Em recente declaração, o blogueiro acusou a ministra
dos direitos humanos de roubar as suas piadas.
Por Klauber Cristofen Pires
Obviamente, o fato acima não aconteceu. Refiro-me,
claro, menos à hipótese de Joselito Muller processar a ministra dos Direitos
Humanos do que ela de fato roubar suas pilhérias (eu sei, ela faz isto
involuntariamente...).
O título e o proêmio acima constituem uma homenagem à
picardia talentosa de JM. Digo isto porque o meu estilo está mais para o
didatismo que cumpre a função a que se propõe, mas não carrega aquela pimenta
com que somente os textos satíricos são temperados. No mais, se hoje essa gente
que se criou com não mais do que slogans de faixas de protestos solta a Polícia
Federal em cima de um dono de um blog ostensivamente humorístico, imaginem o
que fará contra mim? Até que eu demonstre que focinho de porco não é tomada,
terei morrido numa solitária...
Para quem não sabe, o blogueiro explodiu nas redes
sociais e até na tv por uma hilária postagem do dia 15/10/2013 intitulada “Maria
do Rosário se comove ao ver vídeo de assaltante sendo baleado”. Não foi um
golpe de sorte. Conhecendo seu blog, ri tanto de suas “notícias” que tive até
vertigem. JM tem o dom de fazer graça em forma de reportagem fake
fazendo uso da verossimilhança com o objeto de suas críticas. Como ele mesmo
declarou sobre a ministra dos direitos humanos: “viajei pro futuro e vi ela
dizendo isso. Como divulguei antes e pegou mal, ela desmentiu”. Eu cá já
até vou mais longe: tenho medo de ele dar ideias!
No dia 06 de setembro de 2013, o Jornal Nacional
divulgou o drama do escritor de literatura de cordel pernambucano David
Teixeira, que foi covardemente “prensado” pela Procuradoria do INSS por causa
de um livrinho de poemas com o nome de “A lei da Previdência para a
aposentadoria”, no qual constam os seguintes versos: “Essa tal de
aposentadoria, que agora vou destrinchar, pede tanto documento, dá vontade de
chorar”.
David Teixeira, um homem simples, com medo de ser
preso, contou que queimou 600 exemplares de sua obra, e tratou de recolher os
que já estavam à venda em outras 90 bancas, bem como se comprometeu a alterar
os versos, após ser intimidado por duas procuradoras do INSS. Segundo ele, “a
mulher [uma das procuradoras] disse que entendia isso aqui [o cordel], mas o
pessoal de Brasília não, e pediu para mudar teor do cordel, porque estava
falando mal da Previdência”.
O fato acima revela a índole autoritária que anda
grassando no nosso país. Eu tenho que o cidadão David Teixeira tem o direito de
exigir indenização por danos materiais e morais, e que os responsáveis por este
ato covarde merecem ser responsabilizados administrativamente, por abuso de
autoridade, ao lançar-lhe ameaças confiando em sua pouca instrução. Segundo o
G1, o escritor voltou atrás e acionou a justiça, que já expediu liminar garantindo
o seu direito de publicar o seu livreto na versão original.
Não foi a primeira vez, pelo menos do que acaba vindo
a público: o humorista Marcelo Madureira, do programa Casseta & Planeta, já
havia revelado ter recebido vários bilhetinhos de Brasília com recomendações
para que modificasse suas piadas.
Desta vez, bateram de frente com um cidadão de alta
cultura e conhecimento jurídico. Ele sabe quais são seus direitos de cidadão e
os esfrega na cara, como fez com a inacreditavelmente despudorada EBC, ao
entrevistá-lo com perguntas dignas do Granma e depois editar maliciosamente a
matéria que publicou, como as que seguem:
Agência Brasil - Seu nome real?
Profissão? Ainda mora em Natal (RN)?
J.M. - Prefiro manter meus
dados pessoais restritos no momento. Não quero manifestações pacíficas de Black
blocs na porta do meu escritório ou da minha casa.
Ainda moro na
agradabilíssima capital do Rio Grande do Norte.
A resposta de JM denuncia tanto a intenção da
pergunta quanto a origem e razão da existência desses terroristas.
Ainda assim, a EBC se fez de sonsa e associou a
vontade do entrevistado de proteger sua intimidade como uma forma de não ser
encontrado pela justiça por conta de uma senadora do PT que também se sentiu
“lesada” por conta de uma “notícia” de seu blog de que ela teria proposto um
projeto de lei que pagaria uma bolsa de R$ 2.000,00 para prostitutas. Quanto a
isto, assim JM se manifestou:
Um tempo atrás a senadora
Ana Rita (PT-ES) também acionou a PF para descobrir quem eu sou com a intenção
de me processar.
Quando soube do fato,
liguei para o gabinete dela, que me encaminhou para a Procuradoria do Senado,
que por sua vez me encaminhou para a Polícia do Senado, onde pude finalmente
informar meu nome e endereço.
