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terça-feira, 29 de abril de 2008

Um Judiciário e uma Polícia Privados? Considerações Adicionais

Por Klauber Cristofen Pires
Sobre o meu último artigo, “Um Judiciário e uma Polícia Privados?”, convém tecer algumas considerações adicionais, com a finalidade de aclarar dúvidas decorrentes para as pessoas ainda não muito acostumadas com a idéia de uma sociedade livre.

Naquele artigo, foi lançada uma idéia sobre a possibilidade de existência de um sistema de proteção e segurança fundado em bases privadas: cortes judiciais, polícias, bombeiros, etc, funcionariam todos de acordo com as chamadas deis de mercado. Tal como apresentei, a ênfase sobre a defesa de tal sistema reside na vantagem de os recursos poderem ser subtraídos das organizações ineficientes e desonestas, pelas pessoas que exigem eficiência e honestidade, o que não ocorre em um sistema de proteção e segurança estatal, onde o mandatário da hora tem acesso aos recursos tanto das pessoas boas quanto das pessoas más, e que por isto mesmo este sistema social tende a ser atrativo para as pessoas mal-intencionadas.

Certamente, com a exigüidade do espaço disponível para um artigo, não se pode dizer tudo; todavia, algumas dúvidas que podem ter sido suscitadas entre os leitores serão levantadas aqui. A primeira, aquela que segundo o nosso padrão mental estatizante surgiria por primeiro, certamente seria: de onde viria a autoridade para uma instituição privada investigar, prender, processar e executar uma pessoa?

Esta pergunta, certamente, tiraria do banco os detratores do liberalismo, que logo agitariam os braços em comemoração ao gol em favor do estado. Contudo, logo virá o bandeirinha pra dizer que foi terá sido um gol anulado. A primeira coisa que precisamos refletir sobre tal sistema, com relação a delegações de parcelas de poder, isto é, de autoridade, é que um sistema privado não abdicaria de leis. Com efeito, as leis são imprescindíveis em uma sociedade civilizada.

Como provas empíricas da correção desta linha de pensamento, como prova de que a auto-executoriedade pode ser não só justa, mas também eficiente, podemos citar que a lei brasileira autoriza os hotéis a reter as bagagens dos viajantes, com vistas à satisfação pelo pagamento de estalagem. Nos EUA, podemos vislumbrar um caso mais incisivo de auto-executoriedade privada: os caçadores de recompensas conseguem capturar criminosos procurados pela justiça com um dispêndio de recursos notavelmente menor do que as polícias estatais (e olhe que as polícias americanas são tidas como um exemplo de eficiência), sendo que quase sempre conseguem entregá-los com vida às autoridades, e além disso, com uma taxa mínima de prejuízo a terceiros (vítima de tiroteios, por exemplo).

Um segundo tópico diz respeito às pessoas consideradas hiposuficientes. Como poderiam elas obter os serviços de proteção e segurança privados? Esta questão merece um desdobro mais delongado, porém, de fácil compreensão. Em primeiro lugar, notemos que as pessoas hiposuficientes, ou, em termos simples, as pessoas pobres, são pobres justamente porque o estado lhes subtrai o fruto de seu trabalho. Basta pensar que atualmente o Brasil está consumindo 40,5% de toda a riqueza somente para sustentar o estado. Em 2008, os brasileiros trabalharão como servos até o dia 27 de maio, somente para sustentar a máquina pública. Mais além, estas pessoas, mais pobres ainda se tornam, porque o que o estado faz com a maior parte dos recursos arrecadados é distribui-lo para indivíduos que não trabalham ou não produzem, em despesas de consumo, tolhendo, portanto, as oportunidades de investimento racional econômico que seriam aproveitadas por empresas privadas se estes recursos estivessem correndo livres no mercado.

Raciocinando sobre este cenário, já poderíamos concluir que teríamos muito menos “hiposuficientes” do que temos hoje. Uma prova empírica disto é assaz eloqüente: nos países com maior índice de liberdade econômica, os pobres são mais ricos que os brasileiros. Nos EUA, pobres vivem em trailers, um dos meus sonhos de consumo. Em países que possuem tal índice, ao contrário, menor, os pobres são muito mais miseráveis que os pobres brasileiros, a um ponto relativo que poderíamos nos considerar orgulhosos em relação a eles.

Todavia, há uma outra análise que corre por outro caminho. Trata-se do nosso atual sistema policial-judiciário-correicional. Explico: Se alguém, digamos, um hiposuficiente, uma pessoa com poucos recursos, tem o seu carro usado roubado, é naturalmente justo e creio que disto não restem dúvidas, que esta pessoa tem direito a reaver o seu bem; também, da mesma forma, o agressor deve reparar eventuais prejuízos decorrentes de seu ato: se era um carro usado como fonte de renda, digamos, um táxi, o agressor então deverá pagar as férias dos dias parados segundo uma estimativa baseada em dados históricos. Mais ainda, deverá pagar por eventuais danos ao veículo, e também por danos à saúde física e mental da vítima. Até agora, não tratamos de nenhuma pena, de nenhum castigo, mas apenas de reparação.

Entretanto, em uma sociedade puramente capitalista, há outras despesas que devem ser satisfeitas pelo agressor: os custos de investigação, busca, captura, processo judicial e manutenção da execução judicial. Finalmente, agora sim, vem o apenamento, cuja estipulação do valor causaria mais problemas, haja vista não ser de índole objetiva, mas, enfim, que poderia ser estipulada arbitrariamente pela lei. Alguns autores liberais sustentam, com base em dados históricos colhidos em diferentes civilizações e épocas, que este valor deveria ser o dobro do prejuízo causado à vítima.

