sexta-feira, 19 de fevereiro de 2016

Belém sem perspectiva


Por Armando Soares



                Belém encolheu e parou no tempo com a falência do setor econômico da borracha e nada foi feito e programado para soerguer o município. Todas as tentativas da iniciativa privada para desenvolver a cidade foram sabotadas pelo setor público, o que nos leva a afirmar que políticos e administradores públicos são as maiores travas para o seu desenvolvimento. A degradação da João Alfredo, antes uma passarela comercial dinâmica está reduzida a um amontoado disforme de vendedores ambulantes retrata fielmente a decomposição social e econômica de Belém. Belém é hoje uma cidade limitada economicamente e sem cérebros que se apresentem para tirá-la desse estágio. As doenças econômicas da cidade continuam vivas e são encobertas por propagandas políticas enganosas. O que foi no passado uma metrópole vigorosa e rica elogiada dentro e fora do país, hoje é uma célula doente onde cresce a pobreza, a mediocridade e a criminalidade.


                 Durante o ciclo da borracha, Belém foi considerada uma das cidades brasileiras mais desenvolvidas, não só por sua posição estratégica - próximo ao litoral - mas também porque sediava um maior número de residências de seringalistas, casas bancárias e importantes instituições. O apogeu da cidade foi entre 1890 e 1920, quando contava com tecnologias que as cidades do sul e sudeste brasileiros ainda não possuíam, como, por exemplo: o Cinema Olympia, o mais antigo do Brasil em funcionamento e considerado um dos mais luxuosos e modernos da época (inaugurado em 21 de abril de 1912 auge do cinema mudo); Teatro da Paz, considerado um dos mais belos do Brasil, inspirado no Teatro Scala de Milão; Mercado Ver-o-Peso, a maior feira livre da América Latina; Palácio Antônio Lemos, Praça Batista Campos e várias outras obras realizadas por políticos e administradores, que só puderam realizar, a bem da verdade, um bom governo porque e exploração da borracha, uma célula de desenvolvimento poderosa, disponibilizava recursos para os investimentos públicos. Belém nessa época não precisa de recursos federais para sustentá-la, pelo contrário, o Pará com as exportações da borracha enchia os cofres do tesouro nacional, e muitas obras públicas no Rio e São Paulo foram construídas com recursos gerados pela borracha.


                A degradação política, econômica e social de Belém tem origem na decadência da atividade econômica da borracha. A força econômica da borracha aconteceu em razão da Hevea brasilienses (seringueira) ter seu habitat na Amazônia e ser o único fornecedor de borracha para o mundo até a década de 1880, o que foi determinante para o desenvolvimento da cidade. Assim, por mais de sessenta anos, a indústria de produtos de borracha – setor chave do crescimento econômico das nações industrializadas – recebia toda a sua matéria-prima da região amazônica. Mesmo nos períodos em que o comércio de produtos florestais estava no auge de seu vigor, como durante a expansão do cacau em fins do século XVII, a Amazônia se colocava, como centro econômico, bem abaixo das áreas de agricultura e de mineração das regiões nordeste e central do Brasil, o que comprova a importância da borracha como fator de desenvolvimento econômico. Na verdade, apesar de suas muitas especiarias, castanhas, óleos e madeiras, a Amazônia continuou a ser, comercialmente, um lugar atrasado até o momento em que a inaudita demanda do mundo industrializado pela borracha tornou lucrativa a produção extrativa em larga escala. O negócio da borracha amazônica suplantou a pratica desenvolvidas pelos portugueses na era colonial, consolidando modos tradicionais da extração e troca.



                No auge da expansão, Belém era uma das mais notáveis cidades da América Latina. Depois do Rio de Janeiro e de Santos, era o porto mais movimentado do Brasil, com uma população que se aproximava rapidamente do quarto de milhão, em 1910. Possuía um sistema de bondes elétricos, amplo serviço telefônico, água encanada e iluminação pública elétrica. As principais vias públicas eram bulevares, uniformemente pavimentados, margeados de mangueiras, cujas frondes dessas graciosas árvores protegiam os transeuntes do tórrido sol tropical. Diversas praças públicas, grandes e vistosamente ajardinadas, exibiam fontes, coretos e estátuas imponentes, e a Praça da República, localizada no centro da cidade, apresentava pomposos edifícios, tais como o Palácio do Governo e o Teatro da Paz. Por toda a cidade espalhavam-se monumentos e palacetes de tamanho e decoração variados. O resultado da ação conjunta de uma expansão no negócio da borracha e de uma máquina estadual desejosa de criar um espaço urbano que impressionasse representou um acréscimo à longa lista das cidades brasileiras que foram fruto da expansão econômica.


                Qual o projeto atual criado para desenvolver e tirar Belém do buraco, do subdesenvolvimento? Turismo? Indústria? Serviços? Até o momento tudo não passou de um oba-oba, de discurso político e eleitoreiro? Como enfrentar no momento a oferta de mão-de-obra e a que ingressará nos próximos anos na cidade? Como o município pode se beneficiar do IPTU em uma cidade onde prevalece à pobreza morando em palafitas e em invasões com renda abaixo do salário mínimo? Com que recursos o governo da cidade pode garantir segurança digna para uma população ameaçada por criminosos filhos da pobreza que crescem assustadoramente? Qual o projeto para sustentar e desenvolver as ilhas agregadas a Belém que acomodam a pobreza? Questões que o povo gostaria de saber.



                Belém tem a quinta maior favela do país na Estrada Nova e Jurunas, na zona sul de Belém, que avança pelas margens e cursos de igarapés e rios que desembocam na Baía de Guajará. Num dos braços da favela, um paredão de barracos margeia um canal de esgoto e entra quase um quilômetro Rio Guamá adentro. Os casebres são erguidos em forma de palafita, sobre troncos de madeira a três metros do espelho de água escura. As paredes costumam ser de tábua, lona ou mesmo tijolo. Uma tubulação clandestina de água tratada passa por baixo das moradias, com aberturas controladas. Da bica, a água é puxada por baldes amarrados em cordas. Dados do último Censo mostram que 66% da população da região metropolitana de Belém vivem em favelas. O termo mais difundido em outras regiões do País para definir moradias em situação precária é menos conhecido no Pará. São nas “invasões” e “baixadas”, termos mais populares, que mora a maior parte dos habitantes da capital paraense. Esse cenário vem sendo construído desde a falência da atividade econômica da borracha e nada foi feito por políticos, prefeitos e governadores para reverter o processo de empobrecimento e favelização, local preferido para o tráfico de drogas e vícios de toda a natureza.



                A iniciativa privada bem que tentou mudar esse cenário, principalmente a partir do governo do presidente Castelo Branco que disponibilizou um programa extraordinário de incentivos fiscais. Lamentavelmente a burocracia estatal, políticos e governantes contaminados com o ranço estatizante e desprovidos de conhecimentos detonaram todos os investimentos industriais montados em Belém impossibilitando que a cidade acomodasse uma célula que garantiria o seu desenvolvimento, emprego abundante, renda e qualidade de vida, suprindo a ausência da atividade econômica da borracha, a única célula de desenvolvimento concreto que fez a história do Pará e consequentemente construiu a saudosa e rica Belém.


                Belém, sem esgoto, com trânsito caótico mantido em crescimento geométrico para sustentar um comércio de multas criminosas, cidade das palafitas e da pobreza, subdesenvolvida, paraíso da bandidagem é a prova maior da incompetência e da ação maléfica de políticos e administradores públicos. Belém pelo perfil econômico e social que apresenta é uma cidade sem perspectiva de crescimento, vive apenas do seu passado.

Armando Soares – economista




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