A cada dia, mais e mais as pessoas, atordoadas, vão procurando se adaptar ao inferno da multiplicidade de leis e, principalmente, de regulamentos de origem administrativa que se adicionam ao sistema jurídico mais que diariamente, senão em processo permanente.
É tanta a loucura que nem sequer uma norma é assimilada pelos juristas, contadores, e sejam lá quais os profissionais envolvidos, já outras podem lhe seguir sem que a anterior tivesse o mínimo tempo de ser cumprida. E o pior: totalmente despida de r-e-p-r-e-s-e-n-t-a-t-i-v-i-d-a-d-e!
Representatividade. Eis a palavra: representatividade. Decore-a como a um mantra, até cair em si do que estou falando.
Certa vez, em um curso de especialização em Direito Tributário, recebi como incumbência escrever uma monografia para tratar sobre a resistência do brasileiro em pagar impostos. Ora, ora, francamente, não me senti obrigado a realizar um extenso trabalho de pesquisa: para mim a resposta soava tão clara quanto hoje: a razão de o brasileiro ter aversão a pagar impostos reside no fato de que ele não concordou expontaneamente com isto. Em outras palavras, não houve representatividade nas leis que nos impuseram uma carga tributária de aproximadamente 35%!
Não estranhe o leitor que eu tenha recebido como prêmio apenas um "regular" pelas minhas poucas, honestas e objetivas considerações acadêmicas; pois digo com muita honra que até hoje é daquela nota que mais me orgulho, apesar de muitos "excelentes e ótimos" conquistados ao longo do curso, se levar em conta que o professor se confessava um fã de Alberto Dines e que entendia ser a nossa carga tributária longe de ser alta, quando comparada com a excelência do modelo socialista escandinavo.
Doutra feita, em palestra, outro interlocutor defendeu o nosso sistema tributário com base no argumento de que, sendo o nosso país grande e complexo, também o conjunto das normas tributárias deveria o ser. Em que uma coisa leva à outra é algo que ainda precisam me explicar.
Em seu livro The American Story, o historiador Garet Garret nos explica como nasceram as diversas agências e comissões de regulamentação, praticamente todas elas resultantes da aplicação da política do New Deal, idealizada e tenazmente defendida por um dos maiores fariseus da Terra, chamado Franklin Delano Roosevelt. Assim se expressa o autor, com a minha livre tradução (fls. 281-282):
"Em todas estas leis do New Deal havia uma violação da liberdade individual.
(...)
Para dar eficácia a estas leis foi necessário criar novas agências de governo. Cada nova agência emitia suas próprias normas e regulamentos, com força de lei; e em pouco tempo estas agências administrativas passavam dez vezes mais leis do que o Congresso, todas elas vinculando o povo.
Então a autoridade burocrática desenvolveu-se e tornou-se não apenas agressiva, mas indispensável - indispensável, ou seja, para que o governo pudesse intervir em cada espécie da atividade humana.
(...)
E não apenas a agência administrativa fazia suas próprias leis, isto é, normas e regulamentos com força material de lei, mas também quando ela vinha a aplicá-las agia simultaneamente como o promotor, o júri e o juiz, todas as três funções de uma só vez, e os apelos de suas decisões às cortes regulares, por questões técnicas, custosas e difíceis."
Pouco antes daquele tempo, os Estados Unidos viviam um esfervescente progresso material e tecnológico, com um aumento do padrão de vida jamais imaginado por qualquer pessoa do mundo, mesmo contado os reis e imperadores. O New Deal representou um período de grande estagnação econômica para os americanos, tendo em muito arrastado os índices lamentáveis de desemprego e inflação, a ponto de a Europa ter ultrapassado aquela grande nação.
De lá para cá, por tamanha que seja a diferença tecnológica, praticamente pouco se diferenciaria em complexidade. Estamos falando de um país que contava com extensas malhas ferroviárias privadas, com uma Marinha Mercante pujante e muitas outras grandes companhias que produziam em larga escala e experimentavam sequenciais incrementos tecnológicos e de gestão que proporcionavam constantes reduções de custos e preços para a população. Naqueles tempos, os cidadãos viviam em paz e a nação vivia em plena ordem.
A vinda a lume do golpe da legislação administrativa como forma de concentração de poder ganhou asas e veio parar em dezenas de outras nações, algumas delas com solo muito bem preparado para tais práticas, como é o caso do Brasil.
Eis, portanto, a ratificar o que tenho dito, o depoimento de um ilustre historiador americano. Claro que, a exemplo dos Estados Unidos, o Brasil é uma sociedade grande e multicultural e por isto, complexa. Porém, complexidade não é sinônimo de complicação, que é o que ocorre com o nosso sistema tributário, e por extensão, todo o sistema jurídico, de tal forma que constantemente somos obrigados até mesmo a cumprir com obrigações contraditórias, devido ao fato de vários órgãos e autarquias disputarem espaçõs e atribuições entre si.
Da lavra do autor acima citado, fica claro como o New Deal, como proposta de uma sociedade de economia planejada, jamais logrou obter os êxitos pretendidos, sendo estes paulatinamente aceitos pelos burocratas como irrealizáveis e assim mesmo embrulhados e vendidos à população como índices com os quais ela teria de doravante conviver para sempre: desemprego, inflação, déficit público, taxa de juros e todas aquelas variáveis que costumamos ouvir diariamente nos telejornais.
Conclui Garrett, pois, segundo as seguintes palavras:
"Aquilo significaria, talvez, um contínuo e ilimitado déficit no gasto público pelo governo, não como um assunto de emergência, mas como matéria de uma estabelecida política pública. Isto também significaria um aumento progressivo da dívida pública nacional" (...) Isto (o New Deal) jamais resgatou o emprego. Isto (idem) jamais restituiu a renda nacional."
Por fim, reitero aqui o que não somente o brilhante intelectual que trago ao conhecimento do leitor disse, mas também outros, como fiz antes, tais como Dominick Armentano e Mary Bennett Peterson: as agências reguladoras (refiro-me aqui em sentido amplo, a toda sorte de órgãos e autarquias) somente têm servido ao propósito para o qual foram criadas: em primeiro lugar, prover aos governantes a concentração de poder por meio da emissão de leis sem representatividade política, e em seguida, proteger os que lhes dão suporte, abrigando-os contra os rigores da concorrência e das responsabilidades contratuais. Por isto merecem de todos nós todo o repúdio que pudermos lhes contrapor.
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