sexta-feira, 29 de maio de 2015

LIBERTAD Y DESARROLLO – Centro chileno de estudos liberais é exemplo para os brasileiros, diz Vitor Delphim

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À esquerda, a pesquisadora do instituto chileno, María Paz; à direita, nosso entrevistado, Vitor Delphim
Diante do cenário tempestuoso que vivemos, o Brasil e a América Latina como um todo anseiam por bons exemplos que indiquem o caminho para escapar dos abismos do populismo e da tendência estatizante que vem predominando. Até bem pouco tempo atrás, entre as alternativas mais próximas, o modelo chileno refulgia, com a posição de destaque daquele país na maior parte dos indicadores socioeconômicos. Isso se deve, como não poderia deixar de ser, a uma orientação mais liberal adotada pelo país, ao menos do ponto de vista econômico. O Libertad y Desarrollo é uma instituição criada em 1990 por Hernán Buchi, Carlos Cáceres, Cristián Larroulet e Luis Larrain com o objetivo de desenvolver análises e propagar percepções de políticas públicas que se sustentem na defesa de princípios como as liberdades individuais, o livre mercado e o direito de propriedade, os mesmos valores abraçados aqui no Brasil, desde 1983, pelo nosso Instituto Liberal.

Nosso estimado colaborador Vitor Delphim, consultor e pensador político, formado em administração de empresas pela FGV e cursando MBA em Finanças pela IBMEC, visitou a instituição e cedeu uma entrevista esclarecedora sobre o movimento liberal chileno e o que temos a aprender com sua organização e com o panorama geral do país. O resultado você confere aqui.

Primeiramente, de que forma se deu a viagem? O que a motivou? Como foi o convite?
Eu tinha uma viagem a passeio para o Chile marcada e o Bernardo (Santoro, diretor-executivo do Instituto Liberal) me sugeriu que aproveitasse a oportunidade para conhecer a instituição local, porque lá funciona o sistema de voucher, principal tópico de minhas pesquisas. Aproveitei e uni as duas coisas. O Libertad y Desarrollo é, sem dúvida, um instituto que preza a liberdade, que defende a liberdade. É muito bacana, muito bem estruturado; o pouco contato que tive com a equipe foi com duas pessoas altamente capacitadas: a María Paz, pesquisadora da área de educação e que conhece muito a respeito do funcionamento do setor no Chile, e a Betina, que é como que a gerente deles.

Você participou de algum evento ou conferência realizado pelo instituto?
Não; eu estive em reuniões com a pesquisadora Maria Paz, estabelecemos um contato, um acordo de cooperação, e estamos desde então trocando informações sobre o modelo de sistema educacional chileno, aprofundando e até fechando com o Bernardo um texto para descrevê-lo, a ser publicado em breve.

Entretanto, as pesquisas do instituto sabidamente não se limitam à área da educação.
É verdade; o Libertad y Desarrollo defende os ideais liberais em geral. É um centro de estudos de políticas públicas na defesa da liberdade, em todos os sentidos. Como o meu tema de interesse prioritário nesse momento é a educação, focamos nesse aspecto em nossas observações.
As referências teóricas deles são as mesmas que temos por aqui no IL? Milton Friedman, Hayek…
Sem dúvida. Creio que Milton Friedman seja a grande referência.

Quando se fala em Chile e liberalismo, o que logo nos vêm à cabeça é a questão dos Chicago Boys e Milton Friedman, introduzindo políticas economicamente liberais durante a ditadura militar de Pinochet. O Libertad y Desarrollo desenvolveu alguns estudos sobre isso?
Isso é uma questão com que eu me preocupo. Há uma tática esquerdista para tentar desmerecer as políticas liberais chilenas, alegando justamente sua introdução mediante um regime ditatorial. Nós e o instituto chileno não discutimos a questão política, mesmo porque nós liberais não somos favoráveis a nenhum tipo de ditadura. Entretanto, realmente, embora o modelo chileno tenha a participação do setor privado em áreas como a educação há muitos anos, isso só foi plenamente institucionalizado enquanto política pública, no modelo atual, onde se tem a subvenção geral e preferencial, o voucher, na década de 80, quando o regime militar ainda estava à frente do país.

O instituto, no entanto, foi criado em 1990, não existia ainda nessa época, certo?
É, mas a política pública já vinha ocorrendo. Acho só bom fazer essa separação porque às vezes as pessoas confundem. O que estamos fazendo é apenas olhar a política pública, que deu certo, porque foi usado o sistema de voucher por lá. Hoje, vemos que há no Chile basicamente três grandes grupos de organizações institucionais de educação: um, que é baseado na educação privada, totalmente financiada pelas próprias famílias; outro, que é a educação de instituições também privadas, mas que são financiadas pelo governo; e o terceiro, que é baseado em instituições públicas financiadas também pelo próprio governo. Em torno de 85 % do sistema está ligado a financiamentos do governo, ficando apenas cerca de 14,5 % dos estudantes com as famílias inteiramente responsáveis pelos custos dos estudos. É um modelo bem interessante.

