segunda-feira, 16 de junho de 2014

Copa do Mundo prova que a doença do Brasil é o futebol

Torcer para a Seleção Brasileira diante de uma Copa do Mundo que dilapida o País é como comprar droga na boca de fumo da esquina e fazer de conta que esse ato não financia o tráfico

Lula e Dilma Rousseff: petistas não podem ser culpados sozinhos pelo prejuízo que a Copa está dando ao País | Foto: Cristiano Mariz
Lula e Dilma Rousseff: petistas não podem ser culpados sozinhos pelo prejuízo que a Copa está dando ao País | Foto: Cristiano Mariz
José Maria e Silva

Se entre os pavões é o macho quem se embeleza para o cio, desfraldando a enorme cauda iridescente, que só tem função sexual, entre os homens é a mulher quem se transforma em obra de arte, esculpida por entre roupas e acessórios que são a sua se­gun­da pele. E, emoldurado por ca­be­los lisos ou crespos, dóceis ou in­domáveis, o rosto da mulher tende a ser uma aquarela humana, em que o batom alarga as fronteiras do sorriso, o rímel sensualiza o bailado dos cílios, a sombra acentua a profundidade do olhar, compondo uma espécie de segunda alma. Mais do que enfeite do corpo, a maquiagem é uma máscara do espírito, que paradoxalmente revela a própria mulher e contribui para modelar toda a sociedade, ao transmutar a incompletude de cada ser-em-si no idealismo social do ser-com-os-outros.
A cada vez que se põe diante de um espelho, a mulher, mesmo sem o saber, atualiza Heidegger. Ao recriar-se nas vestes, na maquiagem ou num sorriso que é mais reflexo do que expressão, ela esgarça as fronteiras entre a essência e a aparência e abala a objetividade das coisas, instaurando a matriz de todos os conflitos, que nada mais é do que o incontornável desequilíbrio entre vontade e representação, as duas dimensões constituintes do mundo, como sabia o pessimista Scho­pe­nhauer. Por isso, a arte da maquiagem – que transforma a mulher em deusa e a torna capaz de mudar o mundo – poderia até ser reivindicada pelas mulheres como disciplina obrigatória nas escolas; e os desfiles de moda, as revistas de fofoca e os folhetins de televisão, que captam com mestria esse mundo feminino, também poderiam ser subsidiados pelo Estado. Pois não há dúvida de que compreender a cultura cosmética da mulher é mais essencial para compreender a vida do que torcer para um time de futebol.
Afinal, esse mundo que conhecemos não é aquele que Deus concluiu no sexto dia e, sim, o que foi recriado à imagem e semelhança de Eva, desde que ela, desobedecendo ao Criador e comendo o fruto da Árvore da Vida, ofereceu um pedaço a Adão e abriu seus olhos para o conhecimento do Bem e do Mal, transformando-o de mero autômato feito de barro num verdadeiro homem de carne, osso e emoções. Nesse mundo recriado pela mulher não existem fatos – o que há são fenômenos, que dependem de um observador. Foi o que Hume percebeu ao afirmar que o sol nunca esquenta a pedra. Sol é sol, pedra é pedra, e não há relação entre eles. É o observador quem diz que o sol esquentou a pedra, isso porque dispõe de conceitos prévios de causa e efeito, calor e frio, esquentar e esfriar, podendo, com eles, estabelecer uma relação que o sol não tem com a pedra.
Beleza se põe na mesa, sim!
Em outras palavras, o mundo não é feito de fatos, mas de subjetividades. Basta pensar que cada um de nós é um átimo de presente concreto, factual, e um cosmos quase infinito de memória, esperança e desejo, em que vivos e mortos, lembranças e anseios, embaralham passado e futuro para compor um universo único, que habita exclusivamente nossa cabeça e é intraduzível em linguagem e gestos. As mulheres tendem a vivenciar com mais ênfase do que os homens esse mundo subjetivo, tanto que apreciam as minúcias das paixões intrincadas e se deleitam com folhetins lacrimosos, ainda que possam existir uma Agatha Christie cerebral e um Marcel Proust sensível para mostrar que as diferenças entre homens e mulheres existem, mas não são necessariamente estanques.