Como vemos, todo o dinheiro disponível para sustentar a queixa do cidadão pobre não é inexistente, mas, de fato, oculta sob os custos da intervenção estatal vigente em nossa sociedade. Hoje, devemos nos dar por satisfeitos quando pelo menos uma parte do roubo nos é retornada, o que, convenhamos, é freqüentemente raro. Depois, todos os custos decorrentes da ação estatal são suportados pelas vítimas, e não pelos agressores! Tempos atrás, minha esposa fora assaltada, e o máximo de atenção da polícia que obtivemos foi o direito de prestar queixa...pela internet! Quanto ao objeto do roubo, um celular...bem, esqueça! Não duvido que, caso ela tivesse reagido ao assalto, não estariam em breve tempo estacionadas uma dúzia de viaturas em frente ao nosso prédio! (Lembram da corajosa velhinha carioca?)

Sob um sistema policial-judicial-correicional privado, as entidades responsáveis por estas atividades poderiam ser pagas com a execução do agressor. Neste sentido, até mesmo o trabalho escravo – correta e estritamente compreendido como a medida correicional aplicada com vistas à satisfação dos prejuízos causados pelo próprio agressor, seria bem aceito como moralmente válido. Com relação à eficiência, tais entidades poderiam se fazer pagar e também pagar os direitos da vítima com os talentos do agressor: por exemplo, um famoso advogado poderia permanecer trabalhando de dia e dormindo na cela à noite, e pagar por todos os custos acima elencados não costurando bolas, mas através de sua própria atividade profissional, muito mais rentosa.
Uma boa referência bibliográfica sobre este assunto pode ser encontrada em “The Ethics of Liberty”, do filósofo Murray N. Rothbard, ainda sem tradução para o português, e encontrável no site do Instituto Ludwig von Mises (http://mises.org/)

Um Judiciário e uma Polícia Privados?


Por Klauber Cristofen Pires

Em sua obra-prima, “Ação Humana”, Ludwig von Mises destaca o papel do estado do tipo “night watchman” (vigilante noturno), para se referir ao estado mínimo, aquele cujas tarefas resumir-se-iam à proteção externa, papel consagrado às forças armadas, e à proteção interna, com uma polícia e um judiciário orientados para a garantia do respeito a um código de leis que proporcionariam um máximo de liberdade aos cidadãos e, por via de conseqüência, aos contratos por eles livremente firmados.


O filósofo Hans-Hermann Hoppe vai mais além. Em seu livro “Uma Teoria sobre o Socialismo e o Capitalismo”*, o filósodo alemão sustenta a viabilidade de corporações destinadas à segurança totalmente privadas, o que inclui não só a polícia, a defesa civil e os corpos de bombeiros, mas também as cortes e os juízes.

Com certeza, no atual ambiente mental prevalescente brasileiro, tal tese passaria por absurda, dada a nossa tradição estatista, ou melhor, estatólatra, na esteira da sociologia e do direito europeu continental, especialmente o romano e alemão. No Direito nacional, é recorrente a defesa da instituição “estado” pela pena dos mais famosos juristas, particularmente com a alegação de que os contratos livres esconderiam atrás de si diferenças de poder, especialmente o poder econômico, e portanto, como forma de proteger os “hiposuficientes”, deve entrar necessariamente a mão intercessória do estado.

Não obstante, quem quer que se permita percorrer com o professor alemão o caminho da liberdade responsável observará o quão terminativos são os seus argumentos. Para tanto, não bastará imaginar a sociedade em seu cenário atual, muito menos o brasileiro. É necessário que se contemplem quais seriam os contornos de uma sociedade livre, para sabermos como agiria e reagiria esta tal sociedade, nos dizeres de Hoppe, puramente capitalista.

A sustentação tradiconal em defesa do estado, isto é, com o objetivo de combater ou evitar a concentração de poder nas mãos de um só indivíduo ou de poucos, em prejuízo dos demais, ganha relevância, mas à primeira vista. À questão sobre se pessoas más se juntariam para prejudicar outras inocentes, não resta dúvida, isto aconteceria. Aliás, mais concretamente, isto acontece. Entretanto, a questão que devemos colocar é: quais as pessoas que apoiariam tais organizações? Em um cenário onde vigeria preponderantemente a liberdade de ação individual, quais as organizações que ganhariam o apoio maciço da população? As más ou as boas?

Em uma sociedade puramente capitalista, não há maior capital em uma organização que a confiança de que esta amealha do público, isto é, a sua tradição. Um exemplo muito clássico são as sociedades classificadoras. Nascidas em um ambiente onde o liberalismo começou a se fazer compreendido de forma ostensiva pela população, estas empresas começaram suas atividades como inspetoras de navios, e hoje se estendem a quase todos os grandes empreendimentos, tais como ferrovias, a indústria aeronáutica, represas, pontes e mesmo edifícios. Sua função de inspeção foi assaz importante para que as empresas seguradoras, exportadores e importadores pudessem avaliar com mais precisão os riscos decorrentes de seus negócios.

Ora, não há dúvidas de que os armadores, durante estes mais de três séculos de existência, têm tentado seduzir ou mesmo subornar os inspetores destas empresas de vistoria, com a finalidade de subirem a classificação de seus navios, ou mesmo de tentar salvar alguns destes de uma reprovação. Entretanto, neste mercado, onde a confiança vale mais que o ouro, simplesmente não há notícia de tais fatos, eis que compremeteria todo o mercado de uma forma trágica.

Claro que, se algumas destas sociedades fosse negligente com seus serviços, privilegiando um uísquezinho por fora em detrimento de sua missão, encontraria cada vez mais em seu caminho armadores piratas, enquanto os empresários sérios do ramo, ao contrário, fugiriam dos seus serviços, já que seus navios fossem classificados por uma empresa classificadora de má fama perderiam os melhores contratos.

