Todo dia é dia de circo (e eu que me achava parado por esta modorrenta campanha eleitoral...). Prepare seus dados particulares: lá vem o Registro de Identificação do Cidadão (RIC) (Lei nº 9.454/97). Por ele, por meio de um único cartão magnético, segundo a Agência Senado, promete-se um fim à necessidade de se portar vários documentos.. Você cai nessa?
Os fatos estão aí: o presente governo, e não foi só uma vez, já foi o protagonista direto do vazamento de dados fiscais e civis (refiro-me aos dados privados dos estudantes que o Ministério da Educação recentemente divulgou em seu site). Bom, estamos falando do que é notícia: no mais, os dados fiscais de qualquer cidadão podem ser comprados em qualquer praça, de qualquer camelô.
Para quem não dá muita importância ao assunto, remeto ao caso do jornalista lulista e chapa-branca Ricardo Kotscho, que o jornalista Reinaldo Azevedo tem denunciado como aquele que quer identificar quem são os 5% de cidadãos que consideram o governo "ruim ou péssimo" em todas as pesquisas de opinião, "remando contra a maré". Nos países onde a revolução socialista está a alguns passos adiante, como na Venezuela, esta parcela do eleitorado já foi fichada e perdeu empregos, propriedades e até direitos básicos, como o de ir e vir. Como muito bem evocado pelo brilhante jornalista, não devemos nos esquecer dos judeus da Alemanha nazista, obrigados a portarem estrelas de Davi bordadas nas roupas, ou mesmo números de identificação marcados a ferro quente no corpo.
Em um momento grave como o que estamos passando, deveríamos estar refletindo sobre a real necessidade de expormos de forma tão vulnerável as nossas vidas. Nossos dados pessoais foram obtidos praticamente à força sob a garantia sagrada (sagrada?) pelos agentes do estado de que não seriam divulgados. Pois foram e tem sido arreganhados e pior do que isto, usados para os propósitos mais vis.
Antes que o discurso diversionista peça a palavra para, por exemplo, citar a constitucionalidade da necessidade de "identificação do patrimônio, dos rendimentos e da atividade econômica do contribuinte" (CF/88, art. 145, § 1º) pelo fato previsto pela redação do mesmo artigo de os impostos serem (e devendo ser), tanto quanto possível, pessoais, invoco os tempos do Império, em que as liberdades dos cidadãos, apesar disto, eram muito mais respeitadas, para citar o Código Comercial (Lei nº 556, de 25 de junho de 1850), que determinava, em seu artigo 17º: "Nenhuma autoridade, juízo ou tribunal, debaixo de pretexto algum, por mais especioso que seja, pode praticar ou ordenar alguma diligência para examinar se o comerciante arruma ou não devidamente seus livros de escrituração mercantil, ou neles tem cometido algum vício."
O fato é que os tributos cobrados no tempo do Império eram primordialmente caracterizados por terem seus respectivos fatos geradores, como eu diria, "da porta pra fora "das respectivas casas de comércio. Assim, eles podiam ser fiscalizados nos cartórios, em entrepostos alfandegários e em barreiras ocasionalmente montadas nas estradas. Se tudo funcionava tão bem naquele tempo em que a tecnologia era tão primitiva, porque muito mais não poderia ser aplicada com sucesso hoje em dia?
Os tributos atuais, pelo contrário, ligam-se ao faturamento, ao lucro e até mesmo às pessoas físicas, daí exigindo a necessidade da bisbilhotice estatal mais inxerida, inclusive com grave risco para a espionagem industrial e comercial, bem como para a manipulação desde cima do poder, de cujo exemplo podemos citar a denúncia do dono dos refrigerantes Dolly, amplamente veiculada nos meios de comunicação à época em que ocorreram, segundo o qual o fisco supostamente teria baixado uma portaria a exigir das fábricas de embalagens que divulgassem seus clientes, para estratégico conhecimento por parte da Coca-cola, que pretendia sufocar os fabricantes das chamadas "tubaínas".
Com relação ao vazamento dos dados dos estudantes, se eu for até o âmago da questão, já começaria por indagar qual a necessidade de um "ministério da educação". No Brasil, nos seus quase oitenta anos de existência, só o que fez foi formar a maior massa de analfabetos funcionais da nossa história, aqui e em todos os países onde foi implantado, até mesmo nos Estados Unidos. Um desastre total. Todavia, só e somente só para responder ao problema dos dados particulares das pessoas, afirmo peremptoriamente que jamais o estado teria a necessidade de coletar tais informações para cumprir a sua auto-atribuída missão.
Com a entrada em vigor do tal "Registro de Identificação do Cidadão", (note a demagogia presente no nome), um só documento passará a agregar os números da Carteira de Identidade (RG), do Cadastro de Pessoa Física (CPF), do Título de Eleitor e do PIS/Pasep, entre outros. (Olhe lá: "entre outros"), e com ele, a partir de um único clique, todas as informações civis, criminais, eleitorais, fiscais, bancárias, financeiras, previdenciárias e sei lá mais também o quê.
Em Portugal, a própria constituição proíbe a instituição de um número de identificação único nacional, naquele país que é menor do que Santa Catarina. Aqui vamos de marcha ré: agradeçamos por mais esta vitória do Big Brother sobre os indivíduos ao seu autor, o senador Pedro Simon (PMDB-RS).
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