Até um simples esmalte, que para o olhar do homem é vermelho ou rosa, escuro ou claro, no imaginário feminino se torna uma nuance da alma, com nomes que nada têm a ver com cores, mas com sentimentos e sonhos. E onde o homem vê um cinza indefinido, a mulher vê um “plano perfeito”, e onde ele vê rosa, ela vê um “truque de mágica”. As empresas fabricantes de esmalte apostam no apego feminino aos detalhes e sabem que muitas de suas clientes são capazes de perceber essas nuances, chamando-as por esses nomes de ficção que vão muito além das cores físicas. É que as mulheres, pobres ou ricas, anônimas ou célebres, dão imenso valor à beleza e, seja como sinônimo de ostentação, seja como tradução de harmonia, dedicam grande parte do seu tempo a sonhar com ela ou a cultivá-la. Além de ser a essência das artes, a beleza é o insumo de uma indústria, sobretudo feminina, que movimenta só no Brasil – o terceiro mercado mundial – quase 60 bilhões de reais por ano. Sem contar o mercado de cirurgias estéticas, também predominantemente feminino, que não está contabilizado nesse número.
Só esse fato já daria às mulheres o direito de subverter o provérbio e bradar – beleza se põe na mesa, sim! Entretanto, não é o que se vê. Se uma parlamentar ocupasse a tribuna do Congresso Nacional para falar de sua experiência de vida nos salões de beleza ou das tramas de novela que tanto influenciam o País, do mesmo modo que os políticos homens falam em público sobre times e escalações, sem dúvida ela seria considerada fútil e perderia o respeito de seus pares. Até a presidente Dilma Rousseff – com sua truculência nada feminina – deve gastar horas com as esteticistas do Planalto, muito mais do que Lula, Fernan­do Henrique ou qualquer outro presidente (com exceção talvez de Fernando Collor) gastaram juntos em todos os seus mandato. Entretanto, mulher nenhuma tenta transformar em debate público sua vaidade pessoal. Já o homem, quaisquer que sejam os seus vícios privados, tende a transformá-los em políticas públicas, impondo-os ao mundo como essência da vida humana.
Vícios masculinos viram leis
No tempo em que a aristocracia comandava a Europa, a cruel e fútil caça aos animais era o esporte predileto de reis e nobres, que não mediam as consequências desse prazer pessoal tipicamente masculino. Segundo o historiador Hugh Bro­gan, biógrafo de Alexis de Tocque­ville, os Tocquevilles “tinham o direito exclusivo de caçar e invadir as plantações dos camponeses no encalço de suas presas” e o conde Bernard Tocqueville (1730-1776), avô do biografado, ainda mantinha 3 mil pombos nas torres de sua propriedade, que devastavam as plantações dos plebeus. Em todas as épocas, os homens sempre transformaram em questões de estado seus vícios e prazeres pessoais e não faltaram intelectuais para transformar suas fraquezas em explicações filosóficas da vida, como Hemingway fazia com as touradas e Cortázar fazia com o boxe. Eu já prefiro Schopenhauer, que detestava os nobres de seu tempo por não falarem de outra coisa senão de corrida de cavalo – da mesma forma que os nobres do nosso tempo, dando mau exemplo aos plebeus do Bolsa-Família, não se cansam de falar de futebol e Copa do Mundo.