Portanto, o que o liberalismo tem a dizer sobre organizações fundadas e mantidas por pessoas más guarda relação direta com a população: se esta for uma população má, o mal prevalecerá, sem dúvida, aliás, tanto quanto em uma sociedade cujos serviços fossem estatais; mas se a maioria da população entende que é conveniente apoiar as empresas boas, e neste caso específico, os tribunais, os investigadores e as polícias privadas voltadas para o bem, então o que teremos será a vitória do bem sobre o mal, do honesto sobre o desonesto, já que os bons, sobrepujando os maus, apoiarão e financiarão corporações boas, que se manterão no mercado, enquanto os maus apoiarão e financiarão as empresas más, que ou terão vida curta, ou viverão precariamente em estado de marginalidade.

No caso do sistema de segurança estatal, dá-se justamente o contrário, e não é por outra razão que os piores indivíduos enxergam na carreira política a sua escada ascensória pessoal. No sistema de segurança e justiça estatal, as pessoas más tomam a posse dos recursos tanto das pessoas más, quanto das pessoas boas, e frequentemente as usam para o mal. Exemplos, no nosso país, não faltam: no Pará, a governadora Ana Júlia Carepa editou decreto que proíbe a Polícia de atuar em questões de litígios agrários. No estado do Paraná, o Hugo Chaves do Paraná, o governador Roberto Requião simplesmente transformou a Polícia Militar, de um órgão de estado, para um órgão de governo, ou melhor seria dizer, transformou-a em sua milícia particular, eis que ostensivamente descumpre ordens judiciais de reintegração de posse e dá de ombros à invasão e depredação de praças de pedágio. No Rio Grande do Sul, as FARC – Forças Revolucionárias da Colômbia, têm tido livre circulação, inclusive para fundarem escolas de índole maoísta, o que é expressamente proibido pela constituição (proibição de manter instituições paramilitares – e proibição de incentivo ao crime).

Se avaliarmos as questões pelo caso da eficiência, mesmo no atual cenário brasileiro, podemos comparar as entidades privadas atualmente permitidas, mesmo com as limitações de alcance a que são submetidas, e veremos que a eficiência delas vence de longe as correspondentes estatais: os detetives particulares têm uma taxa de resolução de casos maiores que as verificadas pelos serviços de investigação das polícias; os tribunais de arbitragem solucionam seus casos em tempo menor e com maior satisfação de ambas as partes do que as cortes estatais; os serviços de proteção patrimonial, tanto eletrônica quanto humana, são mais cada vez mais requisitados, dado à falta de confiança do cidadão brasileiro no serviço de patrulhamento ostensivo das polícias.

Pergunte a si mesmo: Que instituições você próprio contrataria, apoiaria e financiaria? As eficientes ou ineficientes? As honestas ou desonestas? Pense nisto!

* Disponível para dowload na língua portuguesa e com a permissão expressa do autor, em arquivo PDF, nos sites Parlata, Causa Liberal, Movimento Endireitar, bem como no meu próprio blog, Libertatum.

quarta-feira, 16 de abril de 2008

Como se Destroem os Nossos Valores!

Por Klauber Cristofen Pires

Recentemente, em uma fila para um caixa eletrônico, teve lugar um caso que entendi merecer ser retratado neste artigo. Trata-se de como os nossos valores morais, a nossa liberdade, e sobretudo, a nossa civilidade, vêm sendo atingidas. O que ocorreu foi um caso que se repete corriqueiramente no Brasil inteiro e por isto não chama minimamente a atenção de ninguém. Todavia, por isto mesmo seja tão deletério.

Estava eu em quinto lugar em uma fila para um caixa eletrônico, dentro de um supermercado. Havia saído um pouquinho antes do meu trabalho, e pretendia sacar o dinheiro para, quando pegasse a minha filha na escola, pagar a instituição. Logo, portanto, se vê que eu tinha alguma pressa em executar a tarefa. Atrás de mim, estava uma senhora, possivelmente na casa dos sessenta, e na minha frente, em quarto lugar, um senhor, também da terceira idade (ah, estes termos politicamente corretos...).

Estávamos todos calmos esperando a nossa vez de acessar o caixa eletrônico quando, ao passar por nós uma mulher, aparentando estar na casa dos trinta, e vestindo uma camiseta de uma pastoral “não-sei-de-quê”, nos indagara a todos na fila por que a senhora que estava atrás de mim não passava à frente, evocando pra isto, segundo seus próprios termos, o “Estatuto do Idoso”. Na verdade, ela fez vez mais que isto: protagonizou a retirada da senhora da fila, para colocá-la junto à máquina, e tentou persuadir os que lhe precediam a aceitar a sua condição de idosa, e portanto, seu “direito”. Tudo com um bonito sorriso no rosto...

Bom, até aí, tudo bem. Embora eu não concordasse, a princípio, acovardei-me e me resignei, pensando no que teria de suportar caso protestasse, na minha condição de homem razoavelmente jovem e com boa saúde. Todavia, a atitude da interventora, indignada com a “injustiça social” a que assistia, não resultara tão bem sucedida, isto é, desde que o senhor que se posicionava à minha frente não se calara. Ele não aceitou, ou melhor, apenas protestou - isto porque ela já tinha puxado a senhora para a frente - com o argumento de que ele próprio tinha setenta e dois anos, portanto, mais velho que ela, que como viemos a saber, nem havia chegado aos sessenta, isto além de ter um compromisso que lhe pedia a pressa.

