Durante um ano inteiro, morreram apenas 33 moradores de rua na Grande Goiânia. É muito pouco se comparado aos 914 homicídios que ocorreram só em Goiânia e Aparecida no mesmo período – uma média de 76 assassinatos a cada mês.
José Maria e Silva
Lembram-se de Heloísa Helena, a estrela que se desprendeu da constelação petista, brilhou como uma supernova nos céus do Brasil e se tornou um anã branca no buraco negro da política alagoana? Pois bem, Heloísa Helena é hoje vereadora eleita e reeleita pelo PSol na Câmara Municipal de Maceió, a mais votada em 2008 e 2012, mas já com um pé na Rede de Sustentabilidade, o novo partido a ser criado por Marina Silva. A ex-senadora, ex-musa do Fórum Social Mundial de Porto Alegre e ex-candidata a presidente da República em 2006, com 6,5 milhões de votos (a terceira colocada), dedica-se agora, entre outras bandeiras, a defender os moradores de rua da capital alagoana. Heloísa Helena faz na Câmara Municipal de Maceió o que o combativo deputado Mauro Rubem (PT) faz na Assembleia Legislativa de Goiás: investiga os assassinatos de moradores de rua por acreditar que eles fogem à normalidade e podem expressar uma política de extermínio da população de rua.
Se na Grande Goiânia, nos últimos 12 meses, morreram 33 moradores de rua, em Maceió, em dois anos, morreram 80. Os dados são de um levantamento realizado pelo Ministério Público de Alagoas em julho do ano passado. Já em 7 de novembro de 2010, o “Fantástico”, da Rede Globo, veiculara uma reportagem sensacionalista sobre assassinatos de moradores de rua de Maceió, praticamente incriminando a polícia pelas mortes. A se crer naquela reportagem, os moradores de rua da capital alagoana eram vítimas de uma inédita e macabra caçada humana, digna de figurar nos anais do genocídio mundial, ao lado dos fornos crematórios de Hitler e da fome planejada de Stalin. Todavia, aqueles assassinatos nada tinham de inéditos. Nas grandes e médias cidades do País, são frequentes as mortes de moradores de rua – o que desautoriza a afirmação taxativa, seja em Maceió ou Goiânia, de que se trata de extermínio premeditado.
Mas não tem jeito: a se crer no noticiário da imprensa, alimentado por ONGs de direitos humanos, cada cidade brasileira parece reivindicar para si o título de campeã do genocídio de moradores de rua. Além de Goiânia e Maceió, há denúncias de extermínio de moradores de rua em São Paulo, Belo Horizonte, Belém, Fortaleza, Salvador, Aracaju, Brasília, Curitiba e Vitória, sem contar outras cidades que não são capitais. As recorrentes denúncias de extermínio da população de rua só perdem para o tal “extermínio da juventude negra” – expressão fartamente repetida, como fato consumado, por pesquisadores de universidades, pastorais da Igreja Católica, ONGs de direitos humanos, promotores e defensores públicos, comissões da OAB e até pelo governo federal, cujos ministérios atuam como agências ideológicas do PT.
A ministra dos Direitos Humanos, Maria do Rosário, com um ativismo ideológico incompatível com o cargo, não hesita em atribuir às polícias militares o assassinato de qualquer um dos seus excluídos de estimação. Em 15 de abril último, numa entrevista à Agência Brasil, a ministra disse não ter “qualquer dúvida” de que os moradores de rua de Goiânia estão sendo mortos por grupos de extermínio com a participação de policiais: “Não se trata de a Polícia Federal entrar ali para dar apoio ao Estado. Trata-se de verificarmos se em Goiânia e em Goiás nós temos no tecido do Estado o envolvimento de pessoas com crime”. E quase acusou todas as instituições goianas de serem cúmplices dos criminosos: “Vamos pedir ao Ministério Público Federal a federalização desses crimes, uma vez que nem a polícia, nem o Ministério Público, nem o Judiciário do Estado de Goiás demonstram estar a altura da missão que têm, de manter a ordem e os direitos humanos da sua população”.
