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quinta-feira, 24 de dezembro de 2015

“Mais Estado, menos mercado” e Brasil x Argentina: o surto de sinceridade do PT

mascara_demonioNo apagar das luzes de 2015, o Brasil do PT está vivendo um surpreendente surto de transparência. De súbito, nossas eminentes figuras públicas foram acometidas de uma sinceridade sem precedentes. Como assim? O governo da mentira e do estelionato resolveu ser honesto? Explico.
A grande notícia no país, depois do esdrúxulo golpe aplicado pelo STF, que rasgou a Constituição em rede nacional – e não podemos abdicar de frisar isso quantas vezes forem necessárias, já que o país parece submerso em um mar de anestesia profunda diante do que aconteceu -, foi a saída do ministro Joaquim Levy e a posse de Nelson Barbosa no Ministério da Fazenda. Apesar de uma receita que desagradava aos espíritos mais liberais, apostando em aumento de impostos e volta da CPMF, Levy era um economista com formação em Chicago, de mentalidade mais moderada, mais ortodoxa, com maior respeito por parte dos mercados. Seu ajuste fiscal, a bem da verdade, fornecia munição às esquerdas, mesmo às alas mais radicais do próprio PT, para acusarem o “neoliberalismo” pela crise oriunda do populismo feroz e, por natureza, irresponsável do governo do partido. Barbosa, em vez disso, é um dos pais da desastrosa “Nova Matriz Econômica”, que levou o país em direção ao precipício em que se debate hoje, sob o tacão do excelentíssimo Guido Mantega. Nome recomendadíssimo, certo? Pois, após uma teleconferência de que tomou parte, o dólar disparou e a Ibovespa despencou. Credibilidade zero perante o mercado.
A escolha, no entanto, tem coerência. Quem é que liga para credibilidade perante o mercado? Quem é que liga para o mercado, mesmo numa fase difícil como esta, em que graus de investimento são cortados, uma recessão se instala e o desemprego grassa o país, não é mesmo? Evidente que estamos sendo irônicos; mas como dissemos, o PT está sendo transparente e sincero, isto é, coerente; isso não quer dizer que esteja certo – antes, quer dizer que assume sua adesão ao fracasso. Foi o que fez o seu pitoresco líder na Câmara, o cearense José Guimarães, que não perde tempo quando se trata de dizer alguma asneira. Comentando os novos ares na Fazenda, Guimarães pontificou que precisamos de menos “ajuste fiscal” e mais crédito para consumo e empréstimos aos estados endividados. “Aumentar um pouquinho a dívida não tem problema, não… (…) Eu defendo que a Fazenda tem que liberar empréstimos para os estados. (…) O ajuste que eu defendo é virar a página. Ajuste pelo ajuste não mais. Ajuste para retomar o crescimento. E acho que essa é a missão do Nelson Barbosa. Não é do mercado, mas acho que o Brasil precisa nesse momento de mais Estado e menos mercado”.
Diríamos que só pode ser brincadeira se não estivéssemos falando de quem aplaudiu as mudanças na meta da LDO para tentar livrar uma presidente de incorrer em crime de responsabilidade. De quem acha que esse negócio de rombos bilionários no orçamento público é apenas um detalhe. De quem incorporou da forma mais hedionda o “jeitinho brasileiro” de ignorar os estorvos. Fizemos tudo errado; como corrigir? Fazendo tudo errado de novo! Emitindo moeda até mais não poder, interferindo no mercado – esse vilão, esse incontornável inimigo dos nossos sonhos mais etéreos e imponderáveis – a nosso bel prazer. O PT segue a receita do desastre completo e do caos social, mas agora, ao menos, o faz com franqueza.
Ao contrário, a Argentina do recém-eleito Maurício Macri aposta, ao menos inicialmente, no caminho certo, cortando totalmente os impostos às exportações agrícolas. Se na economia a Argentina ensaia uma goleada no Brasil, na política mais ainda. Diante da vitória da oposição nas eleições parlamentares reconhecida, aparentemente por força das circunstâncias de visibilidade, pelo presidente Maduro, Macri recuou do seu pedido de suspensão da Venezuela do Mercosul. Parece que foi cedo demais. O tiranete venezuelano já anunciou que ensaia manter o triunfo nas mãos da “Revolução Bolivariana” fortalecendo os chamados “Parlamentos comunais” e enfraquecendo o Congresso, numa estratégia similar à nossa velha conhecida tática dos “conselhos populares”, que felizmente conseguimos evitar no Brasil. No entanto, em discurso na cúpula do Mercosul, Macri endureceu o tom e reivindicou a libertação dos presos políticos naquele país, como o líder oposicionista Leopoldo López.
Que fez nossa mandatária Dilma? A “presidenta” saudou o “espírito democrático” de Maduro e da Venezuela. Dilma envergonha, trai, escarnece de nossos maiores valores de espírito cívico e liberal e faz troça do sofrimento do povo venezuelano. Também nesse gesto de franco desafio a Macri, feito quer por cálculo pedante, quer por ela ser uma obtusa de quatro costados, Dilma mostrou com sinceridade a sua índole e a de seus “companheiros”. Índole irresponsável, intervencionista e avessa aos princípios democráticos.
Não foi só no PT que verdades um tanto silenciadas foram ditas em alto e bom som por aqueles a quem elas dizem respeito. No PMDB, dividido pelo conflito entre a ala de Temer e Cunha e a ala governista de Picciani e Renan Calheiros, o deputado Lúcio Vieira Lima, em conversa com O Globo, discursou sobre a gestão petista:
“É um governo totalitário. Onde ele vê que pode influenciar, ele vai. A intervenção no PMDB é para transformar nosso partido na filial do PT, e algumas pessoas se prestam a esse trabalho, achando que serão recompensadas se prestarem esse serviço, mas desconhecem a tradição do PT de chupar a laranja e jogar o bagaço fora. O chavismo no governo sempre foi um sonho do PT, e agora passa a ser o Brasil o polo mais importante desse projeto hegemônico e totalitário das esquerdas da América do Sul”.
Pois é, prezados leitores, poucas vezes vimos nossos políticos sendo tão transparentes e dando nomes aos bois. Uma pena que não se fale tanto do golpe no STF e que não sejam as nossas oposições, e sim um peemedebista, do partido que fez seu pacto com a legenda maligna, a fornecer uma definição tão precisa. Em um fim de ano tão tormentoso e repleto de motivos para se lamentar, ao menos podemos vislumbrar o espetáculo da verdade cristalina. Se, como rezam as tradições, Satanás pode se travestir de anjo de luz para iludir os incautos, no Brasil de hoje, por absoluta falta de necessidade, ele já dispensou esse artifício.

SOBRE O AUTOR

Lucas Berlanza

Lucas Berlanza

Jornalista, graduado em Comunicação Social/Jornalismo pela UFRJ, colunista e assessor de imprensa do Instituto Liberal. Estagiou por dois anos na assessoria de imprensa da AGETRANSP-RJ. Sambista, escreveu sobre o Carnaval carioca para uma revista de cultura e entretenimento. Participante convidado ocasional de programas na Rádio Rio de Janeiro.

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