O protesto gerou uma breve perturbação na militante com cara de religiosa, possivelmente, em primeiro lugar, por ter seus argumentos contestados, e em seguida, por eles terem sido derrubados com um argumento que não via como treplicar. Quando deu por si, balbuciou algo como convidá-lo a também exercer o seu direito de preferência (mas agora, então, já atrás da senhora que antes se lhe seguia duas posições na retaguarda), e ao fim, percebendo o clima animoso que causara, saíra, como se diz, à francesa....

Bom, agora vamos examinar os fatos, começando a constatar que estávamos todos em um clima de paz e harmonia antes da chegada da estranha (que bem se diga, nem estava na fila!), cada qual com a sua idade, cada qual com os seus próprios compromissos. Tenho a certeza que, caso perguntássemos a cada um dos que aguardavam a sua vez, todos responderiam que teriam um motivo para estar ali, e isto é óbvio!

A seguir, vem um fato que o Estatuto do Idoso não previu: ora, se uma pessoa tem o direito de avançar na fila, mediante o argumento de que é mais velha, então qualquer pessoa que tenha mais idade que ela também deve ter o mesmo direito em relação a ela própria! Ou não? Neste caso, os dois, o senhor que me precedia, e ela, que me sucedia, teriam ambos o direito de avançar, mas ele teria a primazia, por ser mais idoso, certo? Então, que tal imaginarmos adotar um censo permanente para um re-posicionamento constante dos idosos, a cada vez que uma simpática velhinha ingressasse na fila? A lei bem que poderia exigir que os bancos contratassem auxiliares especializados na realização desta tarefa, para trabalhar em turnos de revezamento constante, em cada caixa eletrônico!

Calma, ainda temos mais: Ora, se uma senhora, diga-se, pelo dito Estatuto, tem o seu direito a partir dos 65 anos, que fundamento seria filosoficamente suficiente para não aceitar que, digamos, uma mulher, apenas um dia mais velha que eu, não merecesse a extensão deste direito com relação a mim? Assim, toda a fila seria constantemente re-posicionada pelo critério de idade! Nada mais justo (ainda que talvez algumas pessoas mais jovens, em tese, jamais viessem a acessar o caixa!)

No título deste artigo, faço uma referência aos nossos valores civilizatórios, e isto não foi por engano. Ainda temos muito de bom, e enxergamos isto todo dia, quando alguém dá o banco do ônibus para uma mulher grávida, ou quando somos gentis e respeitosos com os mais idosos, seja por justamente passar-lhes à nossa frente em uma fila. Ainda num dia destes, uma jovem ofereceu-se para segurar uma sacola minha num ônibus (ela vinha sentada, e eu, em pé). Contudo, é importante perceber que em cada um destes casos há um juízo de conveniência e oportunidade vivenciado concretamente pelas pessoas envolvidas.

Por exemplo, a jovem, que se ofereceu para carregar a minha bolsa, possivelmente não teria feito tal convite se a sacola que eu carregava fosse leve; poderia ocorrer também que eu me compadecesse de alguém mais jovem ainda que eu, ao constatar seu notório estado de saúde, e lhe desse a vez em uma fila, ou, ao contrário, negasse dar a vez a um velhinho, se eu tivesse uma imprescindível urgência em meu compromisso, mais importante, portanto, que o resultado vislumbrado ao dar a preferência a alguém que, em tese, já dispõe de mais tempo que eu.

Nossas regras de boa civilidade asseguram o estado de paz e de comunhão em sociedade. Fazem-nos sentir orgulhosos de nossas atitudes e elevam os nossos sentimentos para tornarmo-nos capazes de realizar as atitudes mais nobres. Mais além, reforçam o nosso patriotismo e o nosso padrão geral de vida.

Infelizmente, é exatamente o contrário que se dá quando alguém tem a idéia estúpida de subtrair a moral do povo para regulá-la segundo a lei. Quando um político idiota (ou espertalhão) inventa uma coisa destas, ele simplesmente troca um juízo de oportunidade de quem vivencia uma situação concreta pelo seu, distante, arrogante e autoritário, e cria o que vimos naquela cena, ou seja, a discórdia e o descontentamento. Aos poucos, vamos delegando os bons costumes, e com eles a nossa ética e a nossa moral, para a regulação pelo Estado, e aí vem o pior: começamos a nos tornar um povo incapaz de colocar nossos políticos nos eixos! Moralmente frouxos e relapsos, seguimos, de bolsa-esmola em bolsa-esmola, acobertando a maior série de escândalos que já se viu na história deste país, isto só para usar os seus próprios termos.

segunda-feira, 14 de abril de 2008

Comércio Justo é Negócio Livre!


Por Klauber Cristofen Pires

Há uns dois anos atrás, participei de um curso de formação de gerentes, conduzido por uma das empresas de consultoria e ensino empresarial mais destacadas do país. O lema da empresa era “por um mundo melhor”, e a tônica da sua mensagem assentava-se no conceito de “comércio justo” e na negociação “ganha-ganha”.

Modismos vindos da área de Administração são comuns. Muitas vezes, conceitos simples, até mesmo domésticos, são empacotados em embalagens que os façam parecer fórmulas inéditas. O programa 5S foi um destes: por exemplo, meu tio-avô, que era carpinteiro, já mantinha sua oficina segundo os padrões de limpeza, organização e uso correto de suas ferramentas. Certamente, caprichoso como ele era, também não se perdoava por fazer um serviço malfeito, nem se acomodava com seus atuais conhecimentos, procurando, ao invés, sempre melhorar. Eureka! Simples, não? Porém, muitas empresas investiram pesado para contratar empresas de consultoria para repassar estes conceitos sob uma roupagem profissional e inovadora.