Homicídios descontextualizados
Analisadas fora do contexto, as 33 mortes de moradores de rua num período de um ano podem parecer uma tentativa de extermínio. Mas as estatísticas sobre a criminalidade em Goiás provam que esse raciocínio é completamente equivocado. Começando pelo fato de que muitos dos estimados 50 mil moradores de rua brasileiros vivem como zumbis consumidos pelo crack e estão sujeitos a toda sorte de violência, inclusive a violência selvagem praticada por eles próprios, além das execuções sumárias perpetradas pelos traficantes que lhes vendem drogas. Na referida reportagem do “Fantástico”, sem se importar com as câmeras da televisão e na presença das freiras que lhes dão comida, dois homens se engalfinharam aos chutes. Se a briga tivesse ocorrido longe dos olhos da civilização, provavelmente resultaria num cadáver estraçalhado a pauladas ou pedradas. Então, os defensores dos direitos humanos falariam em extermínio premeditado da população de rua praticado por esquadrões da morte formados por policiais higienistas.
É mais do que óbvio que qualquer pessoa que passe as madrugadas nas ruas corre mais risco de ser agredido ou morto do que uma outra que leva uma vida diurna e dorme em casa. Mesmo assim, a violência contra os moradores de rua está longe de ser ao menos igual, que dirá maior, do que a violência que se abate sobre o resto da população brasileira. Somente no último mês de julho, segundo dados da Secretaria de Segurança Pública de Goiás, ocorreram 58 homicídios dolosos e dois latrocínios em Goiânia, ou seja, 60 pessoas mortas em apenas um mês. Isso tudo, repita-se, só em Goiânia. Como, na falaciosa contabilidade dos moradores de rua mortos, os alarmistas somam com os dados da capital os dados das cidades do seu entorno, então também é preciso somar às mortes de Goiânia ao menos os 21 homicídios dolosos e o latrocínio que ocorreram em Aparecida de Goiânia em julho último. O que eleva a carnificina da população em geral, somente nesses dois municípios, para 82 assassinatos em apenas um mês – quase o triplo do número de moradores de rua mortos em um ano em toda a Grande Goiânia.
A desproporção entre o número estarrecedor de homicídios em geral e o pequeno número de moradores de rua mortos se estende a qualquer período de tempo em que se queira fazer essa comparação. Tomando por base os últimos 12 meses, de agosto de 2012 a julho deste ano, ocorreram 565 homicídios e 16 latrocínios em Goiânia e 322 homicídios e 11 latrocínios em Aparecida de Goiânia – uma carnificina de 914 pessoas sacrificadas em apenas um ano, o que dá uma média de 76 pessoas assassinadas a cada mês. Isso sem contabilizar os dados de Trindade e Senador Canedo, que (a exemplo das demais cidades da Grande Goiânia e ao contrário do que ocorre com as mortes de moradores de rua) entram nas estatísticas do interior do Estado. Todavia, em vez de se indignarem com esse verdadeiro genocídio da população em geral, a ministra Maria do Rosário, a Ordem dos Advogados do Brasil, o petista Mauro Rubem e o jornal “O Popular” só se preocupam com os moradores de rua.
E a criminalidade que se vê em Goiânia segue o padrão de todo o Estado. Só no Entorno de Brasília – uma das regiões mais violentas do mundo – ocorreram 761 homicídios dolosos e 45 latrocínios nos últimos 12 meses, totalizando 806 crimes com morte no período (67 por mês). Mas houve mês em que ocorreram 85 homicídios dolosos e 6 latrocínios. Em 2012, o Entorno de Brasília fechou o ano com 764 homicídios dolosos e 37 latrocínios. Já o Estado de Goiás apresentou 2.426 homicídios dolosos e 84 latrocínios, totalizando 2.510 mortos em 2012. E, nos últimos 12 meses, a tendência é de alta: foram 2.629 homicídios dolosos e 100 latrocínios em todo o Estado, totalizando 2.729 assassinatos. Isso mostra que a criminalidade vem aumentando de modo apavorante em Goiás, a exemplo do que ocorre em todo o País, sem exceção de qualquer Estado ou de qualquer cidade, por mais que as autoridades brasileiras, irresponsavelmente, insistam em fazer campeonato de segurança pública, dizendo que a criminalidade diminuiu aqui ou ali.
