M. Friedman e as quatro formas de se gastar dinheiro
Semana passada, abri uma exposição de meus trabalhos numa galeria mantida pelo governo. Para a preparação do espaço, enviaram um pintor que, assim que viu as tintas que estavam disponíveis para o serviço, disse que não seria o bastante. Respondi que sim, que daria para fazer o trabalho. Ele, sem saber que as tintas haviam sido compradas por mim, não pela prefeitura, insistiu que não seria o bastante e começou o serviço sem se preocupar em utilizá-las de forma racional. Três horas depois, um tanto aborrecido por eu ter lhe pedido mais capricho, ele simplesmente foi embora sem dar qualquer satisfação. Assumi o serviço. Pouco tempo depois, as paredes estavam pintadas. A tinta foi suficiente.
O episódio me lembrou das quatro formas de se gastar dinheiro descritas por Milton Friedman.
1° – Quando gastamos nosso próprio dinheiro com nós mesmos; neste caso, sempre nos esforçando em fazê-lo da melhor forma possível, afinal, é o fruto de nosso trabalho, dos nossos esforços. Por isso procuramos sempre a melhor relação custo-benefício na hora de comprar qualquer produto ou serviço e evitamos desperdício.
2° – Quando gastamos o nosso dinheiro com outra pessoa, comprando um presente para alguém, por exemplo. Neste caso, sempre calculamos o valor do presente em função da importância e do merecimento da pessoa e principalmente se temos ou não condições para isso.
3° – Quando gastamos o dinheiro de outra pessoa conosco. Um bom exemplo é imaginar alguém nos oferecendo um almoço no restaurante que escolhermos. Com toda a certeza, escolheremos um restaurante melhor e mais caro do que aquele que optaríamos num dia qualquer, afinal, não seríamos nós que pagaríamos a conta.
4° – Quando gastamos o dinheiro de uns com outros, tendo como exemplos se alguém nos desse um dinheiro para comprar um presente para uma terceira pessoa ou nos mandasse fazer um serviço utilizando material que não foi comprado por nós. Neste caso, as considerações que teríamos na 1° e 2° formas desapareceriam, afinal, não haveria razão para nos preocuparmos com o bom uso desse dinheiro.
Essa análise de Friedman explica grande parte da ineficiência estatal. O tal pintor encarregado de preparar as paredes da minha exposição não tinha qualquer interesse em usar de forma racional a tinta disponível pelo simples fato de ela não ter sido comprada com o seu dinheiro (4° Forma). Se ele tivesse que pintar sua casa, imaginando-a com a mesma área da galeria e tendo a disposição a mesma quantidade de tinta, com toda certeza ele daria um jeito de ela ser suficiente – como eu mesmo fiz ao me esforçar em racionalizar o uso da tinta comprada com o meu próprio dinheiro (1° Forma).
Provavelmente o pintor teria se comportado de maneira melhor se eu, logo no começo, lhe dissesse que aquelas tintas foram compradas por mim e por isso ficaria ao seu lado, fiscalizando a forma como ela seria usada. Mas não… Para ele, aquela era apenas mais uma tarefa cotidiana dentro de um sistema que não lhe cobra responsabilidade. Sua postura (4° Forma) representa a da grande maioria das pessoas que preenchem a gigantesca estrutura estatal, sendo a principal causa do uso irresponsável de energia, de água, de telefone, de combustível, de passagens aéreas, de “cafezinhos”, de todo tipo de material que adentra os labirintos estatais… Além da farra protagonizada por funcionários do alto escalão em restaurantes e hotéis de luxo (3° Forma). A verdade é que a maioria dos funcionários públicos não tem pudor nem em desperdiçar o tempo do cidadão que precisa de um serviço do governo.
O que o Estado faz, por meio de sua própria existência, é criar o ambiente perfeito para a preguiça, para a irresponsabilidade e para a má conduta humana. Sem o risco de punição e de demissão, a maioria dos funcionários públicos tende ao desperdício e ao cumprimento de suas tarefas na medida do humor de cada dia. A grande maioria deles não é formada por pessoas de caráter ruim, unidas para tornar a vida dos outros mais cara e burocrática. São apenas seres humanos. Seres humanos cuja responsabilidade e eficiência estão diretamente relacionadas ao risco de perderem empregos e privilégios − quanto mais seguros se sentem num emprego, mais relapsos se tornam.
A pergunta que devemos fazer a todos os defensores do Estado como gerador de emprego é: Como o cidadão comum, aquele que mantém o Estado por meio do pagamento de impostos, terá a certeza de que cada funcionário contratado pelo governo exercerá sua função com responsabilidade, considerando que não corre o risco de ser demitido? Ou poderíamos apenas perguntar: Você contrataria para um negócio próprio alguém que não pudesse demitir? Nenhuma pessoa o faria. Ninguém, porque todos sabem que não há como prever, numa situação de estabilidade de emprego, o comportamento de uma pessoa por meio de simples provas e entrevistas. Se é quase impossível para nós, olhando nos olhos de cada pessoa, ter certeza sobre como será seu comportamento em determinada função, imaginemos para o Estado!
Nenhuma pessoa contrataria para seu negócio alguém que não pudesse demitir, porém, a grande maioria das pessoas exerceria a 3° e a 4° forma de se gastar dinheiro descrita por Friedman caso ocupasse um cargo no governo. Concursos e cargos comissionados representam tragicamente essa realidade, afinal, o dinheiro do salário de cada funcionário não sai do bolso de quem assina as contratações, mas, sim, do bolso da sociedade; e mesmo que cada pessoa contratada fosse realmente necessária num órgão público, mesmo que esta pessoa fosse competente e dedicada, a tendência é que o conforto a leve ao desleixo.
A 4° forma de se gastar dinheiro também é vista nos bancos e empresas estatais e na administração de fundos de pensão controlados por partidos políticos, com destaque para o caso do Postalis, fundo controlado por PT e PMDB, cujo rombo de mais de R$ 5,6 bilhões será pago por meio da redução do salário dos funcionários. Consideremos que um fundo de pensão não é uma mega e complexa empresa como a Petrobrás, que precisa gerenciar produção, armazenamento, venda e distribuição de produtos no mercado e ainda dar conta de pagar dezenas de milhares de funcionários e fornecedores. Um fundo de pensão tem apenas a responsabilidade de administrar certo volume de dinheiro. Tal absurdo pode ser descrito em poucas palavras: Meia dúzia de pessoas com amplo poder sobre o dinheiro dos outros. Meia dúzia de pessoas com poder para autorizar patrocínios, doações e contratos entre amigos. Tudo, à custa do trabalho da sociedade.
Enquanto finalizava esse texto, Dilma sancionou a triplicação (triplicação!) da verba partidária, quase R$ 900 milhões, ou seja: subornou TODO o Congresso Nacional de uma só vez, com apenas uma assinatura. É assim que o Estado se mantém de pé, com uns poucos usando o dinheiro de todos da forma como bem entende.
A verdade que fica evidenciada também neste caso é que a diminuição drástica do Estado, tanto em estrutura quanto em poder, é uma questão de minimização de riscos. Quanto mais a sociedade confiar ao Estado tantas funções e tantos poderes, mais essa mesma sociedade perderá dinheiro, perderá tempo, perderá liberdade e comprometerá seu futuro.
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