Enquanto estes produtos sejam vendidos como conceitos que proporcionem maior produtividade às empresas e um incremento na motivação de seus funcionários, não há uma maior preocupação de minha parte, que é defender um verdadeiro espírito capitalista e uma sociedade livre. Todavia, a pedra no caminho encontra-se hoje justamente nesta nova onda que anda ganhando terreno, inclusive com ampla contribuição da mídia.

Afinal, o que vem a ser o comércio dito “justo” bem como a negociação “ganha-ganha”? Comecemos pelo último. Consideremos, para tanto, uma sociedade livre, em que a produção de bens e serviços, bem como o exercício de qualquer trabalho, não esteja subordinado a quaisquer leis protecionistas ou trabalhistas, ou ainda, que tais restrições existam, mas de forma a não impedir ou restringir de forma considerável a livre-iniciativa.

Ora, o que podemos entender por uma negociação? Não será justamente o confronto de idéias, entre duas pessoas que detenham a posse de alguma coisa, para trocarem entre si? Se estas pessoas, de fato, detém a propriedade sobre seus bens ou sobre seus talentos, o que pode vir a determinar as suas decisões senão a própria vontade delas? Com a escravidão, a única opção de escolha do servo é morrer, haja vista que uma das partes está sob coação violenta. Fazer uma negociação, ao contrário, é justamente dialogar, chegar a um acordo; ocorre que, para que este seja justo, basta apenas que cada uma das partes procure alcançar o que lhe convém.

Todo negócio, considerado ex-ante, é vantajoso para ambas as partes. Ex-ante, porque, por exemplo, eu posso me arrepender – depois – do serviço de lanternagem que fizeram no meu carro; entretanto, mesmo este arrependimento não influencia no exercício de quaisquer outras negociações quanto ao fundamento que as rege, senão pelo detalhe, como o meu, que haverei de procurar uma nova oficina da próxima vez. A alternativa para que o comércio não seja vantajoso é a decisão das partes de não chegarem a um acordo. Neste caso, um permanece com o dinheiro, e o outro permanece com o seu bem ou com o uso de seu corpo.

Portanto, quando uma empresa de consultoria empresarial, particularmente uma que é ponta-de-lança no mundo atual dos negócios, sugere aos seus alunos que considerem a satisfação da outra parte como requisito para um bom negócio, talvez assim mais preocupada com um “mundo melhor” do que mais propriamente com a lucratividade da empresa que é sua cliente, na verdade, confessa sua ignorância sobre o fundamento da sociedade livre e pior, lança uma informação errônea e até mesmo preconceituosa, na medida em que parte do princípio que um dos interlocutores conheça de antemão e melhor os objetivos do outro, do que este mesmo!

Esta informação, disse acima e agora explico, torna-se errônea, no tanto que representar um preço falso, e daí, uma informação falsa ao planejamento de pessoas e empresas. Oportunamente, aqui, começamos a tratar do movimento pelo “comércio justo”. Pois, um dos pilares deste conceito antinatural (antinatural, por que tem entre seus corolários princípios firmados apenas arbitrariamente) é o de que o produtor primário (digamos, o agricultor) deve receber mais pelo seu produto, e que a figura do atravessador seja eliminada.

Que ele – o agricultor - deva receber mais, não há dúvida; certamente todos os agricultores merecem ganhar mais pelo trabalho que realizam. Assim também como eu e os professores, os borracheiros e quem mais trabalhe de forma honesta e dedicada. O problema é que o dinheiro não é uma medida fixa como são o peso, que medimos em quilogramas, ou o comprimento, que medimos por metro. O preço é um meio de troca, mas a sua medida, parafraseando o “Tio Patinhas”, depende de um “quaquilhão” de informações que nos chegam a todo instante, e que influenciam nossas escolhas, tais como, digamos, a de ficar com uma dentre várias marcas de feijão, ou, ao invés, de abster-se dele, substituindo-o por soja, se for o caso.)

Entretanto, se de forma arbitrária, os agricultores passarem a receber mais do que alcançariam em uma negociação honesta, o caos estará formado. Em primeiro lugar, a alta lucratividade resultante atrairá mais produtores, e o primeiro resultado visível disto serão silos atolados de alimentos sem compradores, e os coitados dos agricultores endividados e com um elefante branco em suas casas. Mais conseqüências desastrosas? A área utilizada para agricultura aumentará sem necessidade, e um segundo princípio do comércio justo, que é o de produzir sem prejudicar a natureza, irá pro brejo!

Mais ainda? Sem os atravessadores, estas figuras tão mal-entendidas pelos de mente marxista, as pessoas terão dificuldade de encontrar os produtos nas prateleiras nos supermercados, e terão que se deslocar até o produtor para adquirir-lhes os alimentos. Este deslocamento, feito de forma individual, custará um “zilhão” de vezes mais, o que aumentará, por tabela, o preço dos alimentos, simultaneamente a um aumento da poluição (imagine trocar um caminhão que suporte 60 toneladas por 60000 carros de pessoas que desejem comprar um quilo de feijão!). Ah não? É o próprio produtor que vai levar seus produtos até as feiras? Ahh certo, eu não sabia! Mas então isto significa que ele vai utilizar uma parte substancial do seu trabalho e de sua riqueza (terá que comprar e manter um caminhão, no mínimo) para vender, e não para produzir, e isto se refletirá no preço dos alimentos, que subirão – ainda mais!
Outro pilar do “comércio justo”, é o de o comerciante pagar corretamente seus impostos. Lá vêm de novo os esquerdistas a maltratar a língua! Pagar em dia os impostos não traduz justiça, mas honestidade! Quem não paga seus impostos é desonesto, não injusto! Quem não os paga deve ser processado e sofrer as penitências que a lei determinar, e isto não se confunde com qualquer campanha para um “comércio justo”.

