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quinta-feira, 9 de abril de 2015

Papa Francisco, David Cameron e os mártires do século XXI

cruzDa sacada do palácio pontifício, na Praça de São Pedro, no Vaticano, após o domingo de Páscoa, o Papa Francisco fez um apelo para que “a comunidade internacional não desvie o olhar para outra parte”, referindo-se aos cristãos perseguidos na Síria, Iraque, Líbia, Iêmen, Nigéria e outros países da África. “Nossos irmãos e nossas irmãs são perseguidos, exilados, mortos, decapitados, exclusivamente por serem cristãos”, disse Sua Santidade. “Eles são os mártires do nosso século, talvez até mais numerosos que os primeiros”. Francisco denunciou o “silêncio cúmplice” do mundo enquanto os cristãos são mortos. O discurso abordou o ataque à Universidade em Garrisa, leste do Quênia, no qual militantes do Al-Shabab mataram 148 pessoas por não serem muçulmanas e referiu-se, ainda, aos vinte e um cristãos decapitados pelo Estado Islâmico em Fevereiro.

Diferentemente da atitude sempre contida de Barack Obama, que faz de tudo para evitar que o seu discurso contra os extremistas islâmicos possa ser interpretado no sentido de uma guerra religiosa, abrindo espaço para a acusação de islamofobia, David Cameron, primeiro-ministro do Reino Unido e líder do partido conservador, fez um discurso de Páscoa firme, lúcido e transparente; sem meias palavras, sem evasivas:
 “[…] Temos o dever de falar claramente sobre a perseguição de cristãos ao redor do mundo também. É realmente chocante que em 2015 ainda existam cristãos sendo ameaçados, torturados e até mortos por causa de sua fé. Do Egito à Nigéria, da Líbia à Coréia do Norte, cristãos têm sido arrancados de suas casas, forçados a fugir de aldeia em aldeia, muitos deles forçados a renunciar a sua fé ou serem brutalmente assassinados. A todos esses grandes cristãos, no Iraque e na Síria que praticam a sua fé ou a compartilham para os outros, devemos dizer: nós nos posicionamos com vocês.”

Não demorou para que alguns intelectuais (sempre eles!) assinassem uma carta, publicada no jornal Daily Telegraph, criticando as declarações do primeiro-ministro e acusando-o de sectário.
Segundo uma pesquisa americana, o ano passado vai entrar para a história como o maior índice de perseguição global de cristãos da era moderna. As pesquisas apontam um crescimento absurdo da violência contra os cristãos. A estimativa, por baixo, é de que aproximadamente 4.344 cristãos tenham sido mortos em razão da sua fé no período entre 01 de dezembro de 2013 e 30 de novembro de 2014. O ano de 2015 começou com as decapitações no Egito e o massacre no Quênia. Mas quando uma autoridade vem à público posicionar-se firmemente em favor dos cristãos, ele é criticado pela intelligentsia patrulhadora contrariada com a afirmação do caráter cristão do Reino Unido.
Ora, não é apenas o Reino Unido que é cristão, é o próprio ocidente. Nossas bases históricas estão fincadas na tradição cristã de sorte tal que a tolerância requerida para a pluralidade de idéias é uma das conseqüências da difusão de um ideal de amor e benevolência que se estende a toda a humanidade. Não há nenhum problema em afirmar o caráter cristão de uma cultura, muito embora essa afirmação se dê dentro de um Estado laico. Só não é possível para aqueles que querem estabelecer um califado mundial. Não é o nosso caso.

Já tive a oportunidade de dizer e volto a repetir que somente na democracia, criação ocidental, é possível abrigar a pluralidade e a divergência. Por isso a democracia é algo delicado, porque diferente de um regime totalitário seja ele o nazismo, o fascismo, o comunismo, ou o califado islâmico, ela abriga em si a própria dissidência capaz de miná-la. Não podia ser mais pertinente a frase com que David Cameron inicia seu discurso: “Sim, somos uma nação que acolhe e aceita toda e qualquer fé, mas somos ainda um país cristão.”

Não sei se Cameron tinha consciência da profundidade do que acabava de proferir. Mas eu tenho. Somos um país que acolhe toda e qualquer fé porque somos uma democracia, e somos uma democracia porque albergamos determinados valores, dentre os quais o da liberdade e da fraternidade, em cuja difusão o cristianismo teve um inegável papel.




Sobre o autor

Catarina Rochamonte
Doutoranda em Filosofia pela UFSCar
Catarina Rochamonte é graduada em Filosofia pela UECE (Universidade Estadual do Ceará), mestre em Filosofia pela UFRN (Universidade Federal do Rio Grande do Norte), doutoranda em Filosofia pela UFSCar (Universidade Federal de São Carlos); é escritora e jornalista independente.
Matéria extraída do website do Instituto Liberal

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