Região
ignorada, cobiçada e produto de troca
Por Armando Soares
"Deveis ter sempre em vista que é loucura esperar
de uma Nação favores desinteressados de outra e que tudo quanto uma Nação
recebe como favor terá de pagar, mais tarde, com uma parte de sua
independência. Não pode haver maior erro do que esperar favores reais de uma
Nação a outra."
George Washington
Presidente dos Estados Unidos da América do Norte
Os
problemas brasileiros e amazônidas poderiam ser evitados caso a memória
histórica não fosse ignorada como se irá demonstrar. A Amazônia e o ataque
ambientalista sobre ela teriam outro cenário, se amazônicos e brasileiros
autênticos guardassem viva a memória histórica onde estava e está registrada a
ausência do Estado brasileiro. A Amazônia sofreu e ainda sofre a doença de
vazio de poder, doença que mesmo na época áurea da borracha esteve presente. Um
vazio de poder é uma expressão que define uma situação política onde um governo
não possui uma autoridade central identificável. A metáfora implica que, como
num vácuo físico, outras forças tendem a afluir para preencher o espaço vago. O
poder central nunca em todo o processo histórico esteve presente na Amazônia. A
presença do Estado brasileiro era sempre notada quando a Amazônia se prestava
para servir como produto de troca, ou como ponte para satisfazer interesses
políticos ideológicos venais. Crime de lesa-pátria ampliado pela aceitação pelo
governo da soberania relativa criada e imposta pelo ambientalismo.
O
interesse pela Amazônia sempre esteve condicionado a algum motivo econômico e
de saque como é o caso da época áurea da borracha quando a Amazônia era a única
produtora de borracha no mundo; quando da II Guerra Mundial como abastecedora
de borracha para atender os exércitos aliados sem nenhuma compensação; quando a
região se tornou de grande interesse para os países membros do Grupo dos Sete –
G7 (Alemanha, Canadá, Estados Unidos, França, Itália, Japão e Reino Unido),
conforme registrado em reunião realizado em Houston, em julho de 1990, onde os
Chefes de Estado e de Governo manifestaram interesse em apoiar iniciativas, em
caráter piloto, para proteção das florestas tropicais do Brasil (leia-se
Amazônia). O governo brasileiro vislumbrando entrada de dólares criou uma
Comissão Interministerial que juntamente com o Banco Mundial e com a Comissão
da Comunidade Europeia elaborou uma proposta preliminar para um Programa Piloto
para a Proteção das Florestas Tropicais do Brasil, no valor de US$
1.600.000.000 (um bilhão e seiscentos milhões de dólares). Em outubro de 1991,
Eduardo de Souza Martins, Secretário-Adjunto do Meio Ambiente, enviou à SOPREN
expediente afirmando a prioridade da política ambiental do governo para a
Região Amazônica, com destaque para o consenso obtido na primeira etapa de
negociação que culminou com a submissão do programa à cúpula dos 07 em Londres,
em julho de 1991, que resultou da proposta brasileira endossada pelo BIRD e
pela CCE na qual foram consignados valores a cada um dos projetos
apresentados... Esse registro estabeleceu o destino que a Amazônia, não como
área desenvolvida, apenas como floresta preservada descartando-se
definitivamente a possibilidade da região se desenvolver. Os espaços onde
investimentos foram realizados, a partir desse período sofreriam descontinuidade
e expansão através de ações governamentais reguladoras obstaculizantes
geradoras de custos econômicos impossíveis de serem repassados ao mercado, determinando
a morte lenta da célula produtora.
