segunda-feira, 18 de agosto de 2008

Propaganda Negativa não é Agressão à Propriedade!


Por Klauber Cristofen Pires

Chamou-me a atenção uma propaganda que vem sendo veiculada na tv, na qual a operadora de telefonia móvel Oi, pretendendo informar sobre o direito do consumidor de adquirir aparelhos desbloqueados, é censurada por meio de uma liminar por iniciativa de outra concorrente. Dado que esta não é uma análise jurídica, mas antes, econômico-filosófica, percebe-se objetivamente que visa, pelo seu resultado, a proteger a operadora impetrante de eventuais prejuízos resultantes da potencial perda de clientela.

Ultimamente, têm ocorrido casos semelhantes de censura por via judicial a cidadãos, intelectuais, jornais, empresas e políticos, a impedir-lhes de transmitirem informações ou expressarem as suas opiniões, e em especial, de veicularem a propaganda que aqui denomino de “negativa”, isto é, aquela que procura denunciar defeitos no produto do concorrente.

A progressividade com que isto se repete somente traduz a falência da concepção confusa que hoje vige sobre a liberdade de expressão, fruto da superposição histórica de várias correntes ideológicas que, malgrado mal-fundamentadas sob o ponto de vista filosófico, acabaram por prevalecer em diferentes épocas no nosso cenário político nacional, a pretexto de protegerem a idoneidade moral de um indivíduo ou de uma organização, ou os potenciais lucros cessantes advindos da exposição das idéias de um rival. Em todo caso, como se percebe, trata-se de um patrimônio, do qual quer se proteger o valor.

Neste cenário, inovam os liberais austríacos, segundo os quais, a teoria natural da propriedade, i.e., a aquisição da propriedade realizada de forma não agressiva, realizada por meio da apropriação original e do contrato, representa a coluna mestra de todo um edifício de relações sociais baseado em respeito às escolhas individuais e aos ajustes livremente acordados pelas partes. Com o que lhes pertence, portanto, os seus donos podem legitimamente realizar quaisquer atos, tais como acumular, doar, trocar, emprestar, alugar, ceder o uso, vender ou o que mais seja, desde que não incorram em agressão à propriedade alheia e ao usufruto destes mesmos direitos decorrentes por seus concidadãos.

Entretanto, a defesa da integridade da propriedade não inclui a defesa do seu valor. Quando, por exemplo, surgiram as tvs de lcd e de plasma, a procura por televisores de tubos de reios catódicos diminuiu drasticamente, e conseqüentemente, o preço dos aparelhos teve de ser reduzido, independentemente de quantas horas de trabalho tenham sido gastas na produção ou do custo que as empresas tiveram ao produzi-los, distribuí-los e colocá-los à venda no varejo.

Nesta linha, segundo o filósofo Hans-Hermann Hoppe, a defesa ideológica de uma propriedade, i.e., contra a propaganda negativa por parte de um consumidor ou de outro concorrente, constitui-se em proteção não a ela propriamente, mas ao seu valor atual, o que implica, em via reversa, a aceitação da intervenção direta e injustificada à propriedade destes últimos, vez que os impede de concretizarem atos lícitos, segundo a teoria natural da propriedade. No caso, a intervenção estatal, de ofício ou provocada pela via judicial, significa uma agressão direta ao direito de contrato firmado entre uma empresa e um determinado veículo de comunicação, e também entre este e o cliente final. No último caso, representa uma dupla intervenção, vez que também pretende se substituir ao juízo de um indivíduo no papel de consumidor.

Hoppe denomina de “conservadorismo” à doutrina que, tendo obtido grande influência na Europa continental e na América Latina e que, configurando-se como uma variante de socialismo, defende a manutenção do valor atual da propriedade de uma dada casta de proprietários contra a inovação trazida pelos produtores novatos, por meio da intervenção sobre a propriedade destes últimos. De acordo com o filósofo alemão, “...o conservadorismo considera apropriado e legítimo para uma classe de proprietários já estabelecidos o direito de barrar qualquer mudança social que estes venham a considerar como uma ameaça à posição relativa que ocupam na hierarquia social de renda e riqueza, mesmo que os vários donos-usuários individuais dos vários fatores de produção não tenham contratado isto sob nenhum acordo de tal natureza”. (HOPPE, Hans-Hermann - Uma Teoria sobre o Socialismo e o Capitalismo, capítulo 5, pág. 46, versão em português autorizada pelo autor em arquivo de extensão “pdf”, baixável em http://libertatum.blogspot.com).

Certo dia, percebi que minha filha passava mal e supus que fora devido à ingestão de um alimento fornecido por uma certa rede de fast-food. Curioso foi que a médica havia nos informado ter sido aquele o quinto caso do seu dia, e devido à ingestão do mesmo produto, no mesmo estabelecimento! Provido apenas com uma presunção, embora provável, decidi abster-me de freqüentar aquele estabelecimento. Isto certamente reduzirá em alguma medida, ainda que ínfima, o valor da sua propriedade. Todavia, ainda que meu julgamento se mostre errôneo, defender a proteção do valor atual daquela propriedade significa sobrepujar o meu direito de escolha; neste caso, eu deveria ser obrigado a submeter minha vontade previamente ao crivo do dono daquele negócio, o que seria um notório absurdo! (até porque, dentro dos meus pensamentos, jamais ela poderia adivinhar que algum dia eu ponderasse sobre isto).

Agora, tanto mais o valor daquela propriedade será reduzido, quanto mais quanto eu disser aos meus amigos o que nos ocorreu, na medida em que eles também decidam abster-se de lá gastar o seu dinheiro. Evitar que tenham conhecimento da informação que pode ser relevante para um julgamento, pois, ainda que no fim das contas inverídica, conduz a uma invasão direta de invasão sobre suas consciências; afinal, eu não os terei impedido à força de irem até lá e consumirem o que quisessem.
Além do empobrecimento relativo da população, dado que a limitação à informação levará ao desperdício de recursos materiais, a censura à propaganda negativa remete à tutela da consciência dos cidadãos pelo estado, diminuindo neles paulatinamente a capacidade de formarem opinião e agirem segundo as suas convicções.

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