domingo, 14 de agosto de 2016

Espaço Cultural Libertatum




JORGE LUIS BORGES
JORGE LUIS BORGES (1899-1986) - Argentino, um dos mais prestigiosos escritores da América hispânica. Antes conhecido por suas ficções do que pela poesia, embora se incluam neste gênero seus primeiros livros: Fervor de Buenos Aires, Luna de Enfrente, Cuaderno San Martín.

A chuva.

A tarde bruscamente se aclarou,
Porque já caí a chuva minuciosa.
Caí e caiu. A chuva é só uma coisa
Que o passado por certo freqüentou.

Quem a escuta cair já recobrou
O tempo em que a fortuna venturosa
Uma flor lhe mostrou chamada rosa
E a cor bizarra do que cor tomou.

Esta chuva que treme sobre os vidros
Alegrará nuns arrabaldes idos
As negras uvas de uma parra em horto

Que não existe mais. A umedecida
Tarde me traz a voz, a voz querida
De meu pai que retorna e não é morto.




São os rios.

Somos o tempo. Somos a famosa
parábola de Heráclito o Obscuro.
Somos a água, não o diamante duro,
a que se perde, não a que repousa.
Somos o rio e somos aquele grego
que se olha no rio. Seu semblante
muda na água do espelho mutante,
no cristal que muda como o fogo.
Somos o vão rio prefixado,
rumo a seu mar. Pela sombra cercado.
Tudo nos disse adeus, tudo nos deixa.
A memória não cunha sua moeda.
E no entanto há algo que se queda
e no entanto há algo que se queixa.






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