sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

Democracia socialista: contradictio in adjecto

ds-30-anos1O Partido dos Trabalhadores (PT) possui uma tendência interna chamada democracia socialista. Em Filosofia, chamamos isso de contradictio in adjecto,uma expressão latina utilizada quando se atribui a um nome uma característica que o contradiz.

A democracia pressupõe individualismo e liberdade, enquanto o planejamento social próprio do socialismo tenta alcançar a igualdade reprimindo o indivíduo. Em um jogo retórico que ainda hoje nos confunde, o socialismo passa a prometer uma libertação econômica que seria mais fundamental que a libertação política. O perigo, porém, está no fato de que a supressão da liberdade política equivale à coerção e ao poder arbitrário sobre o indivíduo, de modo que aquilo que fora apresentado como caminho para a liberdade torna-se o caminho para a servidão.
O debate entre socialismo e liberalismo não deveria ser posto no âmbito das finalidades, sob o risco de que se corrompa a discussão com a ideia equivocada de que socialista é aquele que busca a diminuição da pobreza enquanto liberal é aquele que só se preocupa com o lucro. A discussão entre ambos diz respeito mais aos meios que aos fins. O liberal tem uma convicção: a de que os métodos propostos pelos socialistas para atingirem seus fins (abolição da propriedade privada dos meios de produção, abolição da livre iniciativa econômica e excesso de centralização) põem em perigo um valor que para ele é essencial: a liberdade.

Há valores que jamais poderiam ser postos em parêntese, sob pretexto algum. Basta olhar para a realidade política do nosso próprio país para perceber o quanto a noção de que os fins justificam os meios pode ser maléfica. Não creio que ainda haja dúvidas quanto ao fato de o Partido dos Trabalhadores ter tomado de assalto o Estado brasileiro, mas trata-se, como diria Luiz Felipe Pondé, de uma corrupção ideologicamente justificada. Mesmo cientes da máquina de corrupção que se tornou esse partido, muitos justificam a falta de ética nos meios por acreditarem que há honestidade nos fins. Não há. E, se houvesse, a roubalheira também não se justificaria.

Democracia socialista é contradictio in adjecto porque, diferentemente do socialismo, a democracia não possui um fim fora de si mesma em nome do qual possa relativizar seus fundamentos. A finalidade da democracia é justamente assegurar determinados fundamentos. Ela não pode abrir mão da justiça em nome de uma causa qualquer porque sua finalidade é justamente garantir a justiça. A democracia não reparte as demandas de uma população com se houvesse entre as pessoas uma distinção de cor, de credo ou de classe social; a democracia não consiste em delegar poderes, mas em limitá-lo. É nessa limitação que consiste a sua eficácia e é nessa posição equilibrada que consiste a sua justiça. Portanto, o maior desafio da democracia não é cravejar de pérolas a casa dos pobres ou melar de lama a casa dos ricos, mas sim fornecer a todos os cidadãos a capacidade plena de exercício de seu livre-arbítrio, de uma consciência moderna, de uma razão emancipada.

Sobre o autor
Catarina Rochamonte
Doutoranda em Filosofia pela UFSCar
Catarina Rochamonte é graduada em Filosofia pela UECE (Universidade Estadual do Ceará), mestre em Filosofia pela UFRN (Universidade Federal do Rio Grande do Norte), doutoranda em Filosofia pela UFSCar (Universidade Federal de São Carlos); é escritora e jornalista independente.

Matéria extraída do website do Instituto Liberal

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