Um exemplo é o livro “A Bola Corre Mais Que os Homens” (E­di­to­ra Rocco, 2006), do conceituado an­tropólogo Roberto DaMat­ta, que continua escrevendo sobre a Copa deste ano. Esse livro reúne alguns dos textos mais idiotas da história da língua portuguesa desde que ela foi oficialmente inaugurada pela “Cantiga da Ribeirinha”, de Paio Soares de Taveirós, no final do século XII. O livro começa com 26 crônicas publicadas no “Jornal da Tar­de” (já extinto), entre 13 de junho e 15 de julho de 1994, durante a realização da Copa do Mundo dos Es­ta­dos Unidos – também usada, como to­das as outras, pelo governante de plantão, no caso o então presidente Ita­mar Franco e seu ministro da Fazenda, Fernando Henrique Car­do­so, que, juntos, perdoaram o mi­li­onário contrabando praticado pelos jogadores da Seleção Brasileira, liderados por Romário, hoje deputado, ao mesmo tempo em que, na divisa com o Paraguai, pobres sacoleiras, buscando ganhar o pão dos filhos, eram perseguidas como criminosas pela Polícia Federal.
A frase que dá título ao livro de Roberto DaMatta – “a bola cor­re mais que os homens” – foi ou­vida a um comerciante amigo de seu pai, quando o autor ainda era criança, e impressionou tanto o antropólogo que é repetida, co­mo um mantra, em praticamente to­das as crônicas do livro, chegando a se tornar enjoativa. “O título des­te livro vem desta frase emble­má­tica, definidora do futebol e, por extensão, da própria vida”, escreve DaMatta, sem conseguir explicar porque essa frase equivale a uma sentença filosófica tão abrangente, capaz de dispensar a filosofia de um Aristóteles. E não é por falta de esforço: a cada crônica o autor insere a frase, geralmente à guisa de conclusão, muitas vezes forçando a barra para que ela dialogue com as ideias e fatos expostos antes.
Imagens grosseiramente machistas
Seleções do Brasil e da Croácia jogam na abertura da Copa do Mundo: competição vai quebrar o País | Foto: Jefferson Bernardes/VIPCOMM
Seleções do Brasil e da Croácia jogam na abertura da Copa do Mundo: competição vai quebrar o País | Foto: Jefferson Bernardes/VIPCOMM
Já na primeira crônica, da safra de 1994, Roberto DaMatta escreve: “Tenho 57 anos, mas nas Co­pas do Mundo, volto a ser o me­ni­no de 14 anos que, em 1950, foi ao Maracanã ver uma vitória es­ma­gadora do moreno time brasileiro sobre uma então vermelha Iu­goslávia”. De fato, o festejado an­tropólogo de Harvard volta a ser um menino de 14 anos ao fa­lar de futebol – não afetivamente, mas mentalmente. Depois de afirmar que, naquela tarde, testemunhou a “superioridade” e viveu “a vitória, o respeito pelas regras e o papel da generosidade”, ele conta como se materializaram nele esses sentimentos: “Ficou no meu coração a cara de um popular que torcia como um desesperado, incentivando o Brasil com os mais ca­be­ludos e embaraçantes palavrões. O povo xingava e o Brasil goleava”.
E a partir dessa cena, o antropólogo de Harvard e professor da PUC-Rio escreve: “Ali tive a primeira intuição do Brasil vencedor. Um Brasil que não era feito de ‘raças in­fe­riores’, mas que ‘comia a bola’. Bra­sil construído a palavrões que abria para si mesmo as portas da ex­celência”. De fato, esse “Brasil construído a palavrões” nos campos de fu­tebol abriu as portas da excelência na arte de chutar bola, rebolar no funk, prostituir-se no exterior e bajular os estrangeiros que aqui aportam, mas continua no quarto de despejo da civilização, com uma educação completamente falida e um capitalismo de Estado insustentável, em que trabalhadores sem preparo e empresários sem escrúpulos disputam com os políticos corruptos a primazia na arte de destruir cotidianamente o País.
