terça-feira, 12 de abril de 2011

Juízes e Médicos em greve? Que história é esta?

Por Klauber Cristofen Pires

Eu costumo dizer que o Brasil é um país em promoção inversa: aqui você paga 2 e leva 1. No caso dos planos de saúde, não raro, você paga três por um: paga os impostos que financiam o SUS, paga o plano de saúde particular, e enfim, paga a complementação que o médico exige para lhe atender.

Nestas últimas semanas os brasileiros se depararam com dois fatos que em uma sociedade boa da cabeça haveria de gerar uma grande indignação: dois movimentos grevistas estão em vias de ocorrer, tendo já acontecido algumas paralisações parciais de aviso: o de juízes de direito e o dos médicos contra os planos de saúde. 

Orienta a doutrina do direito trabalhista tradicional que o direito de greve se constitui em um instrumento de defesa dos interesses do trabalhador, garantida a ele pela lei pelo fato de este se constituir em uma espécie de cidadão "hiposuficiente", isto é, em alguém que carece de força de barganha na relação com seu empregador. Não vou discutir a validade desta assertiva aqui, mas tomá-la a priori como certa, para o fim a que me proponho: indagar se juízes, como representantes políticos do Poder Judiciário e os médicos, como profissionais liberais, preenchem a condição de trabalhadores assalariados hiposuficientes.

Do brilhante ensino do renomado jurista administrativista Hely Lopes Meirelles, os juízes de direito não são nem sequer funcionários públicos. Sua relação não é a de trabalho ou emprego. Não recebem salário, mas subsídio. Os juízes se comparam aos vereadores, deputados e senadores no Poder Legislativo e aos prefeitos, governadores e presidente no Poder Executivo. Juízes são titulares do Poder Judiciário e a natureza da atividade que exercem é a de um múnus público, isto é, uma espécie de sacedócio, por eles voluntariamente escolhido. A notícia de que juízes pretendem realizar paralisações concretiza um ato inequívoco de lesa-pátria. Só fazendo uma justa comparação, desde há pelo menos três décadas seguidas os militares têm sido fustigados por sucessivos governos revanchistas sem que um só dia algum comandante tenha se subtraído à disciplina e ao senso de dever. Há um tempo atrás visitei um coronel que era comandante de uma unidade militar e constatei, tristemente, que seu automóvel particular era um velho "Monza", certamente um veículo com mais de quinze anos de uso.  

Por sua vez, os médicos não são empregados dos planos de saúde. Médicos são profissionais liberais, e a relação que têm com os planos de saúde é a de parceria, estabelecida por instrumento contratual. Portanto, a recusa em atender ou a exigência de complementos dos seus honorários representa grave quebra de contrato, e crime de estelionato contra o paciente, que deve sim buscar na Justiça os seus direitos, acusando tanto o médico quanto o plano de saúde como co-responsáveis solidários. Entendo ser válida a negativa em renovar o contrato com este ou aquele plano de saúde, ou até mesmo com todos, se for o caso.

A opção preferencial pelo uso da greve por estas categorias estranhas à dos trabalhadores celetistas assalariados reflete ou um costume arraigado a traduzir uma certa postura interior de operário-vítimado-pela exploração-desse-sistema-capitalista-que-está-aí, ou então que os trabalhadores assalariados não são tão hipsuficientes assim, a ponto de provocarem a inveja de categorias que em teoria lhes estariam bem acima na escala social. Tertium non datur.  

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