Pau que
nasce torto...
Por Armando Soares
Diz o
ditado que “pau que nasce torto não tem jeito, morre torto”. O Brasil nasceu
torto e se torna necessário um renascer para extirpar o aleijão. Desde o
descobrimento os brasileiros foram educados a considerar o Estado como coisa
boa, uma “mãe” para resolver os problemas de todos os brasileiros. Estado e
intervencionismo são irmãos inseparáveis e fazem parte da nossa história desde
os tempos coloniais. Os brasileiros desprezam os políticos por terem realizados
tanta imundície política e, paradoxal e inexplicavelmente amam o Estado. Será que
é amor sádico, de quem gosta de apanhar e sofrer, ou porque imaginam que
criaturas perfeitas governam o Estado brasileiro, ou é pura idiotice? Por qual razão os brasileiros que tem uma
imagem tão negativa sobre políticos, acham que o governo pode resolver os
problemas do país, sendo o país governado por políticos desqualificados? Ao que
parece o brasileiro sofre de um problema de doutrinação e de comportamento; assistiram
comportamentos inadequados de governantes e burocratas e foram doutrinados de
geração pós-geração a depositar confiança no Estado “mãe” como forma de resolver
todos os seus problemas. Mas de onde vem essa mentalidade retrógrada que é a
responsável pelo atraso do desenvolvimento e do progresso brasileiro? Nossa
trajetória política ajuda a entender a ideia de que cabe ao governo resolver os
problemas sociais, políticos e econômicos. Conhecer a história política do
Brasil — assim como as ideias, ideologias e os personagens centrais da cadeia
de comando — é a maneira mais adequada de descobrir e reconhecer os erros para
podermos reformar o que precisa ser reformado e eliminar o que deve ser
eliminado. Odiar políticos e amar o Estado é coisa de débil mental. Substituir
o indivíduo, o livre arbítrio, a família pelo Estado é demência e a causa de
todo os desastres administrativos que tem levado permanentemente os brasileiros
a pagarem a conta desses desastres, como está acontecendo agora na
administração da Dilma e do PT.
Sem dúvida a responsabilidade maior
pela atual crise brasileira atual, como de outras crises anteriores cabe aos
brasileiros que não conseguem se livrar da canga estatizante colocada no
pescoço de cada brasileiro. Desenvolvimento, progresso, qualidade de vida,
renda per capita vigorosa não acontece pelas mãos do Estado, do
intervencionismo estatal, como prova a nossa história. Segundo Garschagen, dois
fatos sintomáticos da fundação do país contribuíram para que o brasileiro
amasse o Estado até os nossos: 1) a primeira representação oficial do governo
português a fincar pés em solo brasileiro era formada por criminosos
degredados, que, obviamente, suplicaram para não ficar; 2) o escrivão
responsável por descrever a nova terra no documento que se transformaria na
carta fundadora do país, exercendo ele, portanto, uma função oficial do
governo, solicitou ao rei uma futura sinecura e a extinção da pena de seu genro
igualmente condenado e degredado na ilha de São Tomé. Não é com maledicência
que ambos os eventos históricos podem ser considerados fundadores de certa
prática social e política que se desenvolveu ao longo de nossa história. E que,
lapidada durante os séculos vindouros, às vezes é exposta publicamente como no
julgamento do mensalão, realizado no Supremo Tribunal Federal (STF) em 2014,
que condenou 25 dos 37 réus, todos ligados direta ou indiretamente ao Partido
dos Trabalhadores (PT) ou ao seu governo. Os nossos males, antes de serem de
origem, são a realização de ideologias tortas por governos oblíquos. A política
intervencionista do governo português não só interrompeu o desenvolvimento da
colônia, mas prejudicou a economia após a independência e foi um importante
entrave à chegada e ao desenvolvimento do capitalismo no país (considerando que
o capitalismo aqui chegou). Esse atraso impediu o Brasil de prosperar e manteve
a dependência em relação à metrópole, além de reforçar a mentalidade estatista.