Em seguida, Roberto DaMatta convoca Machado de Assis, Prosper Mérimée, Georges Bizet e Nelson Rodrigues para compor uma oligofrênica ode à bola, em que a compara a uma “Capitu moderna”, de “movimentos indecifráveis”, e a uma Carmen “que nos deixa loucos de ciúmes”, para afirmar que ela representa “o sal da vida” e concluir, como em todas as crônicas, que ela “corre mais que os homens”. Até a trave merece uma reflexão do antropólogo, sendo chamada de “sentinela simbólica a segregar irremediavelmente o certo e o errado, o previsível do inexprimível”. Em sua inepta tentativa de transformar o futebol em elevação poética e reflexão filosófica, DaMatta, para usar uma expressão digna desse universo, compõe um verdadeiro “samba do crioulo doido”, ao dizer: “Essa trave que é, como as linhas de área, o fosso do castelo, a ilha da fantasia, a fumaça do cigarro, o perfume da mulher desejada. Fugaz, mas concreto a ponto de eventualmente impedir o orgasmo do gol”. O livro é todo assim, com imagens grosseiramente machistas, sem que o antropólogo se dê conta de que o mundo do futebol é irremediavelmente masculino e não traduz toda a humanidade, mas somente uma ínfima parte dela.
Afinal, nem mesmo todos os homens gostam das lides guerreiras que o futebol imita e muitos preferem a afetiva convivência com mulheres e crianças, em que a competição e a conquista devem ceder lugar à cooperação e à renúncia. A despeito de infindáveis tentativas de governos e cartolas para levar as mulheres aos estádios, o interesse delas por futebol, com as exceções de sempre, continua sendo superficial. A maioria torce para fazer companhia ao homem, que, por natureza, tende a impor seus vícios privados no lar e no espaço público. Prova disso é que os clubes de futebol aprenderam com a Fórmula 1 (outro esporte essencialmente masculino) e cada um deles tem um plantel de bumbuns femininos para exibir ao público – algo que também ocorre nesta Copa do Mundo, que já elegeu as “Belas da Copa”, sempre expostas em trajes sumários, para gáudio do público masculino, para quem o futebol foi feito.
Filosofice intelectual sobre futebol
Mas nem só de machismo se faz o livro de Roberto DaMatta sobre futebol – como costuma ocorrer com quase toda a filosofice intelectual sobre esse esporte, a dele também se compõe de preconceito de classe e de raça. DaMatta afirma que os norte-americanos “não têm nenhuma ideia” do que é o futebol para os brasileiros: “Sem terem paixão pelo ‘futibol’ (que para nós é um jogo), para eles o futebol é apenas mais um esporte no qual 22 jogadores correm atrás de uma bola. Bola que, diferentemente da deles, não é um ovo que ao ser lançado transforma-se em bala, mas é realmente uma intrigante e incerta esfera. Uma bola a ser irracionalmente controlada e movimentada com os pés. Esses pés que falam de pernas, quadris e de outras partes situadas abaixo da cintura, esse quadrante abominado pela cultura burguesa em geral e pelo puritanismo americano em particular”. Ou seja, a se crer nessa concepção mesquinha de DaMatta, os pretos José Maurício Nunes Garcia e Lima Barreto estavam proibidos de ser, respectivamente, compositor erudito e escritor – tinham de abdicar do cérebro e gingar a cintura em alguma gafieira ou campinho de pelada.
Além de outras curtas crônicas sobre futebol, especialmente sobre Copa do Mundo, o livro de Roberto DaMatta traz ainda três ensaios, em que o autor mobiliza as disciplinas acadêmicas de sua formação, como a sociologia e a antropologia, para dar ao futebol um tratamento científico que complementa o tratamento poético (e põe má poesia nisso) que lhe fora dado pelo autor nas leves crônicas de jornal. Já no primeiro ensaio, após resumir a origem elitista do futebol, importado da Inglaterra no final do século XIX pela elite carioca, Roberto DaMatta afirma: “Foi certamente essa humilde atividade, esse jogo inventado para divertir e disciplinar que, no Brasil, transformou-se (sem querer ou saber) no primeiro e provavelmente no seu mais contundente professor de democracia e de igualdade”.
