Raízes
contaminadas
“Nada é mais difícil e cansativo do que tentar
demonstrar o óbvio.”
(NELSON RODRIGUES)
Para
saber por que o Brasil tem dificuldade para se desenvolver é preciso ir até o
seu nascimento. Descoberto pelos portugueses o Brasil herdou o padrão ibérico e
absorveu uma cultura de intervencionismo e paternalismo estatal, o que gerou um
ambiente de privilégios, desprezo pela educação, protecionismo e resistência à
iniciativa privada e ao lucro. O padrão trazido para os brasileiros não
produzia uma economia dinâmica só possível pela operosidade dos indivíduos e
pela empresa privada. Portanto, a herança cultural e ainda prevalecente é
esperar tudo do Estado, um meio de ganhar dinheiro fácil sem esforço.
Generosidades mil, boa aposentadoria sem correspondência nas contribuições,
emprego que não obriga ou quase não obriga trabalho. Mesmo com esse organismo
defeituoso no nascimento, o Brasil junto com outros países da América Latina,
até o século XVIII eram mais ricos que a América do Norte, situação que começou
a se inverter próximo ao início do século XIX, quando se fez presente o
investimento privado, o conhecimento advindo da educação e do incentivo à
inovação, o que promoveu ganhos permanentes de produtividade. Esse cenário foi
beneficiado dos direitos de propriedade e do respeito aos contratos, e do
incentivo ao desenvolvimento advindo de instituições. A pequena propriedade
nascente gerou uma ampla classe média. Uma nova célula de classe social de
capitalistas, comerciantes e industriais se tornou naturalmente defesa da
interferência prejudicial da contundente força daqueles que tinham o poder nas
mãos, e que se opunham às mudanças institucionais, ao desenvolvimento e à
inovação.
Enquanto
a América do Norte crescia e se tornava uma poderosa nação, o Brasil
engatinhava e era contido por um modelo de cultura incompatível com a adoção de
uma economia dinâmica. Quem nasce com uma estrutura óssea defeituosa tem
dificuldade de movimentos e o reparo é dolorido e causa muito sofrimento. A
legislação trabalhista brasileira se origina desse Brasil estruturalmente
defeituoso, daí sua inspiração fascista adotado por Getúlio Vargas simpático a
supressão da autonomia dos estados e a substituição da democracia
representativa por um sistema de governo autoritário e centralizado, modelo que
persiste até os nossos dias. Vargas extinguiu os partidos e a imprensa passou a
sofrer censura. Para impor sua vontade e sua política trabalhista fascista,
Vargas contou com uma forte máquina de propaganda, o Departamento de Imprensa e
Propaganda (DIP), em 1939, como instrumento de difundir as ideias do ditador. O
DIP construiu a imagem de Getúlio e o culto à sua personalidade e teve também
forte atuação junto a todos os meios de comunicação, sobretudo o rádio e a
imprensa escrita, não o fazendo nas emissoras de televisão porque ainda não
existiam. Também incentivava e controlava, através da censura, as atividades
culturais. Portanto, as leis trabalhistas foram criadas num Brasil com uma
história de intervencionismo, de desprezo pela educação, de paternalismo
estatal e de concepção fascista. Não poderia dar outra coisa senão uma
aberração que entre outras vem impedindo que o Brasil tenha uma economia
vibrante e sustentada pela operosidade de indivíduos e pela empresa privada.
Impedimento que é sustentado com vigor pela Justiça do Trabalho através de seus
juízes que são conscientizados a obstaculizar a iniciativa privada e destruir
empresas, células responsáveis pelo desenvolvimento e emprego, o que exprime um
verdadeiro cabo de guerra, onde de um lado está o governo e leis
anti-desenvolvimentista como a legislação trabalhista e de outro lado à
iniciativa privada e as empresas; forças antagônicas cujo resultado final é o
empate, ou seja, sem vencedor e sem desenvolvimento.
