Começou o defeso do caranguejo, mais uma destas barbeiragens que o estado impõe sobre a vida das pessoas. Com esta medida, lá vão os catadores profissionais (profissionais do auxílio-defeso, fique claro) a receber uma pensão mensal para não trabalhar, e os que não puderem receber por falta de carteirinha ou seja lá porque meramente praticam a atividade para consumo pessoal correrão o risco de ir pra cadeia, assim como qualquer cidadão que for flagrado chupando uma patinha do delicioso crustáceo.
O defeso, enfim, se serve para alguma coisa, é para dar emprego aos fiscais da área. Trata-se portanto de uma inversão da temporada: a fase que até então marcava o caranguejo como a caça tem-na agora na figura do catador e principalmente, dos donos de restaurantes. Na esteira de toda esta máquina de extorsão, lá se vão outros vindouros escândalos sobre os desvios envolvendo os sindicalistas que controlam a distribuição destes recursos a encher as burras do PT e dos seus piolhos de tubarão. E nós? Pagando a conta...
Para este ano, a situação do mercado deve piorar, a alimentar o comércio irregular, eis que a venda da carne extraída foi proibida desde o ano passado ou salgo engano, um pouco mais, com a alegação de que esta era feita sob condições inadequadas de higiene. Para que não reste dúvidas, era mesmo catada à mão e às vezes mediante sucção feita com a boca, conforme alardeado com grande alarido pela imprensa e pela tv. Então eu pergunto: E daí? Que nojo maior pode haver entre isto e de comer o dito cujo, que vive na lama? E olha que o caranguejo, herbívoro, até que não é nada assim tão ruim: e quanto aos que adoram um siri, este sim, um verdadeiro urubu do mar?
O fato é que mesmo muito antes de tal notícia correr o Brasil eu sempre imaginei que não podia ser diferente: ou alguém pensava haver alguma fábrica por aqui com modernas máquinas separadoras? Isto tem sido assim desde há pelo menos uns cem anos e não se sabe de alguém que tenha morrido ou adoecido em decorrência direta. Ou beijar na boca mata? Os responsáveis pelas campanhas em favor dos aidéticos que o digam!
À parte dos excessos, parece que estamos vivendo sob uma neurose coletiva caracterizada pelo transtorno obsessivo-compulsivo de assepsia (ih, perdoem-me os psiquiatras se não estiver usando a terminologia médica adequada...). A "ditadura da portaria" é implacável neste quesito, a estipular toda sorte de limitações e impedimentos para supermercados, açougues e restaurantes, bem como obrigando os que trabalham no ramo ao cumprimento das mais exóticas obrigações. Ocorre, entretanto, que o mundo não é naturalmente assim. Por mais bem tratada que seja uma peça de carne bovina ou um filé de pescado, a verdade é que estamos ingerindo organismos vivos - isto é, mais exatamente, mortos, e com eles uma infinidade de micro-organismos sobre os quais não há nenhum controle exato.
De qualquer forma, até que o fato se tornou notícia pela imprensa privada, o estado dormia em sono profundo. Ora pois, se há alguém que tenha se escandalizado com o método manual-bucal de extração do caranguejo, que abstenha-se de adquiri-lo! Cidadãos brasileiros, comportem-se como homens e mulheres responsáveis por suas escolhas! Se a imprensa, como um serviço privado, já cumpriu a sua parte divulgando o fato, cumpre-lhes complementar a ação - privada - e decidir pr si próprios se o consumo de tal produto deve ou não ser feito por vós mesmos! E por favor, deixem-me apreciar uma inigualável unha-de-caranguejo, que eu e outros paraenses estamos a morrer de saudades a ponto de matar um pelo caminho...! (É tal como uma coxinha-de-frango, mas que em seu lugar leva uma pata e uma porção de carne extraída de caranguejo).
Imagine se formos pegar no pé de tantos quantos hábitos alimentares que consistentemente ou não possam nos dar nojo: na Inglaterra, o mais famoso prato popular, peixe frito com fritas, é servido numa folha de jornal, e tenha-se em conta, para arrepio dos mais enjoados, que os italianos e seus descendentes adoram uma iguaria que consiste em comer a larva que se alimenta de queijos apodrecidos! Aliás, destes eu não provei, mas já comi das larvas do coco (tapuru) e da madeira (turu). A primeira é muito gostosa e a segunda, que dizem ser afrodisíaca, nem tanto. Em tempo, ainda quero provar os insetos achocolatados que se vendem na Inglaterra, e os fritos que os chineses preparam. Só não quero provar carne de cachorro, como o apreciam os coreanos, por uma questão cultural - afinal, o melhor amigo do homem não foi feito pra isto...
Ademais, como tenho dito, proibições jamais geram soluções, mas apenas excluem alternativas. É bem provável que um cidadão norte-americano torça o nariz para as condições de higiene de uma boa casa de carnes ou de um bom supermercado brasileiros, haja vista que em seu país ele tem à sua disposição estabelecimentos muito melhores. Ele não depende, portanto, do Inmetro ou da Anvisa ou do MPF, mas simplesmente do mercado, de seu dinheiro e de seu juízo. Aqui, entretanto, embora seja certo que haja os estabelecimentos modelares, existem também os nem tanto assim e daí vamos escada abaixo até chegar às barraquinhas da feira. Proibir e inventar excentricidades, portanto, não vai fazer gente pobre vender ou comprar sob melhores condições, mas apenas criminalizá-las...por serem pobres!
Quanto ao defeso, nada mais eficiente para a proteção do caranguejo do que o preço! Sim, o preço! Tá difícil a captura? Cobre-se mais! Este é o estímulo verdadeiramente eficiente, tanto no plano ecológico quanto no econômico. Em recente viagem de férias pelo Nordeste, os preços para quem quisesse apreciar uma saborosa lagosta estavam por volta de R$ 120,00. Declinei e me senti feliz pela preservação...da minha carteira...
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