domingo, 23 de março de 2014

Congresso de Artes Liberais - Dialética e Lógica

Publicado em 15/03/2014
Sétima palestra do I Congresso de Artes Liberais, realizado em 8 e 9 de março de 2014, em Porto Alegre.

Palestrantes: Augusto Fleck e Felipe Farinon

Nos comentários abaixo, resumo da palestra e bibliografia.



 
LÓGICA E DIALÉTICA

- Falar da função da lógica é falar da sua função para a vida intelectual. Nossas vidas são feitas de ciclos internos e momentos.

- Os três modos de dirigir uma ação: por acaso, por experiência ou por arte. Por acaso, pegar um instrumento qualquer e sair dedilhando sem conhecer música. Por experiência, a nona que cozinha muito bem mas sem saber explicar como faz.

- Técnica é "recta ratio factibilium", a direção racional da produção de algo.

- A técnica está presente em todo momento, até para abotoar uma camisa, abrir uma porta.

- Técnica é ação reta. Tornar algo reto é torná-lo um "rito".

- O período prévio de formação. Todos os momentos de um seminário, de uma auto-escola, etc, são lembranças de um momento de menos responsabilidade.

- O aspecto comum de todas as atividades intelectuais é o discurso. Tanto ativo (falando, escrevendo) quanto passivo (lendo, ouvindo).

- Normalmente rejeitamos um discurso com erros gramaticais não porque falte verdade, mas porque seja sinal de falta de formação da pessoa. Trivium e trivial.

- Há três aspectos num discurso: a correção material, a eficácia psicológica e ordenação à verdade. Este último a lógica trata de dirigir.

- A lógica parece um discurso mais isolado. Retórica nos traz a imagem de um senador, pregador, parlamentar, etc. Gramática a imagem dos pais ou da professora. Já a lógica nos remete a um pensador, um monge, um acadêmico em sua escrivaninha, mas isso não é muito exato. A lógica e a dialética não são isolamento, mas recolhimento.

- Depois de haver muitas opiniões num meio é que alguém vai se perguntar o que afinal é verdadeiro ali. O princípio da não-contradição.

- A razoabilidade do discurso e seus graus de certeza.

- Aristóteles, pai da lógica, começa as Categorias, primeiro livro do Órganon, fazendo já uma distinção entre equívocos e unívocos. Antes de tentar definir qualquer coisa, é preciso primeiro ver seus vários significados. "Arte" num contexto significa belas artes, no original técnica, etc.

- Caráter auxiliar de lógica: era originalmente chamada de orgânica, instrumental. Auxilia a nos dirigir à verdade.

- O próprio palestrante seguiu uma ordem: vida humana de modo geral, especificando na vida intelectual, prosseguindo para a função da lógica na vida intelectual, etc. É algo "artificial", mas no sentido positivo. A lógica natural é a capacidade natural do homem para discorrer sobre os assuntos. A lógica é necessariamente usada na fala (ainda que não num modo técnico).

- O objeto da lógica é a verdade. Logo no início já se dividiu em lógica formal e lógica material. A lógica formal lida apenas com a validade do discurso. A material, unida à formal, lida com a veracidade.

- Todo homem é mortal. Sócrates é homem. Logo, Sócrates é mortal. Se todo A é B, e C faz parte de A, C é B também. Mas eu posso usar essa mesma estrutura silogística assim: Todos os corpos celestes são constituídos de queijo; a Lua é um corpo celeste; logo, a Lua é constituída de queijo. O argumento em si é válido, mas não verdadeiro.

- No decorrer da história, o que se chama lógica formal passou a ser chamado de lógica. Aristóteles incluía ambas. Na faculdade ao se estudar lógica, estuda-se lógica formal. É o espírito dos nossos tempos; a veracidade da coisa não importa, nem sei se existe verdade mesmo...

- Para a vida intelectual, a lógica formal não basta. Queremos saber se as coisas são verdadeiras, não se são válidas. Esse esforço não pode ser ao acaso, é preciso uma arte, uma técnica.

- Ao contrário da lógica formal de hoje, a antiga tinha um caráter de técnica mesmo. A lógica moderna tende a se tornar a uma máquina, uma computadorização. Pontes de Miranda diz que a máquina é como uma técnica que se desprendeu do homem. A técnica sobrevém ao homem, aperfeiçoando uma sua operação; já a máquina é separada. A computação é como um estreitamento da lógica formal.

Pergunta: a lógica me permite ver a veracidade de uma afirmação?
- Há dois modos de discurso: ativo e passivo. O passivo é a pessoa ouvindo ou lendo. A lógica serve pra ambas. Uma é a crítica, outra a função diretiva. Todo discurso é sequencial. Sabendo as premissas, você saberá se a conclusão se segue.
Ao ler um livro, quase sempre não há um encadeamento perfeito; os argumentos estarão espalhados, e você mesmo ativamente terá que retraçar o discurso e ver se as coisas são assim.

Pergunta: a redução da lógica à linguagem. A matematização da lógica em proposições simbólicas foi um passo decisivo para a separação da lógica dos afazeres humanos para esse novo ser maquinal. A lógica posterior ao Russell tem como proposta a negação dos princípios ontológicos da lógica clássica. A lógica paraconsistente. O objeto primeiro do conhecimento humano é a intelecção do real. Uma restauração da lógica é urgente?
- A  lógica desvinculada de toda noção de verdade vira um joguinho. Os congressos de lógica estão repletos de esquemas e fórmulas, etc, sem nenhum apego às coisas e à vida intelectual.

Pergunta: a lógica sem conhecimento prévio é apartada da vida. Você pode escrever 1000 volumes bem concatenados sobre a composição do queijo dos astros, mas não é de queijo.
- O aspecto lógico do discurso é um aspecto entre outros. Nós podemos passar por cima das incorreções gramaticais se há uma validade, assim como podemos passar por cima das incoerências formais se o sujeito estiver falando de fatos de experiência real. A prioridade é sempre a verdade.

Pergunta: quanto mais avança na lógica desprovida da filosofia clássica, há uma tendência ao camarada se achar divino, mas é rigorosamente um imbecil. É escola pra psicopata.
- Gödel foi um tremendo lógico, mas morreu de inanição num hospício. Chesterton dizia que o louco é quem perdeu tudo, menos a razão.
Pergunta: o importante acima de tudo é a dialética. A mera depuração lógica não basta. Alguns católicos ultra-tradicionalistas, radtrads, pegam frases de encíclicas papais fora de contexto algum e tiram conclusões peremptórias e definitivas.
- Uma das funções da lógica é identificar o nível do discurso em questão. É um erro lógico tomar tudo como analítica. Assim como não vai se refutar Homero.

Pergunta: lógica material seria coerência externa, e formal coerência interna? A lógica material sendo assunto da dialética e a formal da analítica?
- A analítica e a dialética são partes da lógica material, que vai se dividir conforme os graus de discurso. Teoria dos Quatro Discursos, Olavo, S. Tomás e Avicena. A lógica formal não trata do nível de certeza ou credibilidade, mas do nível de consequência.

Bibliografia
Aristóteles: "Categorias," "Retórica," "Metafísica".
Ortega y Gasset: "A Rebelião das Massas"
Pontes de Miranda: "Tratado de Direito Privado," vol. I
Olavo, "Aristóteles em Nova Perspectiva"
S. Tomás: "Exposição do livro dos Analíticos Posteriores" ("Expositio libri Posteriorum Analyticorum")
Simplício, On Aristotle's "Categories"
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