Segundo
a Organização Internacional do Trabalho, a instituição de regulação e proteção
do contrato de trabalho no Brasil e EUA são as seguintes: salário mínimo (os
dois países); descanso semanal remunerado (Brasil); remuneração dos dias de
feriados (Brasil); jornada da semana de trabalho (os dois); hora extra –
pagamento adicional (Brasil); restrição ao trabalho aos domingos (Brasil);
férias (Brasil); negociação coletiva (os dois); organização e representação
coletiva (os dois); organização no local de trabalho (nenhum); indenização por
demissão sem justa causa (Brasil); restrição à remuneração sem justa causa
(nenhum); restrição à remuneração diferenciada segundo sexo (Brasil);
previdência social mínima (os dois); atendimento à saúde pública (Brasil);
licença maternidade (Brasil); proteção às condições de saúde do trabalho
(Brasil). O direito do trabalho nos Estados Unidos da América é informado por
insumos históricos que variam de acordo com o ascetismo calvinista, com o
liberalismo clássico e com o individualismo que marca o ambiente capitalista. O
pensamento jurídico liberal determinou a concepção de formalismo legalista
hostil a qualquer tentativa reformista de sabor mais socialista. O protótipo do
self man, do homem que triunfa pelo próprio esforço, definindo o individualismo
de cada um para si, insinuou suposta imprestabilidade do sindicalismo,
inicialmente identificado como covil de conspiradores. A regulação das relações
trabalhistas é mínima, principalmente em comparação com outros países
historicamente marcados pelo intervencionismo, como Brasil e México. Não há um
código ou uma consolidação de normas trabalhistas. O contrato de trabalho
implementa-se informalmente mediante vontade das partes. Patrões e empregados
são relativamente livres para pactuarem. Existe fé nas relações de mercado. Como
se nota, os Estados Unidos da América tem uma relação trabalhista inteligente e
simples, e certamente melhor que a do Brasil, o que demonstra a diferença
enorme de uma país para outro refletido no desenvolvimento, na renda per
capita, na qualidade de vida e em outros aspectos econômicos, sociais e
institucionais.
Segundo
Giambiagi, elites políticas, sindicais, empresariais e intelectuais se aferram
a ideias sem correspondência na realidade brasileira. Por isso, é difícil atacar
privilégios e remover barreiras à ampliação do potencial de crescimento. Temas
como o aumento do salário mínimo, os privilégios da Previdência, a rigidez
anacrônica da legislação trabalhista, as demandas por protecionismo e juros
camaradas fluem com estrema competência, provando a improcedência de certos
raciocínios.
O
Brasil como construído criou uma nova classe de escravos, os empresários e as
pessoas que optaram por qualquer atividade autônoma, o individualismo que fez
dos Estados Unidos uma potência, e que no Brasil é combatido. Os grilhões da
escravidão são os impostos extorsivos, a legislação trabalhista e sua operadora
a justiça do trabalho, os burocratas carrascos do poder vampírico, e mais
recentemente os tribunais de justiça que se rendeu ao todo poderoso executivo.
Nesse cenário atípico de uma democracia e de uma república, viceja a corrupção
em todos os cantos do país, assim como atividades criminosas, algumas delas
mantidos pelo governo para manter afastados os brasileiros sensatos e saturados
de conviver com a ignorância, com a podridão e com a malversação do dinheiro
público.
Há
uma grande hipocrisia no Brasil, por diversas razões, com destaque para a
covardia e a omissão, e os chamados “direitos trabalhistas” com base na ideia
generosa de que é uma forma de assentar as bases de uma sociedade civilizada,
com reconhecimento ao trabalho digno, direitos considerados “sagrados”, do que
tem se aproveitado juízes, advogados e trabalhadores, uma confraria a serviço
da destruição do país.
Armando Soares – economista
e-mail: teixeira.soares@uol.com.br
Soares é articulista de LIBERTATUM
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