Portanto, não há uma alternativa mais justa para o comércio livre. Sempre que o seu cliente enxergar vantagem em negociar com você ou com a sua empresa, ele o fará. Há que se prestar atenção a vantagens que muitas vezes não se encontram no papel, mas são fundamentais para o sucesso de uma empresa: bom atendimento, presteza em solucionar os problemas dos clientes, confiança, talento e criatividade são itens que pesam nas escolhas para a formalização de um bom negócio, mas que não entram em planilhas de composição de custos. Estes conceitos podem, muito bem, serem transmitidos como integrantes de uma honrosa e próspera relação comercial, sem se confundirem com um objetivo abstrato como o de procurar um mundo melhor ou o de procurar uma justiça, arbitrariamente definida, na condução das negociações.

quarta-feira, 9 de abril de 2008

A Liberdade de Expressão, como um Direito de Propriedade

Por Klauber Cristofen Pires
(inspirado no livro Ethics of Liberty, de Murray N. Rothbard)


Quando falamos sobre liberdade, é usual nos referirmos a alguma liberdade específica: liberdade de opinião e de expressão, liberdade de ir e vir, liberdade intelectual e artística, liberdades do mar, e assim por diante.

Talvez porque a conquista da liberdade tenha se dado de forma tão sofrida, obtida com tanto sacrifício, depois de tanto sangue derramado, e depois de pelo menos três milênios desde que tal conceito tenha começado a ganhar significado, é que hoje usufruamos de, digamos assim, tantas destas.

Nada mal, e nem seria justo criticar quem no passado tenha lutado com tanto sacrifício por qualquer uma. Entretanto, talvez seja a hora de darmos um passo adiante, para compreendermos melhor a doutrina da liberdade, no que tange à sua amplitude e aplicação.

Segundo os austríacos, não há que se falar em liberdades “para alguma coisa”. Para eles, a liberdade é um direito pleno do ser humano, de tal modo que, houvéramos nascido em um mundo idealmente livre, tal palavra nem sequer teria existência em nossos dicionários. A liberdade é o nosso estado natural, não fazendo sentido, pois, como desejamos tratar adiante neste artigo, da chamada “liberdade de expressão”.

Sobre o que vamos discorrer agora é de suprema importância quando percebemos que, lado a lado com cada liberdade específica, surgem logo as exceções e restrições, e às vezes, até mesmo injustificáveis privilégios. Eis aí o problema: quando as liberdades são tratadas em separado, de forma específica, surgem desde logo as tentações para cerceá-las, justamente por que assim fica mais fácil. A liberdade específica não é encarada como um estado natural do indivíduo, mas como uma concessão do estado, mais propriamente, algo que possa ser regulamentado “em prol do interesse público”.

Se nos detivermos no problema da liberdade de expressão, veremos a onde chegamos ao tratarmos de forma tão equivocada a questão da liberdade. Nossa Constituição, por exemplo, é “danadinha” neste aspecto. Somente em relação à liberdade de expressão, há, por exemplo, o direito de reunião, que autoriza as pessoas a se aglomerarem em qualquer via pública, não sendo para tanto, mais que necessário, avisar com antecedência o poder público. Só por causa disto, usualmente os cidadãos das grandes cidades ficam prejudicados, ou mais propriamente, têm o direito de ir e vir seqüestrado por gente que entende que suas reivindicações políticas ou salariais são mais importantes que os direitos jurídicos já consolidados de milhares de outros. Vejam que incongruência: reivindicar direitos é mais importante que respeitar os já consolidados!
Também a liberdade de expressão fica cerceada quando o estado começa a inventar coisas como diploma de jornalismo, conselho de jornalismo, e que tais. Ora, esta profissão se vale da expressão como ferramenta de trabalho, mas não há absolutamente nada – em termos de fundamento – que deva proibir qualquer pessoa de transmitir notícias e opiniões, e são prova disso tanto os blogs, que exponenciaram aos céus tal possibilidade, quanto o currículo de alguns dos maiores jornalistas de nosso país, que jamais obtiveram diploma ou foram sindicalizados.

O grande problema da liberdade tratada de forma específica, e no caso do assunto aqui em tela, ou seja, a liberdade de expressão – é que, por ser categorizada de forma errônea, surgem cada vez mais casos onde exceções e restrições se façam necessárias, oferecendo com isto o pretexto para os seus inimigos defenderem seu controle ou até mesmo a sua extinção. Imaginemos, por exemplo, se no meio da execução da ópera Aída, alguém decidisse, de dentro da platéia, começar a cantar o tico-tico no fubá. A rigor, tal pessoa estaria exercendo a sua liberdade de expressão também. Contudo, alguma coisa, meio que intuitiva, nos avisa que, embora cantar o “tico-tico lá, o tico-tico cá..” não seja exatamente uma coisa feia, errada se torna no meio de um teatro. Imaginemos, ainda, um caso mais usual, quando observamos a má conduta de algumas pessoas, sobretudo estudantes, em eventos tais como congressos e seminários, a tal ponto que muitas vezes logram êxito em inviabilizar-lhes a realização.

Entre os liberais austríacos, todos estes entraves são resolvidos a partir de uma perspectiva bem diferente. Sem nem sequer pensar em restringir a liberdade de ninguém, o que entendemos por “liberdade de expressão”, por eles é tratada segundo o direito de propriedade! De uma só tacada, todos os problemas assim desaparecem. Isto porque, o que se vai dizer, quem vai dizê-lo e o modo como será dito são determinados pelo dono do evento! Simples assim!