Mais de um mês após, a
polícia “descobriu” quem eu era e fez um estardalhaço na imprensa local.
Não há necessidade de
investigação. Basta pegar os dados que já estão no outro inquérito.
De todo modo, devo dizer
que o caso não se trata de difamação. Se ela se desse ao trabalho de consultar
um advogado, saberia disso.
Agora olhem esta
pergunta pra lá de canalha:
Agência Brasil - Concorda que isso pode tê-la
prejudicado, inclusive politicamente?
J.M - O que fiz
no texto foi resumir os posicionamentos de Sua Excelência, baseado em
declarações anteriores, e aplicar a uma situação real com a intenção de fazer
parecer absurdo.
Se isso a prejudicou politicamente
é um ônus que ela tem que suportar.
De todo modo, quem criticou a
ministra tomando por verdadeiras as declarações, também criticaria se a vissem
falar sobre qualquer outro assunto semelhante.
Isto lá é pergunta que um jornal que se preze deva
fazer? A EBC trata a reputação política da ministra como se esta
aprioristicamente pairasse acima das críticas dos reles mortais, e o cargo que
ocupa como se fosse sua propriedade instalada no Olimpo. Trata-se do mais
descarado oficialismo lacaio que eu já pude constatar em um veículo de
comunicação!
É pouco? Então vejam como capciosamente se pode
contar uma mentira reproduzindo verdades fora do seu contexto:
Agência Brasil - Concorda com a
acusação de que muitos leitores tomaram como verdadeiras as supostas
declarações atribuídas à ministra, não só lendo-as em outros sites e nas redes
sociais, onde o texto foi tirado de seu contexto original, mas também em seu
blog, como demonstram muitos dos comentários postados antes do desmentido da
ministra?
J.M. - Sim, muita gente
acreditou no texto. Mas isso é algo que independe da minha vontade.
Acredito que esse seria um
momento oportuno para que a ministra repensasse certas posições.
Já pensou se eu tivesse
atribuído tais declarações ao Jair Bolsonaro? Quem acreditaria?
Se muita gente acreditou,
foi pelo fato dela ser capaz de dar declarações com o conteúdo semelhante.
Como vocês podem ver na pergunta acima, que antecede
à que reproduzi antes, Joselito Muller em sua resposta fez uma crítica severa
ao farisaísmo da ministra. Mas vejam agora como a EBC publicou:
O autor do blog acredita
que seus leitores sabem que, geralmente, ele escreve "pilhérias”,
reconhecendo, contudo, que muita gente tomou a piada como verdade. “Mas isso é
algo que independe da minha vontade”, disse em entrevista à Agência
Brasil.
Da forma como foi publicado, ficou parecendo que JM é
um sujeito leviano e inconseqüente que havia sido pego com a boca na botija e
que respondeu que aquilo independe de sua vontade como uma tentativa
desesperada de se evadir de sua responsabilidade.
A Secretaria dos Direitos Humanos, por sua vez, por
meio de uma nota de tom autoritário em que expõe sem pejo sua alergia à
liberdade de expressão, esmerou-se em encarnar a própria piada: quem está
acionando a Polícia Federal e solicitando a censura a um blogueiro? A
Secretaria dos...Direitos Humanos! Vejam o teor abaixo:
A Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH/PR) informa que a ministra Maria
do Rosário solicitou à Polícia Federal criteriosa investigação e
responsabilização dos autores da notícia mentirosa publicada no blog
http://joselitomuller.wordpress.com/ e amplamente repercutida na internet desde
ontem (15). Da mesma forma, estamos solicitando à empresa que hospeda o site
que retire o conteúdo difamatório do ar.
Ao atribuir falsas declarações à ministra, o
blog comete um ato criminoso e fere princípios éticos fundamentais. “Sou defensora plena da liberdade de expressão,
mas a manipulação é inadmissível”. O blog inventou declarações da
ministra sobre o caso de um assaltante que foi baleado por um policial. “No caso específico, minha opinião é clara: o
policial agiu dentro da lei”, disse a ministra.
A ministra alertou ainda que a internet tem, na
maioria das vezes, se tornado uma aliada essencial para democratização da
informação. No entanto, não pode converter-se em um território de espionagem
nem tampouco de difusão de informações que violem os direitos das pessoas.
Brasília/DF, 16 de outubro de 2013.
Com a
declaração da ministra de que o policial agiu dentro da lei, o repórter
destemido disparou o tiro de misericórdia com sua Glock 9mm : “apesar dos
pesares, foi a primeira vez que alguém conseguiu fazer com que ela (Maria do
Rosário) desse uma declaração em favor da polícia.”.
Vou terminando aqui, não sem antes congratular
Joselito Müller por sua coragem em apostar na vigência do estado de direito: “A
Constituição me garante o contraditório e ampla defesa. Então, que venha o
processo”.