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quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

COMO SE DESCONSTRÓI A CENSURA (Velvet Poison)



"É absolutamente irracional, em sociedade aberta, constituída sobre liberdade, que se censure o fluxo de informações na internet." (Procurador Ailton Benedito)


Extraído do blog Casal 20



O Ministério Público Federal em Goiás, pelo Procurador Regional dos Direitos do Cidadão, Ailton Benedito, manifestou-se nesta segunda, 13, pelo indeferimento da petição inicial e pela extinção do processo, sem resolução de mérito, na ação civil que o governo federal, através da Advocacia-Geral da União move contra o Twitter, com o objetivo de bloquear as contas de usuários que alertam da posição e horários das blitze de trânsito no estado de Goiás.


A AGU apresentou a ação na Justiça Federal daquele estado sob argumento que tais contas atentam contra a segurança viária. Entretanto, caso o pedido seja acatado, estender-se-á a decisão por todos os estados. Aqui no DF, por exemplo, o perfil @RadarBlitzDF, que presta informações diversas sobre o trânsito na capital federal e entorno, decidiu por conta própria suspender o serviço, até que a ação seja julgada. No Rio de Janeiro, o @LeiSecaRJ, principal perfil de tais informações e verdadeiro case do gênero no Twitter, que conta com quase 300 mil seguidores, apresenta-se com uma tarja preta de "censurado".


Os advogados do Estado-governo sustentam, na ação, que as blitze não são apenas importantes para evitar acidentes de trânsito, mas também para evitar delitos como roubo de veículos, posse ilícita de armas e tráfico de drogas e pedem a imposição de uma multa diária de R$ 500 mil em caso de descumprimento. Além disso, opinam que mediante os avisos divulgados pelas titulares das contas estão sendo violadas disposições previstas no Código Penal e no Código de Trânsito.


O procurador da República Ailton Benedito, dentre diversos embasamentos contrários à ação, ressalta que tal "possibilidade é rechaçada peremptoriamente pela Constituição Federal, pela Convenção Americana dos Direitos Humanos", de acordo, dentre outros, com o artigo 220, caput, §§ 1º e 2º da Constituição, que determina que "nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV. É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística.”, e do artigo 13 da citada CONVENÇÃO AMERICANA DE DIREITOS HUMANOS (PACTO DE SAN JOSÉ DA COSTA RICA) que discorre sobre Liberdade de pensamento e de expressão.


A peça do procurador tece, in my opinion, uma profunda defesa da garantia de direito à liberdade do tráfego de informações das comunicações sociais via web, e do respeito à liberdade individual do cidadão cumpridor das leis, ao acesso à informação. Complementa, ainda, com o que eu interpreto como verdadeira "chamada" no governo federal, por não assumir suas responsabilidades concernentes à prevenção de acidentes e outros crimes, conforme suas funções constitucionais. A tentativa de censura às contas do Twitter seria, por assim dizer, como um meio de transferir responsabilidades. Eu traduziria assim: "sou governo, não faço, pois não tenho competência, mas para não parecer que nada faço, proíbo que outros façam o que faz notar que eu não faço."


Em sua argumentação, Ailton Benedito assevera que "na contenda entre a pretensão da UNIÃO FEDERAL, pela sua Advocacia-Geral, e os direitos e garantias constitucionais supramencionados, vê-se, claramente, que se pretende infligir ao Twitter e seus usuários uma proibição juridicamente impossível, vedada que é pela Constituição da República, contudo apropriada a regimes totalitários incompatíveis com o Estado Democrático de Direito." 


Prossegue, ainda, o procurador, destacando que "exsurge absolutamente irracional, desde a pressuposição de convivência em sociedade aberta, constituída sobre os alicerces de liberdade, que se divise alguma possibilidade de se impedir o livro fluxo de informações pela internet. Tentativas com esse desiderato mostram-se, em regra, não somente inúteis como também contraproducentes. Especialmente, o Estado-governo pretende impor tais limitações de forma genérica e abstrata, a fim de inibir a prática de crimes. Nesses casos, as autoridades públicas jamais conseguem fechar todas as portas abertas aos criminosos, que, ordinariamente, sempre desenvolvem novas formas de comunicar suas práticas escapando dos supostos limites estatais. De ordinário, aquelas autoridades unicamente logram atingir os indivíduos e organizações que, de fato, estão no tráfego lícito de informações." 


A manifestação do Ministério Público Federal na ação concluiu que "a) a petição inicial da demanda é inepta, porque não atende completamente os requisitos fixados pelo Código de Processo civil; b) pretensão veiculada não guarda interesse útil à alteração da realidade prática; e c) a mesma pretensão não acha guarida no ordenamento jurídico. Mais que isso, até, a sua possibilidade é rechaçada peremptoriamente pela Constituição Federal, pela Convenção Americana dos Direitos Humanos." 


Recomendo que leiam a íntegra. Não é muito extensa e tampouco de difícil entendimento para quem não é versado nas letras do Direito, como eu não sou. Recomendo, principalmente, para aqueles que, como eu, são defensores intransigentes da liberdade, da garantia dos direitos individuais humanos como regra básica de uma democracia verdadeiramente constituída. Trata-se, essa peça do procurador Ailton Benedito, de um verdadeiro libelo ao Estado Democrático de Direito e às garantias constitucionais ultimamente tão vilipendiadas pelas interpretações político-partidárias de "interésses" diversos nestepaiz... 


Os verdadeiros democratas agradecem.

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