo, ou burocrático”, na medida em que os que vão suportar a prática rapineira não serão eles mesmos, mas todos os demais cidadãos, via estado.

Não à toa que se percebe que em todos os estados do Brasil sempre haja uma turma, constituída pelos maiores grupos empresariais, seja da indústria, do agro-negócio ou do comércio, que não reclama da carga tributária ou da extremamente complexa burocracia para se abrir e manter uma firma, mas antes, comumente a defenda e muitas vezes contribui para que novos tributos sejam instituídos ou novas exigências de ordem legal passem a ser exigidas.

Para o leitor que ainda não compreendeu o que se passa, o mecanismo é o seguinte: na posição em que encontram, eles conseguem arcar com os altos tributos e as prolixas obrigações administrativas porque estas se tornam relativamente mais baratas no grande mercado. Assim, eles conseguem manter seções ou departamentos inteiros de contabilidade e advocacia, onde desenvolvem um planejamento tributário e legal de alto nível. Isto tudo, sem descontar a possibilidade de lhes chover na horta alguma benesse adicional concedida pelo estado – e os governos estaduais são pródigos nisto – na forma de algum incentivo fiscal.

Estes grandes departamentos conseguem encontrar brechas na lei que lhes propiciem a chamada “economia de imposto”, por meio da execução de procedimentos onde a incidência de tributos seja menor ou inexistente, bem como também obtém um custo relativamente menor para contestar o estado em questões administrativas ou judiciais. Ao “Zé Micro-Empresário”, por sua vez, a quem seria muito caro contratar tais serviços e ter voz e influência para receber empréstimos a juros baixos do governo ou outra sorte qualquer de incentivos, resta pagar os tributos e as multas que os sucessivos fiscais dos diferentes órgãos se lhes empurram goela abaixo, ou, tal como os da turma da “cobertura” esperam, fecharem as portas.

Este fenômeno, aqui explicado de uma forma muito resumida, explica a denúncia do filósofo Olavo de Carvalho com relação à elite empresarial do nosso país, por se escanchar sem pudores no estado e adotar uma postura tipicamente anticapitalista. Esta informação é importante principalmente para os jovens estudantes de Economia e de Direito, bem como aos empresários emergentes que podem vir a oxigenar o degradado ambiente dos negócios que predomina em nosso país, para que desistam de ver nesta classe parasitária o exemplo do que deveria ser o livre-mercado ou o retrato do capitalismo.

Um comentário:

  1. Caro Klauber, da mesma forma como acontece o dumping tributário, muito bem explicado no seu texto, acontece com a legislação ambiental, e a legislação sanitária, que ficarão mais perversas com as novas metas de emissão que o governo se propôs a cumprir. Pois como o Sr. bem disse as grandes empresas tem setores inteiros para o gerenciamento ambiental e para regulação sanitária já as pequenas e médias empresas , ou tercerizam essa parte a custos absurdos ou correm o risco de serem multadas, fechadas ou difamadas pela mídia sensacionalista, que adora esse tipo de coisa. Não vejo uma saída para a questão, senão a desobediência pura e simples do que não se puder cumprir, pois não há estrutura no estado para fiscalizar todos os que estão em desacordo, pois todos estão sempre em desacordo.

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