Um
espaço vazio (Amazônia) que representa a quase metade do Brasil, com centros urbanos
esparsamente distribuídos e sem sustentação econômica tem um custo de
manutenção elevado que envolve interesses políticos e econômicos de outros estados
membros da república federativa. A estratégia do poder central para solucionar o
problema político e econômico e ao mesmo tempo tirar proveito foi
disponibilizar a Amazônia para uso das forças econômicas do novo capitalismo
ambiental. A reversão desse cenário se torna impossível, no mínimo muito
difícil quando se trata de interesses econômicos de bilhões ou trilhões de
dólares. A Amazônia, uma região maior que vários países da Europa, espaço vazio
de riquezas incomensuráveis inexploradas se mostrava como um petisco para o
ataque de forças econômicas poderosas. O destino que a Amazônia teria estava
escrito na memória histórica para todo mundo ler e interpretar, mas
infelizmente foi ignorada. O faz por ti que te ajudo foi esquecido, e trocado
pelo pedido de ajuda dos céus. Típico de indolentes e idiotas. Deu no que deu.
Perdemos a Amazônia.
A prova
de que a Amazônia sempre foi ignorada e tida como vazio de poder, portanto,
está contido nos relatos históricos. A Amazônia foi ignorada no Brasil
Pré-Colonial; no Brasil Colônia; no Brasil Império e no Brasil República. Para
não dizer que foi totalmente ignorada, a Revolução Acreana é citada em alguns
relatos, assim como a Cabanagem, no Pará. História é memória como sabemos. Ora
se a Amazônia e o Pará não aparecem ou aparecem apenas tangencialmente na
História do Brasil, a conclusão é que a Amazônia e o Pará sempre foram
considerados apêndices sem valor econômico e político. Essas são as raízes de
todos os problemas amazônicos.
Em 1944,
o Interventor Federal do Pará, Coronel Joaquim de Magalhães Cardoso Barata,
encaminhou ao Presidente da República relatório sobre a situação econômica pré-falimentar
do Pará onde assinala aspectos mais agudos da vida do Estado. O Pará vivia com
problemas sérios de abastecimento condicionado a regularidade de transportes da
cabotagem nacional sujeito ao bloqueio das nossas costas provocando carência
alimentar sem nenhum precedente na história. O relatório destacava um contraste
flagrante entre a grandeza e a exuberância do meio e a situação de
insuficiência econômica em que vive o homem. A produção econômica estava muito
aquém das possibilidades do Estado. A borracha em colapso, em todos os seus
variados aspectos, continuava a ser uma das maiores preocupações do governo
pela importância que representava para a economia. Depois da derrocada da
borracha, a castanha passou a assumir posição de primeiro plano na pauta de
exportação. Chegou a ser o fator básico da economia do Estado e de toda a
Amazônia. Mais uma vez a região teve de recorrer aos recursos da natureza para
sustentar precariamente a economia abalada pelo roubo da seringueira para o
Sudeste Asiático. O Pará isolado do resto do país tentava sustentar sua
economia com produtos da floresta através de um modelo extrativista antieconômico,
representado pela borracha, castanha, madeira, óleos vegetais, sebos,
essências, peles silvestres, couros, timbó, fibras silvestres (juta) e outros. A
pecuária centrada na Ilha de Marajó e o Baixo Amazonas, fonte principal de
subsistência das populações urbanas e rurais, desde os tempos coloniais,
sofriam da falta de orientação técnica e de defesa sanitária, entregue à
criação extensiva assinalando um período rudimentar na evolução pastoril. A
produção agrícola nesse período estava aquém do que se poderia produzir com
dependência da importação de outros estados para suprir o consumo interno. O Pará
e sua frágil economia sofriam problemas capitais como de assegurar facilidades
de transporte e comunicações. Esse cenário de penúria e dependência de 1944 foi
totalmente modificado no governo militar a partir da “Operação Amazônia”, modelo
de desenvolvimento que viria a ser combatido pelo G7, que atacou com travas
ambientais. No governo civil o Estado brasileiro, sem proposta de projeto de
nação, se tornou o principal algoz do desenvolvimento amazônico, com destaque
aos governos de FHC, de Lula e da Dilma, todos inimigos da Amazônia e submissos
a governança global.
Armando Soares – economista
e-mail: teixeira.soares@uol.com.br
Soares é articulista de LIBERTATUM
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