Então vejamos: se eu compro um ingresso de cinema, na mesma hora eu faço a minha adesão a um contrato. Este contrato estabelece algumas normas: não usar o celular, não tirar fotografias, não importunar a sessão. Quem quer que pense em cantar lá o tico-tico, estará não intuitivamente, mas objetivamente quebrando o contrato, e autorizando o dono a usar da força, se necessário, para colocar esta pessoa para fora. Em eventos do tipo reunião, dá-se o mesmo: em um congresso de médicos, não há quem tenha o direito de protestar contra o desmatamento da Amazônia, ou mesmo sobre questões que em aparência digam respeito, como por exemplo, a questão do uso de células-tronco, se os donos do evento não tiverem previsto a abordagem de tal assunto. Quem quer que deseje protestar contra o desmatamento da Amazônia ou o uso das células-tronco, que monte seu próprio evento!

No caso dos bens públicos, o problema se torna um pouco mais difícil de resolver, mas isto justamente é porque temos esta entidade chamada estado. Mas ainda assim, é um problema apenas aparente. Bem entendida a questão da liberdade de expressão, isto é, como decorrente do direito de propriedade, torna-se claro que determinadas atividades hoje exercidas pelo estado nem sequer deveriam existir, tais como tv’s públicas, patrocínios a filmes e peças de teatro, etc. Todas estas manifestações intelectuais e artísticas deveriam estar a cargo exclusivo das mãos privadas.

Já quanto aos bens públicos, propriamente, o seu uso deveria estar restrito à finalidade precípua para o qual foram criados. No caso de grandes avenidas, torna-se evidente que é uma injustiça que alguns cidadãos, para reivindicarem direitos, seqüestrem os já existentes dos demais, sendo que eles podem usar espaços tais como as praças públicas, inclusive os coretos que nelas abundam, sem uso. De outra forma, se outro evento já existe em algum destes lugares, ainda assim o direito de propriedade, usado de forma análoga, pode ser usado, para definir como o possuidor de direito aquele que ocupou o determinado espaço antes (apropriação original).

Obs.: Desde que traduzi o livro “A Theory of Capitalism and Socialism”, decidi que não escrevo mais estado com a inicial maiúscula. Obrigado pela compreensão.

terça-feira, 1 de abril de 2008

Pais e Mães, Prestem Atenção!


Por Klauber Cristofen Pires

A todo pai e mãe que tenha preocupação com a educação de seus filhos, e até mesmo a qualquer pessoa com um mínimo juízo na cabeça, peço que leia este artigo com atenção. O que passarão a ler a seguir foi uma breve compilação de erros que eu encontrei no livro didático que minha filha, cursando atualmente a 2ª série (3º ano, pela nova nomenclatura) usa em sua escola.


Para quem se embalava na crença que a decadência do ensino brasileiro acomete apenas o ensino público, o alarme, que já passou de amarelo a vermelho há muito tempo, salienta o fato de ter sido um livro comprado, e de ter sido ser utilizado em escola particular.


Trata-se da obra Construindo e Aprendendo – Ciências – Editora Construir - 2º Ano/3ª série, o qual, não se sabe se a despeito ou mérito por seguir as mais novas recomendações do Ministério da Educação, assim faz propaganda no alto de sua capa.


Foi num domingo em que me pus a avaliar a matéria conjuntamente com a minha filha, visando a prepará-la para uma prova que teria na segunda-feira seguinte, que me deparei com os erros que estão aqui arrolados. Num só capítulo – nos outros ainda não passei os olhos de forma judiciosa - encontrei-me com casos flagrantes de informações falsas, textos truncados, semanticamente pobres e gramaticalmente errados.


Logo no começo do capítulo 1, o livro dá a seguinte definição de Universo: “Universo é tudo o que existe, é bem mais do que possamos imaginar”. Certamente que o vocábulo Universo possui diversas acepções, sendo até mesmo largamente usado na Matemática para designar um determinado conjunto que defina uma totalidade qualquer. Entretanto, o objeto de estudo que trata o capítulo em comento é o Cosmo, pelo que seria mais recomendável que os autores adotassem um conceito astronomicamente estrito. Isto estaria mais em consonância com as perguntas que as próprias crianças, já dotadas de um senso lógico intuitivo, têm feito acerca do conceito acima formulado, como foi o caso de minha filha: “-papai, uma casa, um prédio, também fazem parte do Universo?” Ao que eu respondi que não, propriamente, pois estariam enquadrados no conjunto das obras humanas, não correspondendo aos fenômenos naturais.


Dois parágrafos longos terão sido necessários apenas para criticar uma frase tão curta e infeliz. Desta vez, sob o aspecto gramatical, há uma flagrante falta da conjunção aditiva “e” entre as orações, que “suponho”, sejam coordenadas. Não bastasse, a segunda oração “...,é bem mais do que possamos imaginar” é gramaticalmente falha e semanticamente nula, pois lhe falta o objeto direto (bem mais... o quê?), para lhe prover algum sentido, isto sem dizer que não adiciona nada ao ensino.


Logo adiante, para explicar como o Universo surgiu – o livro em momento algum informa que se trata de uma teoria, tratando o caso como fato comprovado. Ainda, não informa que esta teoria se chama BIG BANG (“Grande Explosão”).


Nos exercícios (Ver pág. 8, exercício 2, letra D), uma frase para ser completada associa a formação dos corpos celestes à movimentação das partículas originadas pelo BIG BANG, o que é falso, pois a “grande explosão” teria sido responsável pela dispersão, não pela aglomeração dos corpos. A aglomeração dos corpos teria ocorrido por atração gravitacional e esfriamento das partículas.


Segue o livro adiante para afirmar que todos os astros giram em torno do Sol. Tomando ao pé da letra, a criança terá a impressão, por exemplo, que a Lua gira originariamente em torno do sol, pari passu com a Terra, o que não é verdade, já que apenas gira ao redor do Sol pelo fato de ser arrastada pelo nosso orbe, ao realizar ao seu redor (e não ao redor do Sol) seu movimento de translação.


