Pensava que os atuais chefes militares (...) responderiam por eles e seriam solidários conosco. Infelizmente, isto não aconteceu.
Por Carlos Alberto Brilhante Ustra
Concluindo a Escola de Comando e Estado-Maior do Exército, ao final de 1969, fui transferido para São Paulo.
O Boletim Interno do II Exército, de 30 de setembro de 1970, publicou a meu respeito: “A 30 Set, foi publico ter sido designado para assumir as funções de Chefe do Destacamento de Operações de Informações do CODI/II Ex, a partir de 29 Set70”. Vários outros militares também foram designados para os DOI criados.
Cumprindo a ordem recebida, nesse dia, assumi o comando daquele Destacamento e lá permaneci até 23/01/74, quando fui transferido para Brasília.
A partir do dia que passamos a trabalhar nos DOI, as nossas vidas particulares e a nossas carreiras passaram a sofrer os mais variados testes.
Grandes pressões psicológicas pesaram sobre nós e nossos familiares.
Sobre nossos ombros iriam cair imensas responsabilidades. Vidas humanas passariam a depender das nossas decisões. Até aquele momento, estávamos acostumados a viver num Exército que apenas se preparava para o combate.
Iniciava-se, para nós e nossas famílias, uma total mudança de hábitos, que só viríamos sentir com o passar dos meses.
Era uma vida desgastante, cheia de riscos, sacrifícios e de privações.
As ameaças de seqüestros de nossas esposas e filhos eram constantes.
O general Humberto de Souza Mello, durante o período em que comandou o II Exército, sempre teve um especial atenção para com todos os membros do DOI/II Ex. As suas visitas inopinadas, normalmente, ocorriam horas depois de regressarmos de alguma operação de risco. Nessas ocasiões, nosso comandante elogiava a bravura de nossos homens, impulsionando-os, cada vez mais, para o cumprimento do dever. Isso elevava o moral e o espírito de corpo.
Quando algum outro chefe militar ia oficialmente ao II Exército, a visita ao DOI constava, invariavelmente, da programação oficial.
Assim , também, acontecia nos demais DOI do país.
Para nossa felicidade, tivemos como chefe da 2ª Seção do Estado-Maior do II Exército o coronel Mário de Souza Pinto.
Era um oficial de prestígio e competente. Em Santa Maria-RS, havia comandado o Regimento Mallet, onde se destacou como um dos melhores comandantes daquela unidade militar, a mais tradicional da Artilharia.
Tivemos a ventura de tê-lo como chefe, em pleno período de combate. Tinha todas as qualidades que um subordinado espera de seu comandante: justo, amigo, eficiente, companheiro, corajoso. Era um oficial sério e correto e não admitia deslizes, corrupção e falhas de caráter.
Se alguém cometesse uma falta dessas, sua mão era bastante pesada para punir.
É, portanto, com tristeza, que vejo a esquerda revanchista, baseada em seus próprios critérios de comportamento, inventar que nossos salários eram complementados com dinheiro de empresários; que dávamos proteção e cobertura a marginais; que nos apossávamos do dinheiro e de bens das pessoas que eram presas; que no DOI estuprávamos mulheres; que introduzíamos objetos em seus órgãos sexuais; que torturávamos e prendíamos, não só crianças, como pais, irmãos e parentes de presos que nada tinham a ver com a subversão e o terrorismo. Isso, jamais aconteceu!
Seguidamente sou apontado como chefe de homens que praticaram tais atos. Eu jamais os permitiria.
Combatíamos um inimigo que não usava uniformes, que se misturava no seio da população, de onde surgia, de surpresa, para o ataque.
Nossos inimigos, hoje chamados pelo atual governo de "resistentes", sabiam que lutavam não apenas para derrotar o regime militar, mas para estabelecer um regime comunista, uma "ditadura do proletariado". Isto, hoje, está mais do que provado e tem sido repetido por historiadores que pertenceram a organizações terroristas.
Não foi sincera a presidente Dilma quando afirmou que eles lutavam pela democracia. Não é isto o que está escrito nos progranas das organizações terroristas que ela pertenceu.
Nós, por outro lado, estávamos cientes de que lutávamos pela democracia.