Epidemia de crimes no País
A situação é a mesma em todas as demais cidades brasileiras onde, a exemplo de Goiânia, também se fala, enjoativamente, em extermínio de moradores de rua. Os dados oficiais mostram que o verdadeiro extermínio se dá contra a população em geral, vítima de uma verdadeira guerra civil. Tomemos o exemplo de Maceió, que, ao lado de Goiânia, foi a mais acusada de exterminar seus moradores de rua. Quando o “Fantástico” fez sua reportagem sensacionalista, tinham morrido na cidade apenas – repito: apenas – 31 moradores de rua em 11 meses. Esse número é desprezível se comparado aos demais dados da criminalidade na capital alagoana. Segundo o Mapa da Violência 2013, coordenado por sociólogo Julio Jacobo Waiselfisz, o número de homicídios por arma de fogo em Maceió cresceu 249,6% em dez anos, passando de 252 assassinatos em 2000 para 881 em 2010. Somente sua taxa de mortes por armas de fogo chegou a 94,5 por 100 mil habitantes em 2010, a maior do País, muito à frente de João Pessoa, a segunda colocada, com taxa de 71,6.
O Mapa da Violência 2013 mostra, através de diversas tabelas, que várias capitais do País, como Belém, Fortaleza, Maceió e São Luís, praticamente triplicaram suas taxas de homicídio por armas de fogo entre 2000 e 2010, enquanto outras, como João Pessoa, Salvador, Curitiba e Florianópolis, mais que duplicaram esses índices no mesmo período. Ainda assim, a violência das capitais, por maior que seja, não expressa com rigor a monstruosa criminalidade brasileira. Nas duas últimas décadas, em todos os Estados, parte expressiva da criminalidade migrou das capitais para o seu entorno, como ocorreu em Goiânia, com Aparecida, e em Brasília, com Águas Lindas. O município em que mais se mata no Brasil em termos proporcionais é Simões Filho (118.047 habitantes), que apresenta uma taxa de 146 homicídios por 100 mil habitantes. Simões Filho é conurbada com Salvador e sua criminalidade (que repercute diretamente na capital baiana sem fazer parte de suas estatísticas) decorre dessa proximidade.
Em sua edição de 2012, o Mapa da Violência fez um comparativo entre a criminalidade brasileira e as guerras no mundo, tomando por base o “Relatório sobre o Peso Mundial da Violência Armada”, publicado em 2008 pela Declaração de Genebra, na Suíça, com os dados dos 62 conflitos armados ocorridos entre 2004 e 2007. Os 12 maiores conflitos armados, incluindo a Guerra do Iraque, deixaram um saldo de 169.574 mortos naquele período. Já a criminalidade no Brasil, apenas naquele mesmo período de quatro anos, matou 23.230 pessoas a mais do que as 12 maiores guerras, totalizando 192.804 homicídios. Em 30 anos, de 1980 a 2010, foram registrados 1.091.125 homicídios no Brasil – mais do que o dobro das 590 mil mortes que ocorreram nos 40 anos das duas sangrentas guerras em Angola. Os homicídios no País saltaram de 13.910, em 1980, para 49.932, em 2010, um aumento de 259% contra 60,3% de crescimento demográfico.
Mais isso não é tudo. A guerra civil brasileira representada pela criminalidade é ainda pior. Em 7 de junho de 2011, uma reportagem do jornal “O Estado de S. Paulo” mostrou que, no Rio de Janeiro, milhares de homicídios não constavam das estatísticas oficiais, pois apareciam como mortes sem causa conhecida. Em 2006 (último ano do governo de Rosinha Garotinho) foram 1.676 casos. Em 2007, no primeiro ano do governo de Sérgio Cabral, esse número já havia saltado para 3.191 mortes. E, em 2009, foram 5.647 mortes violentas sem causas especificadas, o que fez o número oficial de homicídios no Rio de Janeiro ficar em 4.198, quando poderia ter sido muito maior. Sem dúvida, a maioria das mais de 5,5 mil mortes violentas sem causas esclarecidas constituía-se de homicídios; se computados corretamente, elevariam as estatísticas da criminalidade fluminense a patamares estratosféricos. Mas a imprensa não cobrou do governador Sérgio Cabral (PMDB) nenhum esclarecimento sobre a provável maquiagem de dados, como faria se a falcatrua tivesse no ocorrido governo paulista.
