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sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

O tempo


Só com um grande susto passamos a dar importância ao que realmente importa: viver tudo intensamente e com todos que pudermos.
Por João Bosco Leal

Alguns anos atrás, de um médico que me salvou de um grande problema com uma cirurgia, ganhei um livro do filósofo Sêneca, "As relações humanas". É a transcrição de uma série de cartas que o autor, já em sua velhice, após ter se retirado da Corte do Império Romano e vivendo em sua casa de campo entre os anos de 62 e 65 d.C., escreveu a Lucílio, seu discípulo e amigo.
Em uma delas Sêneca diz: "Sê o proprietário de todas as tuas horas. Serás menos escravo do amanhã se te tornares dono do presente. Enquanto a remetemos para mais tarde, a vida passa. Nada, Lucílio, nos pertence; só o tempo é nosso."
Penso que, principalmente por haver escapado de uma doença que atualmente acomete e mata tantas pessoas, sem sequer ter de fazer nenhum tratamento além da cirurgia, acabei por entender com mais profundidade o que Sêneca tentava passar a seu aluno.
Todos sempre falamos bastante sobre o tema "como deveríamos viver", mas dificilmente levamos a vida de modo a aproveitar verdadeiramente o que é a única coisa que realmente nos pertence - o tempo.
Assisti a uma comédia retratando um empresário de sucesso, sem tempo nenhum para a família que, ao ouvir da esposa reclamações desse tipo respondia da maneira mais comum a todos: o que está lhe faltando? Dou a você e às crianças tudo o que me pedem... e tudo o mais que todos já sabemos sobre esse tipo de argumento.
Quando a esposa lhe dizia que o que faltava a ela e aos filhos era sua presença, amor, carinho e companheirismo, sua resposta era a de que não tinha tempo para essas bobagens e que ela deveria estar sempre agradecida de possuir tudo, do bom e melhor enquanto milhões gostariam de possuir o que ela tinha.
No filme, logo ao desligar o telefone o empresário recebeu aquela visita que ninguém quer receber - a senhora morte -, que lhe informou haver chegado sua hora e que viera buscá-lo.
Apavorado o homem fez todos os apelos possíveis, dizendo que tinha muitos negócios pendentes que dependiam de sua decisão, várias reuniões e viagens de negócios agendadas, centenas de famílias dependentes de suas empresas e tudo o que imaginou possível dizer para convencer aquela senhora a se esquecer dele, chegando inclusive a tentar corrompê-la para ganhar mais quarenta anos de vida.
Depois de ouvir que como não havia aproveitado seu tempo com a família agora sua esposa iria aproveitar a vida com seu dinheiro, mas com outra pessoa, que a levaria a bailes, cinemas, teatros e passeios, o homem ficou ainda mais desolado e implorando muito, ganhou um novo prazo, de mais cinco dias vivo.
Seu desespero com o prazo diminuto foi enorme e nem se preocupando em desmarcar suas reuniões, ligou para a esposa pedindo que preparasse imediatamente suas malas e dos filhos, pois iriam viajar a passeio.
O filme é um exemplo clássico do que ocorre com todos, que acabam se envolvendo tanto com trabalho, negócios, sociedade consumista e tentando dar aos seus cada vez mais, acabam perdendo o mais importante, a convivência nas diferentes fases da vida dos seus.
Nosso desperdício de tempo com bobagens, coisas insignificantes, observações sem nenhuma importância real, discussões tolas e brigas desnecessárias, é imensurável. Mais maduros, podemos perceber, cada vez mais claramente, como perdemos tempo com algo que nada nos acrescentou e pior, muito nos diminuiu.

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