Em sua ensandecida idealização do futebol, DaMatta prossegue: “Não foi então através da escola, do jornal, da literatura ou do Parlamento e de algum partido político que o povo começou a aprender a praticar a igualdade e a respeitar as leis, mas assistindo a jogos de futebol. Esses eventos onde o vitorioso não tem o direito de ser um déspota, e o perdedor, vale repetir, não pode ser humilhado”. Deve ser por isso, por ter sido educado nos campinhos de pelada e não nas escolas e bibliotecas, como acredita DaMatta, que o povo brasileiro é realmente muito respeitador das leis e jamais ultrapassa um sinal vermelho, jamais corrompe o guarda, jamais burla a lista de espera de um hospital e, sem dúvida, tem os políticos e empresários mais honestos do mundo, que jamais retiram para o seu bolso privado um só centavo do erário.
Delírio acadêmico sobre o corpo
É inacreditável como os intelectuais brasileiros escrevem coisas tão absurdas, tão contrárias aos fatos, e, mesmo assim, continuam pontificando na imprensa e na academia, exibindo seus vistosos diplomas conquistados no ex­terior, como é o caso do próprio Ro­berto DaMatta, doutor em An­tropologia Social pela Univer­si­da­de de Harvard, nos Estados U­ni­dos, e professor titular da PUC-Rio, além de professor visitante de várias universidades estrangeiras, com dezenas de livros publicados, muitos dos quais são de leitura obrigatória nas universidades, a exemplo da obra “A Casa & A Rua”, lançada em 1985 pela Edi­to­­ra Brasiliense. A visão de Da­Mat­ta sobre o futebol é um verdadeiro delírio acadêmico, que deveria envergonhar o autor em seus momentos de lucidez. Infeliz­men­te, a completa cegueira de Ro­ber­to DaMatta em relação ao futebol e à sociedade brasileira está longe de ser inédita e contamina dezenas de outros renomados intelectuais, que também enaltecem o cor­po em detrimento da razão e fa­zem disso uma bandeira do Brasil.
Antropólogo Roberto da DaMata: nem mesmo a elite intelectual brasileira consegue agir com o cérebro | Oscar Cabral
Antropólogo Roberto da DaMata: nem mesmo a elite intelectual brasileira consegue agir com o cérebro | Foto: Oscar Cabral
Em seu complexo de intelectual terceiro-mundista que elege como interlocutor um imaginário Tio Sam, Roberto DaMatta esquece que não é a “cultura burguesa” nem o “puritanismo americano” quem abomina o quadrante do corpo situado abaixo da cintura – é a própria natureza humana que, mesmo sem abominar o corpo, como ele diz, o hierarquiza em cabeça, tronco e membros, situando a razão acima dos instintos, ou não seríamos humanos, mas animais brutos. Esse culto de muitos intelectuais à cultura do baixo-ventre, representada por futebol, carnaval e, agora, pelo funk, é um misto de deslumbramento e hipocrisia. Não foi com “pernas, quadris e outras partes situadas abaixo da cintura” que Roberto DaMatta, um carioca filhinho de papai, se tornou doutor em Antropologia Social nos Estados Unidos – ainda que seus artigos sobre futebol, inclusive sobre a Copa atual, não pareçam escritos com o cérebro, mas com os pés.
A Copa do Mundo de 2014 é, sem dúvida, a maior de todas as Copas – no gasto faraônico de recursos públicos, com todo o lucro para a Fifa, e num prejuízo incomensurável para o País. O povo morre nas filas dos hospitais, morre no trânsito mais violento do mundo e morre nas mãos de bandidos impunes, protegidos por leis hediondas, que penalizam o cidadão de bem. Oficialmente, os assassinatos anuais ultrapassavam 50 mil. Mas como há milhares de desaparecidos nas estatísticas que provavelmente foram assassinados de fato, o número de homicídios vai além dos 60 mil por ano.
