quinta-feira, 11 de junho de 2015

Pau que nasce torto...

Por Armando Soares



                Diz o ditado que “pau que nasce torto não tem jeito, morre torto”. O Brasil nasceu torto e se torna necessário um renascer para extirpar o aleijão. Desde o descobrimento os brasileiros foram educados a considerar o Estado como coisa boa, uma “mãe” para resolver os problemas de todos os brasileiros. Estado e intervencionismo são irmãos inseparáveis e fazem parte da nossa história desde os tempos coloniais. Os brasileiros desprezam os políticos por terem realizados tanta imundície política e, paradoxal e inexplicavelmente amam o Estado. Será que é amor sádico, de quem gosta de apanhar e sofrer, ou porque imaginam que criaturas perfeitas governam o Estado brasileiro, ou é pura idiotice?  Por qual razão os brasileiros que tem uma imagem tão negativa sobre políticos, acham que o governo pode resolver os problemas do país, sendo o país governado por políticos desqualificados? Ao que parece o brasileiro sofre de um problema de doutrinação e de comportamento; assistiram comportamentos inadequados de governantes e burocratas e foram doutrinados de geração pós-geração a depositar confiança no Estado “mãe” como forma de resolver todos os seus problemas. Mas de onde vem essa mentalidade retrógrada que é a responsável pelo atraso do desenvolvimento e do progresso brasileiro? Nossa trajetória política ajuda a entender a ideia de que cabe ao governo resolver os problemas sociais, políticos e econômicos. Conhecer a história política do Brasil — assim como as ideias, ideologias e os personagens centrais da cadeia de comando — é a maneira mais adequada de descobrir e reconhecer os erros para podermos reformar o que precisa ser reformado e eliminar o que deve ser eliminado. Odiar políticos e amar o Estado é coisa de débil mental. Substituir o indivíduo, o livre arbítrio, a família pelo Estado é demência e a causa de todo os desastres administrativos que tem levado permanentemente os brasileiros a pagarem a conta desses desastres, como está acontecendo agora na administração da Dilma e do PT.


Sem dúvida a responsabilidade maior pela atual crise brasileira atual, como de outras crises anteriores cabe aos brasileiros que não conseguem se livrar da canga estatizante colocada no pescoço de cada brasileiro. Desenvolvimento, progresso, qualidade de vida, renda per capita vigorosa não acontece pelas mãos do Estado, do intervencionismo estatal, como prova a nossa história. Segundo Garschagen, dois fatos sintomáticos da fundação do país contribuíram para que o brasileiro amasse o Estado até os nossos: 1) a primeira representação oficial do governo português a fincar pés em solo brasileiro era formada por criminosos degredados, que, obviamente, suplicaram para não ficar; 2) o escrivão responsável por descrever a nova terra no documento que se transformaria na carta fundadora do país, exercendo ele, portanto, uma função oficial do governo, solicitou ao rei uma futura sinecura e a extinção da pena de seu genro igualmente condenado e degredado na ilha de São Tomé. Não é com maledicência que ambos os eventos históricos podem ser considerados fundadores de certa prática social e política que se desenvolveu ao longo de nossa história. E que, lapidada durante os séculos vindouros, às vezes é exposta publicamente como no julgamento do mensalão, realizado no Supremo Tribunal Federal (STF) em 2014, que condenou 25 dos 37 réus, todos ligados direta ou indiretamente ao Partido dos Trabalhadores (PT) ou ao seu governo. Os nossos males, antes de serem de origem, são a realização de ideologias tortas por governos oblíquos. A política intervencionista do governo português não só interrompeu o desenvolvimento da colônia, mas prejudicou a economia após a independência e foi um importante entrave à chegada e ao desenvolvimento do capitalismo no país (considerando que o capitalismo aqui chegou). Esse atraso impediu o Brasil de prosperar e manteve a dependência em relação à metrópole, além de reforçar a mentalidade estatista. Quando um processo intervencionista se desenvolve num ambiente de ideologia estatista, “cada fracasso de uma intervenção gera demandas por novas intervenções: a culpa dos problemas nunca é a intervenção em si, mas a falha em aplicar a lei e o egoísmo dos agentes econômicos”. O resultado é a exigência de leis novas e mais rigorosas. As interferências econômicas, no passado e no presente, são parte de um processo de ampliação gradual do Estado. As intervenções na economia não se restringem e não se limitam, desgraçadamente, à esfera econômica. Pelo contrário. Abrem uma vereda para avançar em outros campos da vida social com a pretensão de moldar nossas ações e decisões, e de influenciar nossos comportamentos e hábitos. O governo, de interventor sistemático da vida econômica, passa a interferir e a regular os diferentes modos de vida com a finalidade de enquadrá-los à agenda política ou à ideologia no poder ou aos projetos dos grupos de interesses e dos grupos de pressão, que, de minoritários articulados, passam a ditar os rumos da sociedade. Quando nos damos conta, há toda uma mentalidade, uma cultura e um ambiente construídos para deteriorar os valores, princípios e normas — e servir quem está no poder.


                Não devemos esquecer da condenação da usura criada no passado pelo Tribunal do Santo Ofício e pela sua militância intelectual que deixaram marcas profundas na cultura brasileira, como a visão um tanto negativa do empreendedor e da empresa privada, a condenação do trabalho como uma adversidade, e não como uma realização pessoal, e um afeto pela pobreza, que migrou da esfera da caridade para a do paternalismo estatal. Em síntese, na esfera cultural, desconfiança da iniciativa privada; no âmbito da política, controle e orientação estatal da atividade empresarial. A simpatia pela pobreza presente em nossa tradição cultural até hoje “fomenta a crença da responsabilidade do Estado por tal fenômeno, quando os países que a eliminaram não o fizeram graças à intervenção estatal, mas pela prática de uma economia livre, baseada na valorização do trabalho, no apreço aos bem-sucedidos, no reconhecimento da legitimidade do lucro, enfim, valores todos contrários ao que nos foi legado pela Contrarreforma e inculcado à força pela Inquisição”.

                A burocracia teve importante participação no processo histórico brasileiro, ou seja, colocar a sociedade brasileira numa posição inferior à do Estado. Essa condição hierárquica subalterna foi mais um dos elementos decisivos para a formação da mentalidade de que cabe ao poder político ser o principal eixo social, político e econômico. Segundo Garschagen, há uma explicação plausível para esse arranjo posicional entre governo e sociedade. Na ordem burocrática de um sistema patrimonial, o súdito estava numa posição de inferioridade em relação ao soberano. Nem um nem outro se sentiam “vinculados à noção de relações contratuais, que ditam limites ao príncipe e, no outro lado, asseguram o direito de resistência, se ultrapassadas as fronteiras de comando”.  O resultado era claro: “o capitalismo, dirigido pelo Estado”, impedia a autonomia da iniciativa privada e ganhava “substância, anulando a esfera das liberdades públicas, fundadas sobre as liberdades econômicas, de livre contrato, livre concorrência, livre profissão, opostas, todas, aos monopólios e concessões reais”.

                Não esquecer nesse cenário estatizante os tributos, fator de dependência e de servidão, por expropriação e favorecimento e instrumento econômico para benefício próprio e escravizante.
                Voltaremos a esse tema estatismo e da servidão brasileira novamente em razão de sua importância para explicar as verdadeiras causas do atraso econômico brasileiro.

Armando Soares – economista


Soares é articulista de LIBERTATUM

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