Quando perguntei sobre o governo, quis saber se o instituto tem algum foco para estudar especificamente essa questão, relacionada ao liberalismo e sua introdução na realidade chilena. Com que material eles se aprofundam sobre os assuntos que são de seu interesse? O que você pôde sentir das atividades do instituto?
A atividade é intensa, tem um pessoal altamente preparado. Nesse grupo que encontrei, soube que tinha um doutor da PUC local, a pesquisadora que me vem auxiliando é mestre e se prepara para o seu doutorado; são de um nível intelectual muito bom. É possível ver no próprio site deles alguns eventos que contam com a presença de pessoas importantes da política e do setor empresarial chileno, então você vê que é um instituto que tem uma profundidade teórica muito interessante, com um estofo acadêmico muito forte, e que está também muito atento às políticas públicas do Chile neste momento. Por exemplo, houve uma mudança na legislação lá que foi um retrocesso.

Estamos falando de um governo de esquerda, da Michelle Bachelet, do Partido Socialista do Chile.
Exatamente. Um governo repleto de denúncias de corrupção; mais um para os quadros lamentáveis da América Latina hoje, como no Brasil, na Venezuela, na Argentina…

Como o Libertad y Desarrollo se comporta em relação a isso?
O instituto se coloca como uma entidade independente e apartidária, como o IL e outros think thanks, mas tem uma postura crítica ao governo porque suas políticas públicas de esquerda são naturalmente antiliberais. Apesar de que, se formos parar para pensar, temos contradições sobre isso no próprio Brasil, com governos de esquerda sequestrando pautas liberais e moldando-as aos seus interesses; por exemplo, o projeto do Bolsa Família é, na realidade, liberal de origem, como um voucher fora da aplicação estritamente educacional, mas é o principal programa de governo do PT por aqui. Eventualmente, o discurso não tem a ver com a prática. Nesse caso chileno, porém, está realmente havendo um retrocesso; estão proibindo, dentro de três anos, que as escolas privadas com fins lucrativos recebam subvenção do governo (voucher). Isso é um retrocesso muito grande, porque diminuirá os competidores no mercado. Eliminando a competição, naturalmente a qualidade já pode cair, porque, sendo dada uma verba definida como principal incentivo, você matricular seu filho na escola A ou na escola B é uma escolha feita com base na qualidade delas. Então é um retrocesso na educação chilena comemorado pela esquerda como uma vitória, porque será tirado o lucro das mãos dos empresários. No fundo, o que queremos é melhorar a qualidade da educação e a oferta de oportunidades para que todos, a partir de seus esforços individuais, possam se desenvolver, e não nivelar todos por baixo. Queremos que a sociedade avance. Essa é a demanda liberal.

Qual a estrutura física? Eles têm biblioteca, arquivo?
Têm uma biblioteca, funcionam em uma casa muito bacana em Las Condes, um bairro de Santiago, que é como uma Barra da Tijuca local, com uma parte residencial de classe média alta e uma série de empresas do setor de expansão empresarial. A casa tem uma estética e uma arquitetura de estilo “conservador”, com uma sala de reuniões excelente, um auditório para eventos, conferências e seminários, e apesar de eu ter tido contato com apenas duas pessoas, pesquisando você vê que eles têm um corpo técnico muito preparado, o que faz diferença. Você não influencia no sentido de mudanças em políticas públicas sem ter um preparo teórico muito bom – e uma experimentação em escala menor que dê certo ajuda muito, claro, a conseguir implementar algo em escala maior.

Pelo que você descreveu, temos uma instituição muito equilibrada, com um quadro técnico interessante e que parece já ter certa penetração social no Chile, com certa influência para pautar algumas questões. O que você acredita que o movimento liberal brasileiro tem a aprender com a estrutura que eles conseguiram arregimentar por lá?
Acho que eles conseguiram criar um grupo, no verdadeiro sentido do termo. Nós, no Brasil, éramos vozes dispersas, individuais, que hoje já começam a se encontrar e unir, começa a existir um movimento que interage e dialoga, e nisso os chilenos já estão muito avançados. Montaram no Libertad y Desarrollo uma estrutura com corpo técnico pesado que subsidia as políticas públicas defendidas, confere credibilidade, e também tiveram anos de experiência para aprender e avaliar seus posicionamentos. Nem sempre o que supomos ser o ideal funcionará perfeitamente na hora da prática, então eles estão em constante ajuste. Graças à estrutura que eles conseguiram erguer, eles conseguem também se contrapor politicamente quando isso se faz necessário. Por exemplo, eles não conseguiram travar essa última mudança na legislação, mas existe todo um movimento contrário que se justifica academicamente, teoricamente, que produz conhecimento para esse fim e não fica só no discurso.

Mais do que apenas o Libertad y Desarrollo, o Chile como um todo é um grande exemplo para o Brasil. É o primeiro colocado nos principais índices do PISA (Programa Internacional de Avaliação de Alunos, em português) na América Latina. Comparar o Brasil com a Finlândia ficaria difícil, porque a renda per capita é completamente diferente. Temos que comparar com o que é comparável, dentro da realidade da América Latina, e nesse contexto, sem dúvida a liderança é do Chile no conceito geral, nos principais itens da educação avaliados, que são leitura, matemática e ciências. Temos que olhar para eles e ver o que estão fazendo lá, porque está dando certo.


Sobre o autor

Lucas Berlanza
Acadêmico de Comunicação Social, com habilitação em Jornalismo, na UFRJ, e colunista do Instituto Liberal. Estagiou por dois anos na assessoria de imprensa da AGETRANSP-RJ. Sambista, escreveu sobre o Carnaval carioca para uma revista de cultura e entretenimento. Participante convidado ocasional de programas na Rádio Rio de Janeiro.
Fonte: Instituto Liberal

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