Quando um processo intervencionista se desenvolve num ambiente de ideologia
estatista, “cada fracasso de uma intervenção gera demandas por novas
intervenções: a culpa dos problemas nunca é a intervenção em si, mas a falha em
aplicar a lei e o egoísmo dos agentes econômicos”. O resultado é a exigência de
leis novas e mais rigorosas. As interferências econômicas, no passado e no
presente, são parte de um processo de ampliação gradual do Estado. As
intervenções na economia não se restringem e não se limitam, desgraçadamente, à
esfera econômica. Pelo contrário. Abrem uma vereda para avançar em outros
campos da vida social com a pretensão de moldar nossas ações e decisões, e de
influenciar nossos comportamentos e hábitos. O governo, de interventor
sistemático da vida econômica, passa a interferir e a regular os diferentes
modos de vida com a finalidade de enquadrá-los à agenda política ou à ideologia
no poder ou aos projetos dos grupos de interesses e dos grupos de pressão, que,
de minoritários articulados, passam a ditar os rumos da sociedade. Quando nos
damos conta, há toda uma mentalidade, uma cultura e um ambiente construídos para
deteriorar os valores, princípios e normas — e servir quem está no poder.
Não
devemos esquecer da condenação da usura criada no passado pelo Tribunal do
Santo Ofício e pela sua militância intelectual que deixaram marcas profundas na
cultura brasileira, como a visão um tanto negativa do empreendedor e da empresa
privada, a condenação do trabalho como uma adversidade, e não como uma
realização pessoal, e um afeto pela pobreza, que migrou da esfera da caridade
para a do paternalismo estatal. Em síntese, na esfera cultural, desconfiança da
iniciativa privada; no âmbito da política, controle e orientação estatal da
atividade empresarial. A simpatia pela pobreza presente em nossa tradição
cultural até hoje “fomenta a crença da responsabilidade do Estado por tal
fenômeno, quando os países que a eliminaram não o fizeram graças à intervenção
estatal, mas pela prática de uma economia livre, baseada na valorização do
trabalho, no apreço aos bem-sucedidos, no reconhecimento da legitimidade do
lucro, enfim, valores todos contrários ao que nos foi legado pela
Contrarreforma e inculcado à força pela Inquisição”.
A
burocracia teve importante participação no processo histórico brasileiro, ou
seja, colocar a sociedade brasileira numa posição inferior à do Estado. Essa
condição hierárquica subalterna foi mais um dos elementos decisivos para a
formação da mentalidade de que cabe ao poder político ser o principal eixo
social, político e econômico. Segundo Garschagen, há uma explicação plausível
para esse arranjo posicional entre governo e sociedade. Na ordem burocrática de
um sistema patrimonial, o súdito estava numa posição de inferioridade em
relação ao soberano. Nem um nem outro se sentiam “vinculados à noção de
relações contratuais, que ditam limites ao príncipe e, no outro lado, asseguram
o direito de resistência, se ultrapassadas as fronteiras de comando”. O resultado era claro: “o capitalismo,
dirigido pelo Estado”, impedia a autonomia da iniciativa privada e ganhava
“substância, anulando a esfera das liberdades públicas, fundadas sobre as
liberdades econômicas, de livre contrato, livre concorrência, livre profissão,
opostas, todas, aos monopólios e concessões reais”.
Não esquecer
nesse cenário estatizante os tributos, fator de dependência e de servidão, por
expropriação e favorecimento e instrumento econômico para benefício próprio e
escravizante.
Voltaremos
a esse tema estatismo e da servidão brasileira novamente em razão de sua
importância para explicar as verdadeiras causas do atraso econômico brasileiro.
Armando Soares – economista
e-mail: teixeira.soares@uol.com.br
Soares é articulista de LIBERTATUM
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