Um pouco mais, e descobre-se um flagrante de informação falsa: Não são Netuno e Vênus que possuem rotação invertida em relação aos demais planetas, como informa o exemplar do livro, mas Urano e Vênus!


Ao explicar sobre as estações do Ano – O livro faz uma referência cuja matéria referida encontra-se assaz distante – Começa, na página 17, após o título que lhe encabeça a matéria, pasmem, com a expressão “Devido a esta inclinação...”. O problema é que a inclinação (da Terra) a que ele se refere, está na página 15, antes de outro texto, também intitulado, que por sua vez explica o movimento de rotação da Terra, à página 16. Dá para notar aqui a operação recorta-e-cola mal feita, sobre a qual os revisores dormiram.


Ainda sobre as estações do ano terrestre, o livro não explica o efeito da translação, que por ser elíptica resulta em diferentes distâncias da Terra ao Sol, informação esta que é de suprema importância para compreendermos as diferenças de temperatura e de intensidade da incidência solar sobre a Terra no decorrer da translação.


Quase no fim do capítulo, o livro utiliza uma frase totalmente desconexa de sentido: “Em cada estação do ano, a vida na Terra se comporta de uma maneira diferente, tanto a humana como a animal.”. Ora, também a vida vegetal se comporta de maneira diferente, só pra começar. Aliás, também a não-vida, já que o clima também muda, independentemente de nele haver vida ou não. O que aqui se salienta é a extrema pobreza de uma frase que poderia ter sido mais feliz se introduzisse corretamente o que pretendia dizer e não disse. Colocada a esmo no texto, totalmente desarticulada, parece um espantalho no meio do Saara.


Chegamos ao fim. Para brindar o leitor, os autores lançam uma pérola, ao afirmar que o município de São Joaquim, famoso nos livros escolares brasileiros por ser um dos poucos locais em nosso território onde ocorre a neve, situa-se no estado do Rio Grande do Sul (Para quem não sabe, fica em Santa Catarina).


O principal propósito de ter aqui feito esta denúncia é, de minha parte, conclamar os pais, mães e responsáveis para que acompanhem mais de perto o desenvolvimento de seus filhos na escola. Não há outra solução para o sucesso dos seus filhos do que chegarem do trabalho e junto a eles investirem algumas horas, bem como assim também nos fins de semana, para colocar a matéria deles em dia.


Também não há outra solução para por fim a esta indústria editorial vagabunda e mal-intencionada, justamente por ser tão vagabunda. Sinceramente, eu pensei em processar a editora, levar ao conhecimento do Ministério Público, do Procon ou sei lá quantos órgãos. No fim, um vai acabar empurrando pra outro, e não vai dar em nada. Eu simplesmente não acredito nestas coisas. Eu acredito numa coisa que é mais difícil, mas apenas na aparência: que outros cidadãos brasileiros tomem a atitude de vigiar seus filhos e não os confiarem cegamente àqueles que hoje assim se denominam educadores. Quando nós tivermos acordado uma fatia representativa de pais e mães na população, será o momento destas porcarias começarem a desaparecer do nosso cenário estudantil.


Pessoalmente, eu credito a falência do ensino brasileiro especialmente a dois fenômenos: o primeiro deles se chama livro didático. Por causa desta desgraçada invenção, professores se idiotizam na indolência, já que o livro-mestre traz, com todo o conforto, uma versão gabaritada, e os alunos bitolam-se na verdade suprema de um folhetim sofrivelmente mal redigido, já que é feito para ser descartado, por vir com os exercícios em suas próprias páginas. Pesquisa que é bom, nada!


Se outra causa me arriscaria a apontar, seriam as licitações públicas. Com o Estado brasileiro dominando aproximadamente 40% de nossa economia, via tributação, o grande carro chefe das editoras têm sido o de confeccionar livros baratos o bastante para vencerem licitações, em detrimento da qualidade. Como razoável experiência nesta área, já tenho visto o quanto a indústria da licitação pública (e também dos concursos públicos) tem prosperado, fabricando produtos (não só livros, mas também canetas, papéis, cadernos, e outros itens de escritório) de qualidade péssima, com o único fim de vencer as concorrências.


O filósofo Olavo de Carvalho não se cansa de denunciar a falência de nosso ensino, e acusa – com razão – nossas crianças por serem as mais burras do mundo! Isto pela recorrência com que, nas diferentes olimpíadas e torneios escolares, consagram-se teimosamente na lanterna entre as demais nações.


De acordo com o professor Olavo de Carvalho, e com a minha expressa concordância, nada disso tem a ver com salários baixos de professores, ou com falta de recursos materiais, como computadores, por exemplo, tal como tem sido moda afirmar - que é a primeira coisa que os intelectuais de carteirinha apontam. Já conversei com pessoas de países muito mais pobres que o Brasil, e muitas delas demonstravam conhecimentos que tenho julgado bem superiores aos de um cidadão médio brasileiro, sendo que muitas vezes dominavam uma ou mais línguas estrangeiras com razoável fluência.


Na verdade, o nosso ensino está assim porque há muito vem trilhando a senda da preguiça, da falta de disciplina, da falta de pesquisa, da mentalidade centralista, segundo a qual os professores alinham-se voluntaria ou compulsoriamente a linhas traçadas por órgãos estatais, tais como o Ministério da Educação, e de uma torpe alcatéia de ideólogos políticos de linha marxista, que desejam usar nossas crianças como seus cavalos de batalha. Portanto, pais, mães e responsáveis, abram o olho!