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quinta-feira, 19 de março de 2015

Mais um escândalo

O jornal Estado de São Paulo publicou ontem uma matéria que é um verdadeiro escândalo.  Há muito se sabe que o patrimonialismo encontra-se disseminado no seio do governo petista, onde o dinheiro público é gasto a rodo para benefício do partido e de seus próceres, em detrimento do interesse público.  O difícil sempre foi comprovar essa verdade.
Pois bem, o documento da SECOM – Secretaria de Comunicação do governo – trazido ao conhecimento público ontem pelo Estadão é uma confissão escancarada de que o trabalho de funcionários públicos, pagos com o dinheiro do contribuinte, bem como as verbas de propaganda estatais, têm sido usados para benefício exclusivo da presidente da república e de seu partido, em absoluta desconformidade, não só com a Constituição e a Lei pátrias, mas também com os princípios basilares da moralidade e da impessoalidade, que devem reger qualquer ato da administração pública.   Não resta a menor dúvida de que podemos estar diante de alguns atos de improbidade administrativa, passíveis de diversas sanções legais.
Vejamos primeiro alguns trechos do famigerado documento da SECOM:
“Não há dúvidas de que a comunicação foi errada e errática. Mas a crise é maior do que isso. As forças políticas que elegeram Lula e Dilma são minoritárias nas redes socais desde os movimentos de 2013″
“A partir de novembro, as redes sociais pró-Dilma foram murchando até serem quase extintas. Principal vetor de propagação do projeto dilmista nas redes, o site Muda Mais acabou. Os robôs que atuaram na campanha foram desligados”
“De um lado, Dilma e Lula são acusados pela corrupção na Petrobras e por todos os males que afetam o País. Do outro, a militância se sente acuada pelas acusações e desmotivada por não compreender o ajuste na economia. Não é uma goleada. É uma derrota por WO”
As responsabilidades da comunicação oficial do governo federal e as do PT/Instituto Lula/bancada/blogueiros são distintas. As ações das páginas do governo e das forças políticas que apoiam Dilma precisam ser muito melhor coordenadas e com missões claras. É natural que o governo (este ou qualquer outro) tenha uma comunicação mais conservadora, centrada na divulgação de conteúdos e dados oficiais. A guerrilha política precisa ter munição vinda de dentro do governo, mas ser disparada por soldados fora dele.”
“É preciso que a PR fale mais, explique, se exponha mais, seja nos quebra-­queixos pós-­evento, seja respondendo ouvintes da Voz do Brasil (20 milhões de ouvintes), seja com a mídia tradicional (TV aberta, de preferência), seja com a volta das entrevistas por Facebook. Não importa quantos panelaços eles façam. É preciso consolidar o núcleo de comunicação estatal, juntando numa mesma coordenação a Voz do Brasil, as páginas de sites, twitter e Facebook de todos os ministérios, o Facebook da Dilma e a Agência Brasil.”
“A publicidade oficial em 2015 deve ser focada em São Paulo, reforçando as parcerias com a Prefeitura. Não há como recuperar a imagem do governo Dilma em São Paulo sem ajudar a levantar a popularidade do Haddad. Há uma relação direta entre um e outro.”
É estupefaciente.  Um verdadeiro escândalo.  A Secretaria de Comunicação, um órgão de Estado, sendo usado de forma ostensiva, não para divulgar ações do governo, mas para promover uma “guerrilha” nas redes sociais em favor de Dilma e do PT.  Reparem que o texto chega ao disparate de dizer que “a guerrilha política precisa de munição vinda de dentro do governo, mas ser disparada por soldados fora dele” (sic).  Os redatores do indigitado documento chegam ao cúmulo de dizer que é preciso utilizar todos os meios disponíveis para melhorar a imagem de Dilma e do PT, inclusive a Voz do Brasil, a Agência Brasil, outros dois órgãos de Estado.  Em nenhum momento os redatores se mostram preocupados com a divulgação de programas, propostas ou atos do governo, mas exclusivamente com a imagem de Dilma, de Lula e do PT.
O inteiro teor do famigerado documento configura, no mínimo, atos eivados de improbidade administrativa.  Comecemos pelo Artigo 37, §1º daConstituição, que é absolutamente claro quanto às características impessoais da publicidade estatal:
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
  • 1º – A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos.
Parece claro, portanto, que, ao contrário do arrazoado publicado pela SECOM, a publicidade oficial deve ter ênfase educativa, informativa ou de orientação social dos atos oficiais, sendo absolutamente avesso ao referido preceito qualquer tipo de benefício ou proveito individual.
Ora, a leitura daquele documento revela que a estratégia de publicidade proposta pela SECOM, assim como o próprio trabalho desta secretaria visa exclusivamente ao benefício e proveito pessoal da presidente e de seu partido, o que configura ato de improbidade administrativa.  Senão, vejamos o que prescreve a Lei Nº 8429/92, que dispõe sobre o assunto:
Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente:
XI – liberar verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir de qualquer forma para a sua aplicação irregular;
Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente:
I – praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto, na regra de competência;
A propaganda oficial que ofender o princípio da impessoalidade deixa de ser uma publicidade institucional legítima e assegurada pelo texto constitucional para se revelar em verdadeira promoção pessoal, terminantemente vedada pelo ordenamento jurídico, por configurar ato de improbidade administrativa, nos termos do art. 11 da Lei n. 8.429/92.”
“Pode, ainda, configurar improbidade administrativa por lesão ao erário (art. 10 da Lei n. 8.429/92), eis que ao empregar dinheiro público no custeio da publicidade que irá lhe gerar promoção pessoal estará usando, em proveito próprio, a renda da entidade a que presta serviço.”
“Em tais casos”, prossegue aquele jurista, “aplicam-se as sanções previstas no art. 12 da Lei n. 8.429/92, quais sejam: a) ressarcimento integral do dano; b) perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, se concorrer esta circunstância; c) perda da função pública perda da função pública; d) suspensão dos direitos políticos; e) pagamento de multa civil; f) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário”.
Em resumo,
A propaganda oficial que extrapola os limites da permitida publicidade institucional oficial (CF, art. 37, § 1º) se consubstancia em veículo promocional do agente público, em manifesta afronta ao princípio da impessoalidade e causa lesão ao erário, configurando, assim, ato de improbidade administrativa, nos termos do art. 11 e do art. 10 da Lei n. 8.429/92.
No mesmo diapasão, ao utilizar o aparato da Secretaria de Comunicação, inclusive o trabalho de seus funcionários e outros recursos materiais, a fim de tentar promover a melhora da própria imagem e a de seu partido perante a população, a presidente da república está incursa no Artigo 9º, Item XII da Lei Nº 8.429/92. Senão, vejamos:
Art. 9° Constitui ato de improbidade administrativa importando enriquecimento ilícito auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, mandato, função, emprego ou atividade nas entidades mencionadas no art. 1° desta lei, e notadamente:
XII – usar, em proveito próprio, bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1° desta lei.
Alguma dúvida?
Com a palavra, o Ministério Público e os poderes Legislativo e Judiciário.

Sobre o autor

João Luiz Mauad
Administrador de Empresas e Diretor do Instituto Liberal
João Luiz Mauad é administrador de empresas formado pela FGV-RJ, profissional liberal (consultor de empresas) e diretor do Instituto Liberal. Escreve para vários periódicos como os jornais O Globo, Zero Hora e Gazeta do Povo.
Matéria extraída do website do Instituto Liberal

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