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segunda-feira, 9 de abril de 2012

Admirável Brasil novo


...o principal andaime que dará sustentação à indústria é a concentração de investimentos em infraestrutura, especialmente de transportes, onde a carência é maior. Assim, estaremos pavimentando de forma mais sólida o caminho para o novo mundo que se ergue. 
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Raul Velloso, do Estadão

O alarde sobre a perda de espaço da indústria de transformação no PIB brasileiro existe exatamente porque ninguém gosta de incorrer em perdas.
A indústria de transformação está perdendo participação, mas não tanto quanto a estatística sugere. Sabe-se que os preços da indústria têm caído em relação aos demais, especialmente ao setor de serviços - onde a escassez de oferta produz forte subida de preços. Assim, se deflacionássemos os valores originais pelos índices setoriais de preço, a queda de participação física seria menor.
Não se trata, pois, de dizer que a indústria acabou, mas que o Brasil, a exemplo de outros países, está passando por uma transformação estrutural em favor dos demais setores. Esse é o ponto. O paradigma em vigor no passado já mudou ou está em processo de mudança. É de esperar que, diante da perda, os representantes da indústria tendam a mostrar indignação, especialmente contra o tsunami cambial - um inimigo externo recente -, e que o governo se sinta premido a implementar medidas de alívio.
A indústria made in Brazil perde espaço basicamente por quatro motivos:
Primeiro, porque poupamos pouco (especialmente no setor público), ou seja, mesmo arrecadando muito, adotamos um modelo de forte expansão dos gastos correntes. Por isso o setor público investe pouco, criando gargalos e altos custos na infraestrutura de transportes. Há o fato de que o governo desaprendeu a planejar e a gerir inversões, e também um viés ideológico anti-investimento privado de qualidade na infraestrutura. O custo Brasil é gigantesco, tanto por isso como porque há burocracia excessiva, corrupção e outras mazelas. Com margens apertadas, a indústria sofre mais.
Segundo, porque os preços das nossas commodities de exportação dispararam, beneficiando diretamente um setor que não é a indústria. Em breve, com o pré-sal, seremos campeões também em petróleo de alta profundidade e exportadores dessa commodity tecnologicamente sofisticada.
Terceiro, porque a China, esbanjando poupança, vem implementando há 30 anos - ou mais - um modelo econômico baseado na inundação de produtos industrializados baratos no mundo ocidental.
E, quarto, porque o Brasil se tornou mais atrativo aos capitais externos por seus méritos (controle da dívida pública e estabilidade política), por seus deméritos (uma das maiores taxas de juros reais do mundo) e pelo demérito dos outros (crise mundial).
Vê-se que, enquanto a indústria perde, outros setores ganham. Basta lembrar o sucesso do pré-sal. Agora, não se trata mais do petróleo de águas rasas, mas do óleo extraído de águas profundas com sofisticada tecnologia made in Brazil.
Além do mais, a indústria brasileira sofre do pecado de ter sido montada especialmente para atender ao mercado interno, na ideia de que o sistema original de proteção duraria para sempre. Só que o mundo resolveu reduzir as barreiras, e o Brasil não teve escolha: integrou-se mais aos mercados mundiais, desvendando uma pletora de "carroças".
Tudo isso empurra o Brasil para a apreciação real da taxa de câmbio, o que vem ocorrendo há muito e só não se dá em maior intensidade porque o Banco Central compra todos os dólares que consegue, ainda que essa compra seja financiada internamente a juros estratosféricos.
Sem preparo para enfrentar essa avalanche de mudanças, a indústria trava uma guerra inglória contra as forças naturais dos mercados e o modelo de crescimento dos gastos correntes. Nesse sentido, o governo vive uma difícil contradição. Quer ajudar a indústria, para o que lança medidas pontuais, mas gostaria de poder viabilizar maior crescimento global do PIB, o que exige maior volume de poupança de fora, a fim de complementar a reduzida geração de poupança interna que o seu modelo ocasiona. O conflito está em que não há como trazer essa poupança sem ter um déficit de igual valor na conta corrente do balanço de pagamentos, o que requer maior apreciação cambial, maiores importações e, no fim, maiores déficits externos.
Não é por outro motivo que, nos governos Lula (até 2008), a taxa de investimento aumentou cerca de cinco pontos de porcentagem do PIB, enquanto o déficit externo (poupança externa) aumentava na mesma magnitude. Com o País impedido de importar serviços, e sendo campeão de competitividade em commodities, a indústria acaba sendo o primo pobre que precisa não crescer para tudo o mais funcionar. Estamos - ou não - num admirável mundo novo?
Com tantos desafios, é fundamental criar condições para a indústria se tornar mais competitiva de forma sustentável. Sem uma estratégia semelhante à que colocou a Embraer no brilhante patamar em que está, e dada a oferta mundial excedente de produtos industrializados do momento, há que se tentar outros caminhos. 
Nesse contexto, o principal andaime que dará sustentação à indústria é a concentração de investimentos em infraestrutura, especialmente de transportes, onde a carência é maior. Assim, estaremos pavimentando de forma mais sólida o caminho para o novo mundo que se ergue.

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