Mapa dos homicídios ocultos
Quem descobriu essa lacuna nos dados oficiais da criminalidade no Rio de Janeiro foi o economista Daniel Cerqueira, diretor setorial do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) e doutor em Economia pela PUC do Rio. Cerqueira aprofundou esse levantamento e o ampliou para o âmbito nacional, o que resultou no estudo “Mapa dos Homicídios Ocultos no Brasil”, que acaba de ser publicado pelo Ipea. Segundo o estudo, entre 10 mil e 14 mil pessoas morrem de forma violenta a cada ano, sem que o Estado possa identificar a causa do óbito. De acordo com os cálculos de Cerqueira, “na média, 73,9% destas mortes decorreram de agressões, o que implica um contingente de 8.600 homicídios ocultos a cada ano, em média, no País, ou 129 mil nos 15 anos analisados”. O que leva o pesquisador a concluir que “a taxa de homicídios no país seria 18,3% acima do que apontam os números oficiais e assim já se teria atingido a marca de 62.375 homicídios, em 2009”. Ou seja, a criminalidade no Brasil não está mais na casa dos 50 mil homicídios anuais e, sim, na casa dos 60 mil.
De acordo com a 10ª revisão da Classificação Internacional de Doenças (CID-10), que o Brasil adota desde 1996, as mortes violentas podem ser classificadas como acidentes, suicídios ou homicídios. Mas se não foi possível identificar a causa primeira que levou a pessoa à morte, então o óbito entra nas estatísticas como tendo “causa indeterminada”. Segundo Daniel Cerqueira, nos países desenvolvidos, a morte violenta indeterminada é um fenômeno atípico. “No Brasil, contudo, em 2010, cerca de 10,3% do total destas mortes foram assim classificadas, revelando uma grave disfuncionalidade no sistema de produção de informações sobre os óbitos violentos. Será que se trata de um problema generalizado no país, ou é um fenômeno circunscrito a algumas localidades?”, indaga o pesquisador. E sua resposta a essa pergunta serve de defesa para as instituições goianas (Judiciário, Ministério Público e polícia) injustamente atacadas pela ministra Maria do Rosário, que as acusou de serem omissas em relação à morte dos moradores de rua.
Devido à sua condição de vulnerabilidade, o morador de rua corre mais riscos de morrer de forma violenta e sem a devida investigação, resultando em mais um caso de registro de morte indeterminada. Ocorre que, de acordo com o estudo do Ipea, justamente Goiás e Alagoas (os mais acusados do morticínio de moradores de rua) estão entre os Estados que apresentam um sistema de registro de óbitos confiável, com menor prevalência de mortes indeterminadas desde 2000. Já a Bahia – governada pelo petista Jacques Wagner – apresenta o segundo maior índice de mortes indeterminadas, perdendo apenas para o Rio de Janeiro de Sérgio Cabral, aliado do PT. Oficialmente o Estado do Rio apresenta 36,6 homicídios por 100 mil habitantes, mas, no cálculo do Ipea, quando computados os homicídios ocultos, essa taxa sobe para 52,8 homicídios por 100 mil habitantes. Na Bahia, a diferença também é expressiva, fazendo com que a taxa de homicídios passe de 34,5 na tabela oficial para 45,3 na estimativa real, que contabiliza os homicídios ocultos.
Se, de acordo com o estudo do Ipea, as estatísticas de homicídios de Goiânia e Maceió retratam melhor a realidade do que as do Rio de Janeiro e Salvador, então é muito provável que, nas duas últimas cidades, entre os homicídios não contabilizados estejam muitos casos de assassinatos de moradores de rua. Se um traficante carioca resolve incinerar um usuário de crack morador de rua por conta de dívidas de drogas, que funcionário do governo irá buscar a ossada anônima no cemitério clandestino do morro para contabilizá-la como homicídio? Não se esqueçam de que até o jornalista Tim Lopes, repórter da Rede Globo, quase se transformou numa ossada anônima. Somente um mês depois de seu desaparecimento, ocorrido em 2 de junho de 2002, é que uma ossada encontrada num cemitério clandestino da Favela da Grota, depois de testes de DNA, foi confirmada como sendo do jornalista. Se até um repórter da maior emissora de televisão do País não escapa de morrer como um pária, que segurança pode ter alguém que dorme nas ruas diariamente? Hoje, no Brasil, todo mundo está sujeito à pena de morte instituída pelos criminosos.