Depois de 4 anos de lutas, nós os vencemos e é graças à democracia que soubemos defender que eles, hoje, estão no poder, e valendo-se dele para infringir a lei, praticar a corrupção e promover a desordem, a infração impune da lei, o revanchismo e o achicalhamento dos valores morais e éticos da sociedade.
Os vencemos, lamentando cerca de 500 mortes, de ambos os lados. Se eles tivessem sido vitoriosos, haveria um banho de sangue no Brasil, à semelhança do que aconteceu nos países onde eles assumiram o poder e, hoje, estaríamos vivendo sob uma férrea ditadura comunista.
Todos nós, que combatemos a luta armada comunista, podemos bater no peito e gritar com orgulho de soldados: Missão cumprida!
Fomos elogiados por nossos chefes de então, recebemos medalhas, muitos a Medalha do Pacificador com Palma, a mais alta condecoração outorgada em tempo de paz, pelo Exército Brasileiro, fomos distinguidos com nomeações para funções de prestígio.
Passam-se os anos.
Eu já tenente-coronel, comandava o 16º Grupo de Artilharia de Campanha, em São Leopoldo, RS.
Uma noite, num jantar para comemorar o aniversário do Grupo, sentei ao lado do Comandante da 3ª Região Militar, Gen Serpa, conhecido carinhosamente como Serpa Louro, para diferenciá-lo de seu irmão, também general, que era moreno.
Disse-me ele: Coronel, estou muito preocupado com o seu futuro. O senhor, na luta contra os terroristas, ao comandar o maior DOI do Brasil, se expôs muito. O Exército tem que blindá-lo e protegê-lo.
Respondi: General, todos os combatentes dos DOI cumpriram com o seu dever, cumpriram a missão dada pelos seus chefes. Fui um dos condecorados com a Medalha do Pacificador com Palma. Sempre fomos elogiados e prestigiados pelos nossos chefes. Nunca fui chamado a atenção, nunca fui punido, nem cometi qualquer arbitrariedade. Tenho a certeza de que, se no futuro, os nossos inimigos tentarem nos atingir, o Exército ao qual servimos com tanta dedicação e com o risco, não só das nossa vidas, como a de nossas famílias, sairá em nosso favor e nos defenderá.
Ele então me disse: Coronel, o senhor é muito jovem e sem experiência. Gostaria muito que isto acontecesse, mas, tenho minhas dúvidas.
Em abril de 2006, já reformado, recebi uma Notificação do Juiz da 23ª Vara Civel de São Paulo, a respeito de acusações de tortura de Ana Maria Teles e outros. Deu-me o magistrado 15 dias para apresentar, a minha Contestação.
Como este foi o primeiro caso, onde um militar estava sendo processado por ter participado do combate ao terrorismo, pedi ao Exército uma orientação, bem como para saber o que seria feito.
A resposta do comandante do Exército, General Francisco Albuquerque, foi clara e incisiva: "O Exército não vai fazer nada". Dias depois o General chefe de Comunicação Social, em entrevista à imprensa disse "O Exército não vai se pronunciar porque o caso está sub júdice".
E assim, vi que o General Serpa tinha razão.
Sempre tive a certeza de que, mesmo passados 40 anos, e tendo mudado as circunstâncias políticas, o Exército assumiria, publicamente, o seu envolvimento e a sua responsabilidade no combate ao terrorismo. Que não se omitiria e assumiria que nós como membros de uma unidade militar, como agentes do Estado, combatemos, cumprindo ordens de nossos chefes.
Pensava que os atuais chefes militares, hoje ocupando as mesmas funções daqueles que nos deram ordens, responderiam por eles e seriam solidários conosco.
Infelizmente, isto não aconteceu. Ficamos todos nós, os combatentes dos DOI - militares do Exército e da Aeronáutica, integrantes da Polícia Federal e das Polícias Civil e Militar - jogados à própria sorte, ignorados e abandonados pelo Exercito que nos designou para a missão. Missão, que para o bem do Brasil cumprimos com êxito inquestionável.
Aos Generais “Serpa” a minha reverência e o meu respeito, aos demais, o meu lamento...
Leia a primeira parte no link abaixo:
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