Por Klauber Cristofen Pires
Publicado no site do Instituto Liberdade, em 24/02/2006
Publicado no site DIEGOCASAGRANDE.COM.BR, em 02/03/2006.
Publicado no site Parlata, em 04/03/2006.
Em dois artigos já publicados, "13º: Presente de Grego para os Trabalhadores" e "Natal Rico, Ano Pobre", discorri sobre os efeitos danosos que a instituição do 13º salário acarreta sobre, respectivamente, a renda dos trabalhadores assalariados e sobre os resultados das empresas. Nesta última análise sobre o tema, deitaremos os olhos sobre os consumidores.
Vejamos preliminarmente que antes, criticamos as consequências sobre duas classes diferentes de cidadãos - trabalhadores e empresários - , mas desta vez, a condição de consumidor recai sobre ambos. A divisão trabalhador-empresário-consumidor não deve ser vista como uma classificação estanque, visto que todos os fenômenos acontecem simultaneamente e são uns a causa imediata dos outros. A visão em separado serve apenas como auxílio para o estudo até aqui esboçado.
Todos os argumentos que foram apresentados em relação aos assalariados e aos empresários geram como consequência a diminuição do consumo. Em síntese:
a) O trabalhador chega em dezembro, ou menos rico, ou mais endividado;
b) O empresário adia vendas desnecessariamente;
c) Há um aumento dos custos relativo à necessidade de manter reservas para o pagamento futuro do 13º;
d) As vendas, artificialmente concentradas em dezembro, geram aumento de custos com armazenagem, contratações de temporários, e erros de previsão dos estoques;
Resta-nos, saber, se, todavia, cabe alguma inspeção sobre fatos que, sem afetar de forma direta a estes primeiros, possam causar repercussão sobre o poder de compra.
Imaginemos que, analogamente ao fato de o empresário ter adiado parte de suas vendas para o Natal próximo, o consumidor também deixou de fazer, respectivamente, sua compra. A consequência direta para o primeiro já foi vista. Ao segundo, afora a frustração de não lhe ter sido possível ter uma necessidade mais urgente ser satisfeita, restará, adicionalmente, a inflação, a deteriorar seu dinheiro disponível. Quando, finalmente, possuir o numerário conseqüente do pagamento de seu 13º, perceberá o desgosto de verificar que aquilo que ele desejava comprar lá em fevereiro estará à venda, em dezembro, por preço superior.
Em um país como o Brasil, este é um dado que não pode ser desconsiderado, ainda mais quando os diversos governos se endividam para pagar o 13º de seus servidores. O endividamento estatal, ou a decisão temerária de expandir o papel-moeda em circulação, mediante a impressão de cédulas, geram a imediata reação por parte do mercado, pois aumenta-se a procura pela até então mesma quantidade de bens disponíveis, acarretando o indesejado aumento dos preços. A súbita elevação do nível dos preços em dezembro, que salta aos olhos dos compradores mais distraídos, abocanha considerável porção do poder de compra dos salários, não só do mês de dezembro, mas pelos meses seguintes, pois neste país, um produto baixar de preço após um aumento repentino, ainda é coisa muito rara.
Outro fator que pode advir como causa para a corrosão do salário é o imposto de renda. A concentração das parcelas mensais para pagamento em um só mês, na forma do 13º, pode resultar em uma mudança de alíquota. Conquanto o assalariado possa mais tarde reaver seu dinheiro, por ocasião da declaração de ajuste, na prática, a ação governamental serviu como uma forma de empréstimo compulsório.
Há também o risco de, devido a uma causa estranha, não ser mais possível ou desejável adquirir o bem até então desejado. A título de exemplo, houve uma vez em que fiquei planejando a aquisição de um carro importado, por longos meses, até que, justamente no dia em que tinha o dinheiro para adquiri-lo, o governo acabava de decretar um aumento no imposto de importação de 70%! Obviamente, a partir da frustrante notícia, adquirir um carro novo foi um dos itens relegados ao fim da minha lista de prioridades...
Da mesma forma, poderia também ter havido alguma inovação tecnológica que acarretasse um aumento no preço final do bem, afastando a atração do consumidor que o esperava dentro dentro de um orçamento "contado". Lembro-me aqui de uma ocasião em que os fabricantes de máquinas de lavar haviam trocado a tecnologia de acionamento dos aparelhos, de mecânica para eletrônica. Na verdade, fizeram isto para se furtar às determinações de um decreto de congelamento de preços. De qualquer forma, para os consumidores para as quais as máquinas com acionamento mecânico pareciam ser suficientes, a mudança acarretou um prejuízo, senão em até mesmo uma impossibilidade - pelo menos temporária - de adquiri-las.
Há também a visão em sentido contrário: sabendo que o boom das vendas foi artificialmente concentrado em dezembro, a maior parte das inovações tecnológicas poderão ser adiadas para aquele mês. Isto pode fazer com que o consumidor decida por adiar a aquisição de um bem, ou que decida comprá-lo, a contragosto, mas porque precisa dele, mesmo sabendo que seu equipamento em breve será substituído por outro mais moderno. De qualquer forma, aqui também observa-se um diminuição do grau de satisfação do consumidor, muito embora dificilmente quantificável em termos de dinheiro.
Outra consequência possível do adiamento de uma compra é o risco da relação de oferta e procura. Imagine que uma pessoa tenha se deparado, na loja, com o CD de um cantor que ela conheça e admire, embora ele ainda não goze de um prestígio junto ao público. Ela pensa, vê que anda com seu orçamento apertado, e decide aguardar até receber seu 13º. No entanto, durante este interstício, o querido cantor se tornou famoso, e seu CD dobrou de preço!
Como se vê, o tempo é um fator fundamental para influenciar a decisão de uma compra. As condições pelas quais a escolha de um determinado bem de consumo poderia se realizar praticamente nunca se repetem. Sempre o momento seguinte traz inovações que precisam ser levadas em conta, reclamando novas avaliações.
Quando o governo congela parte dos salários dos trabalhadores, para que sejam pagos somente em determinada época, o efeito se verifica na proporcional derrogação do importantíssimo duplo poder - de decisão e de informação - que os consumidores exercem na sociedade. No primeiro caso, observa-se um proporcional impedimento de o indivíduo mitigar o seu desconforto, o que, de certo modo, pode ser corretamente irterpretado como seu empobrecimento. No segundo, opera-se uma distorção da compreensão que o empresário deve ter - por falta ou incompletude de informações - com relação à colocação de bens futuros no mercado, com prejuízo para toda a sociedade.
Como um apêndice, podemos transplantar praticamente todos os fenômenos observados quanto ao 13º para o caso do pagamento do 1/3 constitucional das férias. A única diferença reside em que o 13º concentra o seu pagamento, pelo menos em parte, no mês de dezembro. Em ambos os casos, a interferência estatal, a não ser no justo ano em que foi implementada, jamais significou um aumento da renda, mas apenas uma ingerência indevida em processo que, tanto melhor funcionaria, quanto mais naturalmente ocorresse.
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