Perigosa nação de zumbis
Se os 50 mil homicídios contabilizados anualmente já perfazem uma carnificina indigna de uma nação civilizada, o que dizer dos mais de 60 mil mortos a cada ano, revelados pelo estudo do Ipea? Por que apenas 33 moradores de rua mortos em Goiânia ao longo de um ano provocam tanto estardalhaço no País, mas os milhares de homicídios da população em geral, ainda por cima escamoteados por estatísticas fraudulentas, não provocam nenhum abalo e não mobilizam os formadores de opinião? A resposta é simples: porque até a morte, no Brasil, tem ideologia. Se a vítima não integra algumas das minorias de estimação de universidades, ONGs e partidos de esquerda – como negros, gays, drogados, menores infratores ou moradores de rua – seu cadáver não tem a menor importância. Para os ideólogos que ditam a opinião pública, um morto só tem importância se puder ser usado como arma contra as instituições do Estado capitalista. É o caso dos moradores de rua.
Isso fica claro quando se analisa a minuta da “Política Nacional para Inclusão da População em Situação de Rua”, elaborada por um grupo de trabalho constituído por representantes da sociedade e instituída pelo Decreto nº 7.053, de 23 de dezembro de 2009, assinado pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Em nenhum momento, o decreto ou a minuta estabelecem como diretriz a integração da população de rua com a sociedade – é a sociedade que deve se integrar com o morador de rua. Essa política prevê que o Estado e a sociedade devem oferecer aos moradores de rua educação, saúde, trabalho, cultura, lazer e até segurança, sem necessariamente tirá-los das ruas. Isso fica muito claro numa das diretrizes na área da cultura: “Promoção de ações e debates de reconstrução da rua, deixando de retratá-la como um simples lugar de passagem e passando a percebê-la como palco de encontros, manifestações e construção de identidades”. Reparem na rua entendida como “lugar de construção de identidades”. O que é isso senão a naturalização da rua como hábitat de drogados, mendigos, foragidos, andarilhos etc., permitindo que essa gente privatize o espaço público, inclusive para seus vícios privados?
Outra diretriz estabelece: “Responsabilização e combate à impunidade dos crimes e atos de violência que têm essa população como público-alvo, ampliando, assim, a possibilidade de que a rua seja um espaço de maior segurança”. Reparem a inversão de valores: é a sociedade como um todo que representa um perigo para o morador de rua e não o contrário, como sabe qualquer mulher que já foi ameaçada ou roubada por um deles. Em janeiro do ano passado, quando a Polícia Militar realizou a Operação Salus em Goiânia, dos 147 moradores de rua abordados, 66 (45% do total) tinham ficha policial por delitos como tráfico de drogas, receptação, roubo e até homicídio. Entretanto, a pesquisa nacional sobre a população de rua, realizada pelo Ministério do Desenvolvimento Social, não traz nenhum dado sobre moradores de rua com passagens pela polícia. E esse dado é imprescindível, até para separar o joio do trigo, amparando o mendigo pacífico e mandando o bandido para a cadeia.
Entre as diretrizes da política nacional para os moradores de rua consta até “a inclusão da população em situação de rua nos programas e ações educacionais, culturais e de lazer desenvolvidos nas escolas, incluindo os finais de semana”. Ou seja, a depender da vontade desses gigolôs das minorias, as crianças das escolas públicas serão obrigadas a conviver com moradores de rua em seu próprio ambiente escolar, inclusive com aqueles que são viciados em droga, pois a política do governo não faz distinção entre usuário e não usuário de entorpecente. No fundo, os defensores dessa política estão apenas completando o trabalho de corrosão social iniciado na década de 80, com a “Luta Antimanicomial” (que deixou os doentes mentais sem ter para onde ir) e o Movimento dos Meninos e Meninas de Rua, que pariu literalmente muitos dos atuais adultos de rua. Agora, os usuários de drogas engrossam cada vez mais esse contingente, transformando parte da população de rua numa perigosa nação de zumbis.
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