E não há perspectiva de mudança, a não ser para pior, pois as escolas, responsáveis pelo futuro, estão cada vez mais bárbaras e, em lugar de português e matemática, ensinam funk. E, para completar esse quadro dantesco, a inflação já bate à porta, catapultada pelos gastos com a Copa, que vai quebrar o País. É só passarem as eleições que a nação descobrirá o rombo.
Tudo isso era mais do que previsível desde que Luiz Inácio Lula da Silva – comportando-se como o general populista Emílio Médici – entregou o Brasil à ditatura da Fifa, violando a própria Constitui­ção. Qualquer pessoa com dois neurônios fazendo sinapse no cérebro seria capaz de prever, desde aquela época, que o Estado bancaria sozinho a Copa, que todas as obras seriam superfaturadas, que os estádios virariam elefantes brancos, que a Fifa e suas parceiras multinacionais, inclusive a Rede Globo, lucrariam sozinhas com o evento, obrigando o povo, debaixo de chicote, a arcar com todo o seu lucro astronômico. Se a corrupção no Brasil não perdoa nem merenda escolar e remédio de hospital, por que, de uma hora para outra, iria perdoar faraônicas obras de engenharia, envolvendo bilhões de reais, em que é muito mais fácil e lucrativo superfaturar, desviando recursos públicos?
Futebol no Brasil sempre foi sinônimo de corrupção. Os clubes brasileiros privatizam os lucros e socializam os prejuízos – pagos por todos os contribuintes, mesmo aqueles que detestam futebol. Por isso, não adianta culpar só o governo petista pelo enorme prejuízo econômico do Brasil com a realização da Copa. Lula e Dilma não foram os primeiros nem serão os últimos a usar o futebol como circo. E, enquanto os intelectuais tratarem o futebol como religião, todos os governos, de todos os níveis de poder, vão continuar agindo assim. Qual­quer que fosse o governo de plantão, a Copa daria o mesmo prejuízo que está dando ao País. O Brasil padece mesmo é de futebol – sua verdadeira doença. Não adianta querer separar a Copa do governo: os jogadores da Seleção Brasileira não são melhores do que os políticos – são mercenários, que jogam com o bolso. Prova disso é que cada um vai receber R$ 1,1 milhão se o Brasil ganhar a Copa.
É compreensível que os simples de coração não percebam nada disso e se deixem levar pelas emoções do futebol, confundindo o País com a Seleção. Mas um intelectual tem o dever moral de agir com o cérebro, caso contrário como pode cobrar da gente simples que não haja com os instintos? Torcer para a Seleção Brasileira nesse momento é como comprar droga na boca de fumo e fazer de conta que esse ato não financia o tráfico. Que futuro tem este País se nem mesmo sua elite intelectual consegue agir com o cérebro e não coloca o dever sobre o prazer? Em quem as massas vão se espelhar se as elites também agem por instinto? Assim como as mulheres sensatas diante do leito de um filho doente muitas vezes sacrificam a vaidade pessoal, deixando de ir ao salão de beleza, também os homens, diante da nação moralmente enferma, deviam abdicar de torcer pela Seleção – único modo de ser verdadeiramente brasileiro.

Um comentário:

  1. O mesmo povo que ama, idolatra e votou no ex-presidente, paradoxalmente, ama e idolatra aquela classe de pessoas que ele jamais perdoou e apontou como culpada de todos os nossos males - a "Zelite".

    As elites distribuem-se entre os jogadores de futebol, pilotos de Fórmula 1, celebridades do meio artístico (em especial da TV), mas uma categoria se destaca, não tanto pelo glamour mas por sua alta e nefasta influência nas massas: os bem-falantes formadores de opinião.

    Não posso deixar de dar razão - muito a contragosto, fique bem claro - ao ex-presidente, quando ele afirma reiteradamente:

    "A culpa é da Zelite".

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